sábado, 20 de novembro de 2021

EUA Não Querem Pagar Recompensa Oferecida Por Criminoso

O dedo que cortaram de ‘Santrich’ desata controversia nos EUA.
Ao redor do corpo de Seuxis Pausias Hernández, vulgo Jesús Santrich, seus camaradas das dissidencias da ‘Segunda Marquetalia’ encontraram varios fuzis da Guarda Nacional Bolivariana, estilhaços de granadas e estojos de munição do Exército do regime de Nicolás Maduro.
Cartaz oferecendo recompensa
pelo quadrilheiro das FARC.
Foto: El Tiempo
Inclusive, logo que se revelou que ‘Santrich’ havía sido abatido, em 17 de maio passado, em seu acampamento  na zona rural de Villa del Rosario de Machiques, estado de Zulia , as ex-FARC sairam a lançar ameaças e acusações.
Disseram que homens de um comando armado o havíam aniquilado e que fugiram em um helicóptero amarelo, levando a falange do dedo mínimo de sua mão direita. Ainda, que o grupo de assalto estava integrado por membros do Exército colombiano, comentário que Daniel Palacios, Ministro do Interior, qualificou de fantasioso e sem fundamento.
O caso parecía ter sido sepultado como o corpo de ‘Santrich’, processado por narcotráfico nos Estados Unidos, cujo governo oferecía uma recompensa de 10 milhões de dólares por sua localização.

Os desmobilizados delatores
'Jesús Santrich' estava protegido
em Caracas. (Archivo Particular)
Todavia, um Informe sigiloso sobre o ocorrido naquele dia evidencia que o assunto ‘Santrich’ segue vivo e que três desmobilizados junto a membros da Guarda Bolivariana foram peças fundamentais na operação, executada em territorio venezuelano, e à qual o regime nunca se referiu.
Ali se assegura que o objetivo inicial era o escorregadio ‘Iván Márquez’, o outro cabecilha das dissidências.
Mas ‘Santrich’  que fugiu da Colombia, em 2019, quando a JEP [Justiça Especial de Paz] o deixou livre ante o pedido de extradição dos EUA  começou a ser visto em Machiques, próximo à serra de Perijá, que controlava quando usava o camuflado de guerrilha das FARC.
Segundo informação de um Oficial de Inteligência, na mesma semana em que ‘Santrich’ ameaçou de morte o Presidente Iván Duque, os desmobilizados começaram a entregar dados do quadrilheiro.
Memento mori” (lembra que vais morrer), ele disse a Duque em uma gravação divulgada em fevereiro de 2021.

¿Na conta das despesas sigilosas?
'Jesús Santrich' fugiu em 2019, logo após ser solto pela JEP.
Foto: César Melgarejo/El Tiempo
Mais, os três informantes asseguraram que a perda de visão de ‘Santrich’ avançava com rapidez e que ele tropeçava e caía com frequência.
De maneira simultânea, varios membros do comando armado — uns 20 homens  começaram a chegar na região, para misturar-se aos moradores e executar o golpe de mão a uns poucos kilômetros da fronteira: “Foi feita uma especie de bolha de segurança”.
A operação foi tão efetiva que até anunciam que os desmobilizados já demandam uma recompensa de 300 milhões de pesos, de uma conta de gastos sigilosos.
A impressão digital do dedo desmembrado foi comparada com o registro papiloscópico de Seuxis Pausias Hernández e coincidiu plenamente.
'Iván Ríos' foi morto por um homem de sua confiança, que lhe
cortou a mão direita para comprovar a ação.  Foto: El Tiempo
E agora, diz o documento, está sendo acionada a cobrança dos 10 milhões de dólares aprovados pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos como recompensa por ‘Santrich’.
Pedro Pablo Montoya Cortés
Foto: Mauricio Moreno
Na Colombia já existe um antecedente similar quando o quadrilheiro Pedro Pablo Montoya, vulgo Rojas, cortou a mão direita do membro do secretariado das FARC conhecido como ‘Iván Ríos’, após matá-lo, em março de 2008.
Com a mão decepada em um recipiente térmico e um computador pessoal de ‘Ríos’, provou que o havía morto e começou a cobrar uma recompensa de 1,5 milhões de dólares.
Mas ‘Rojas’ não recebeu um centavo e, pelo contrario, foi condenado a 18 años de cárcere. Por fim, em 2019, depois de juntar-se ao processo de desmobilização das FARC, foi assassinado.

O ‘não’ de ‘Tío Sam’
No caso de ‘Santrich’, se estabeleceu que as autoridades dos Estados Unidos não foram convencidas pelo dedo decepado.
Segundo o Informe reservado, o objetivo era ‘Iván Márquez’ (esquerda). Mas ‘Santrich’ se deixou ver na fronteira. Foto: AFP
Até mesmo, já emitiram uma primeira negativa para pagar a recompensa pelo narco-guerrilheiro.
Para a justicia estadounidense, a única prova de que alguém está morto é o cadáver. E o de ‘Santrich’ está enterrado em algúm lugar da Venezuela.
Porém, as gestões ante a justiça dos Estados Unidos continúam através do grupo que fez a “inteligência dominante” da ação.
E como prova de que o chefe das dissidencias morreu, alegam o fato de que a Polícia já o retirou do cartaz de recompensas que oferecem pelos outros cabecilhas da ‘Segunda Marquetalia’.
Também anexaram supostas fotos do cadáver, mas tampouco convenceram os agentes federais americanos.
Esta é a circular da Interpol contra 'Iván Márquez', 
chefe da 'Segunda Marquetalía'.  Foto: Policía
Oficialmente, porta-vozes autorizados do Exército disseram que não pagaram nem um só centavo de recompensa pela morte de ‘Santrich’.
Também foi feita uma consulta sobre o caso à Polícia, e seu alto comando fez saber que não tem nada a ver com o tema.
Unidad Investigativa
u.investigativa@eltiempo
@UinvestigativaET
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Fonte: tradução livre de El Tiempo

quinta-feira, 4 de novembro de 2021

Missão Cumprida, Estela!

por Sérgio Pinto Monteiro*
Imagem: O Globo - edição de 6 de Novembro de 1969
“Quero este mundo assim como ele é, com sonhos para sonhar, problemas para resolver e lutas para lutar”.
(Estela). 
O processo histórico brasileiro, especialmente os episódios ocorridos durante os chamados “governos militares” — 1964 a 1985 — tem sido objeto de análises, narrativas e interpretações dos mais variados matizes, nem sempre focados na verdade dos fatos. A vasta literatura disponível sobre aquele período assim o demonstra. Há muito que no Brasil proliferam jornalistas, pesquisadores e pseudo-historiadores comprometidos, apenas, em contar a história à luz de suas posições politico-ideológicas e, até mesmo, por vezes, reescrever e inventar fatos e ocorrências. 
O ano de 1969 foi um dos mais conturbados daqueles dias. Pouco antes, com a intensificação da luta armada desencadeada pelos opositores da contrarrevolução de 1964, o governo federal editou o Ato Institucional nº 5, cujo objetivo, entre outros, era o de enfrentar e derrotar os rebelados que tentavam, a todo custo, a tomada do poder. Nesse contexto, sucederam-se inúmeros confrontos armados entre revoltosos e agentes do Estado, um dos quais ocorreu em 4 de novembro de 1969, na Alameda Casa Branca, próximo à Avenida Paulista, em São Paulo.
Carlos Marighella foi um ex-deputado do Partido Comunista Brasileiro. Dissidente do PCB, fundou, em 1962, o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), com o qual rompeu e acabou expulso. É de sua autoria o Mini Manual do Guerrilheiro Urbano, publicado em vários idiomas, onde ensina aos seus comparsas como matar pessoas, explodir instalações, sequestrar, torturar. Em 1964, o terrorista Marighella foi baleado e preso num cinema do Rio de Janeiro. Solto pela Justiça, criou a Ação Libertadora Nacional, organização terrorista responsável por inúmeras ações criminosas, inclusive o sequestro do embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Charles Elbrick.
Marighella foi um dos alvos da Operação Bandeirante, desencadeada pela polícia paulista. Sua morte polêmica, em confronto com as forças policiais, tem sido objeto de inúmeras versões, algumas totalmente inverossímeis. Na época, os principais jornais do país noticiaram, em manchetes de primeira página, que Marighella teria sido traído por dois frades dominicanos, seus amigos e cúmplices, detidos anteriormente. Numa tentativa de prender o terrorista, o Delegado Sérgio Paranhos Fleury, do DOPS paulista, planejou, em 4 de novembro de 1969, uma emboscada na Alameda Casa Branca. O dispositivo contava com a participação de vários policiais disfarçados, inclusive duas investigadoras. Uma delas, Estela Borges Morato — recém-nomeada em concurso público para a polícia civil de São Paulo — e Ana Pereira Leite. No relato da época, a policial Estela estava num veículo particular, parado no local, simulando um namoro com o Delegado Rubens Tucunduva.
A dinâmica da ocorrência até hoje não foi totalmente esclarecida. Há versões conflitantes e até claramente fantasiosas, inclusive da desacreditada “Comissão da Verdade” que, estranhamente, concluiu não ter havido tiroteio e que Carlos Marighella foi sumariamente executado. Estranhamente porque, se não houve enfrentamento, como justificar a existência de outras vítimas, inclusive policiais? Alegam os defensores dos terroristas — sem provas — que os agentes da lei teriam sido vitimados pelo chamado “fogo amigo”. Ao final da operação, logo após as 20 horas, além do terrorista Marighella, morreu um transeunte, o protético Friederich Rohmann. A investigadora Ana Pereira Leite ficou levemente ferida. O Delegado Tucunduva foi gravemente atingido na perna [NR: o que lhe causou sequela permanente] e sua parceira, a jovem investigadora Estela Borges Morato, de 22 anos, foi atingida por um tiro na cabeça, falecendo três dias após, no Hospital das Clínicas.
No sepultamento, seu corpo foi conduzido num Carro de Bombeiros, seguido pelo governador de São Paulo, Abreu Sodré e pelo Secretário de Segurança, General Viana Moog. Diante de uma chuva torrencial, centenas de policiais dispararam para o alto, saudando a Agente 2706.
Estela Borges Morato foi homenageada com a designação do seu nome para uma das ruas da cidade de São Paulo e para uma Escola Estadual. Muito pouco para quem, tão jovem, perdeu a vida combatendo terroristas. Lamentavelmente, na Alameda Casa Branca, no local onde Estela tombou, há hoje uma placa homenageando o bandido Marighella, recentemente travestido de herói em filme nacional. Tempos estranhos. Creio ter sido Estela a nossa primeira policial feminina sacrificada no cumprimento do dever.

Lembrando Estela
Estela Borges Morato nasceu em Campo Limpo, São Paulo, em 22 de janeiro de 1947. Filha de policial civil, cursou o primário no Externato Santo Antônio e no Colégio Paulistano, o ginasial e o científico. Em 1964 participou de um concurso bíblico instituído por uma estação de rádio da Capital Paulista, obtendo o primeiro lugar.
Recebeu como prêmio mil discos e um aparelho de televisão. Em 18 de dezembro de 1965 casou-se com Marcos Morato, com quem permaneceu unida até a sua morte em 1969. Foi bancária, ingressando no Banco Comércio e Indústria de São Paulo, em 1966, através de concurso. Aperfeiçoando-se na profissão, fez o curso de grafo-datiloscopia bancária, denominado "Preventivo de Falsificação", da Academia de Polícia de São Paulo, se familiarizando com a atividade policial.
Em 1969, foi nomeada investigadora de polícia, após prestar concurso público. Como primeira lotação, foi destacada para atuar no Departamento de Ordem Política e Social, onde, segundo os seus chefes, foi um exemplo de disciplina e abnegação ao serviço público. Dois meses antes de sua morte, ainda bancária, Estela escreveu uma crônica no jornal do Sindicato dos Bancários, onde revelava sonhos e desejos que, tristemente, seriam frustrados pela infâmia do terrorismo:
Que tipo de mundo você queria? Para esta pergunta, a resposta é sempre a descrição de uma utopia. Porém, eu gosto deste século, cheio de vivacidade e colorido, planos e esforços que nos fazem participar de uma experiência excitante e maravilhosa, sendo exatamente isso que dá a vida sua única atração verdadeira. Vida é movimento. Quero este mundo assim como ele é, com sonhos para sonhar, problemas para resolver e lutas para lutar. Vivamos intensamente a vida que Deus nos deu, afinal ela nos oferece mais prazer que dor, mesmo que haja sempre algo para ser resolvido ou remediado. Este mundo merece voto de confiança, porque ele é bom, só é mau para gente dura e de cabeça mole. O homem, enfrentando suas dificuldades, pode mostrar que é homem, aceitando o desafio. As dificuldades serão superadas e a vida valerá a pena ser vivida. Afinal já conquistamos a Lua.
“Estela”
DESCANSE EM PAZ, JOVEM E LINDA GUERREIRA.
JAMAIS A ESQUECEREMOS.
MISSÃO CUMPRIDA, ESTELA!
*é Professor, Historiador e Oficial da Reserva do Exército. 
É fundador, ex-presidente e Patrono do Conselho Nacional de Oficiais da Reserva. 
É membro da Academia Brasileira de Defesa, da Academia de História Militar Terrestre do Brasil e do Instituto Histórico de Petrópolis. 
É presidente do Conselho Deliberativo da Associação Nacional dos Veteranos da FEB e vice-presidente da Liga da Defesa Nacional/RJ.
Recebido por mensagem eletrônica.