por Rodrigo Ghinato Daoud
Lüdinghausen é uma cidadezinha de cerca de 20 mil habitantes, na Alemanha. Na escola em que estudei lá, pública como quase todas naquele país, tem um ginásio com três quadras poliesportivas. Nelas, há aparato necessário para se montar a maioria dos aparelhos de ginástica olímpica. Além desta modalidade, ao longo do meu ano estudantil tive aula de judô e natação. Isso mesmo, natação. As escolas de Lüdinghausen tinham convênio com a única piscina do município, e os alunos freqüentavam o local nas aulas de educação física.
Rio Grande, RS, 200 mil habitantes, local onde nasci, 10 vezes maior que Lüdinghausen, não tem nenhum local onde se possa praticar ginástica olímpica. O mais próximo disso são as argolas que existem nas pracinhas de recreação infantil da cidade, ao lado dos balanços e gangorras. Pista atlética para prática de atletismo também não há. Minhas aulas de educação física, em escola particular, eram um recreativo de futebol, quando o professor concedia-nos uma bola e ordenava-nos a distribuir nós mesmos os times.
Diante desse quadro, fica fácil perceber o porquê da nossa coleção de fracassos olímpicos a cada quatro anos. Em Atenas, conseguimos parcos cinco ouros: disparado nosso melhor desempenho. Nesta edição, pioramos. Justamente porque dependemos do acaso. Acaso de haver Daianes dos Santos descobertas numa praça. Dos Cielos conseguirem ir treinar nos EUA, e por aí vai. Assim como nosso desenvolvimento depende do acaso das crises internacionais, ou da falta delas.
O fato é que não temos estrutura para competir. Nossa mídia, a cada Olimpíada, enche-nos de esperança quanto às perspectivas do Brasil, em vez de debater as razões pelas quais não devemos tê-las. O esporte reflete nosso país, sem estrutura para formar cidadãos que possam, por si sós, desenvolver esta nação, e não dependermos de períodos entre crises para vencermos.
Por que somos potência no futebol? Porque temos muitos praticantes deste esporte: ele é de fácil acesso. E quando um jovem se destaca na várzea, os clubes se encarregam do resto. Pois façamos isso com todos os nossos jovens! Em vez de gastarmos bilhões organizando uma Olimpíada, construamos ginásios, pistas atléticas, etc. nos nossos centros urbanos. Ofereçamos aos nossos alunos, após um turno de período letivo, não terem de ir para casa assistir televisão ou rumar para as drogas, mas a chance — como currículo escolar — de se tornarem nossos futuros atletas. Aí, sim, poderemos nos dar ao luxo de ter esperança no Brasil. Não só nas Olimpíadas, é claro. Sabemos que não ganharemos medalhas em patinação no gelo morando num país tropical. Por que não nos é óbvio que não teremos êxito em esportes que só conhecemos pela televisão? Ou você tem algum amigo que pratica salto com vara?
Voltando à Alemanha: com menos da metade da população do Brasil e com o território um pouco maior que o do Rio Grande do Sul, está entre as melhores nos jogos de Pequim. Com apenas um pedacinho de Alpes no seu extremo sul, conseguiu o primeiro lugar geral nas últimas Olimpíadas de Inverno. E, por lá, o professor de educação física é chamado de senhor e só precisa de um único emprego.
Rodrigo Ghinato Daoud
é doutorando em Medicina/UFRGS
é doutorando em Medicina/UFRGS
Fonte: Zero Hora - 24/08/2008
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