por Glauco Fonseca
O incômodo é permanente, quase atávico. Manchetes de jornais se sucedem com casos de corrupção cada vez mais incríveis. Já passamos do tempo da indignação. Isto é ainda pior do que a impunidade. Já não sentimos mais. Perdemos o tato, a sensação confortável de justiça. Horrível. Acontece comigo, acontece com você, com todos nós. Muito pior do que ver alguém roubar dinheiro que deveria ir para vítimas de enchentes, por exemplo, é ler matérias sobre desvios, conhecer a crueza dos fatos envolvendo propinas e comissões e não sentir mais absolutamente nada. Passou o tempo do grito. Só resta a ignorância que nos sustenta sem que choremos de ódio sem parar. Ignorar no Brasil é melhor do que saber, ensinou Lula. Estamos quase aprendendo.
O Brasil criou um “locus” para testar e implantar esta amarga vivência em todos nós. Chama-se Congresso Nacional. Lá, toda sorte de delito acontece sem que haja lei, juízes, polícias, tribunais. Nada mais detém o produto nacional estúpido que é a corrupção impune e autoimune, aperfeiçoada no grande laboratório que é Brasília e disseminada como herpes por todo o país. Isto é pior do que a corrupção em si e ainda pior do que a impunidade.
A evolução da falta completa de limites é algo assombroso. Agora, não haverá sequer licitações públicas para as obras da Copa do Mundo. O roubo será descarado, desavergonhado e — pasmem — legal. Nada acontecerá nem com os criminosos, nem conosco, com nossa alma. Nossa alma já é corrompida, ora ignorante, ora omissa, cativa, muda. Sem licitação, o Brasil já perdeu a Copa do Mundo.
Mas ainda há algo pior do que a impunidade e a falta de limites. É o desarranjo entre pesos e suas medidas. Uma fraude de 300 milhões na Petrobrás terá um tipo de julgamento muito diferente de um crime semelhante, como o assalto ao Banco Central de Fortaleza, por exemplo, (considerado o maior roubo do Brasil, de “apenas” 160 milhões). Todos deveriam ser presos. Alguns, no máximo, serão “desligados” de suas funções e poderão ir para casa contar dinheiro roubado. Uma estrada a 16 milhões de reais o quilômetro não nos emula a indignação, uma ponte de dois quilômetros mais cara do que uma chinesa de 36 não nos excita a vergonha na cara e não nos faz emitir nem um som. Isto é ainda pior do que a impunidade.
Mas pior mesmo do que a impunidade é vê-la patrocinada pela lei. Daqui a poucas horas, mesmo que sejam condenados, pelo menos 36 mensaleiros serão “perdoados” pela lei brasileira. Nenhum tostão será devolvido e todos estarão livres, sem terem perdido um prego de suas casas, um parafuso de seus carros, uma página sequer de seus passaportes.
Pior do que a impunidade é a morte por tristeza de milhões de jovens corações.
Fonte: Blog do Prévidi
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