sábado, 27 de julho de 2013

Comunismo Chinês, Maoísmo e o Brasil do PT

por Milton Pires
Em primeiro de julho de 1921 foi fundado na atual cidade de Shanghai o Partido Comunista Chinês (PCC). Apesar de várias pinturas retratando a presença de Mao Tse Tung nessa reunião, é fato histórico que ele não estava presente. Os pioneiros do partido foram Chen Duxiu e Li Dazhao.
Peculiaridades à parte, o mais importante a ser lembrado é o cenário de verdadeira crise cultural que existia no país naquele momento. Desde a Revolução Boxer, no início do século XX, imperavam na China as mais diversas tendências políticas. Anarquismo, socialismo, comunismo, além de uma incipiente burguesia faziam das cidades costeiras, naquela época, uma espécie de caldeirão de possibilidades políticas.
É necessário lembrar que o país como unidade "apresentou-se" ao mundo ocidental como república em 1912. Atribui-se o título de "Pai da Nação" a um médico chinês graduado pela Universidade de Honolulu  Sun Yat Tsen. Extremamente culto, fluente em inglês, e capaz de colocar a China em "sintonia" com o mundo da época. Precisamos entender que esse breve período republicano antes do início das várias guerras civis chinesas que atravessaram o século XX, teve como opositor membros de um PCC igualmente capazes do ponto de vista intelectual.
Talvez seja esse um dos pontos mais importantes a salientar nesse breve artigo — a gigantesca distância que existe entre a noção de comunismo chinês e maoísmo. Depois de 1917 não houve, até onde eu sei, nenhuma elite intelectual capaz de propor o socialismo "em um país" sem seguir as regras do Comintern (termo que designa a Terceira Internacional Comunista). A China, e o jovem Mao Tse Tung, não foram exceção.
Neste pequeno texto o objetivo é fazer uma rápida distinção entre o chamado "comunismo chinês" e o maoísmo bem como salientar que são o caráter de extrema violência revolucionária camponesa e o voluntarismo os aspectos mais preocupantes no que se relaciona à atuação de alguns grupos que existem hoje no Brasil.
Sabemos que, desde suas origens, a Revolução Bolchevique nunca atribuiu aos camponeses um papel revolucionário de protagonismo na URSS. Sabemos que existia, dentro do Partido Bolchevique, teóricos cujo conhecimento das obras de Marx e Engels ultrapassava de longe qualquer pensador chinês e não é demais salientar que a primeira aproximação da China com o mundo ocidental, especificamente no século XX, não foi com a URSS.
Pois bem, ressaltados estes aspectos, é obrigatório dizer que a chamada transição e mais tarde substituição do "comunismo chinês" pelo maoísmo nunca se fez de maneira brusca. Não é demais lembrar que o simples termo "maoísmo" sequer é reconhecido pelo PCC.
A expressão politicamente correta na China de 2013 é "pensamento de Mao Tse Tung". Seu papel de liderança é conquistado aos poucos dentro da luta pelo poder de comando na guerra revolucionária (primeiro contra o Kuomintang de Chiang Kai-Shek, depois numa aliança de conveniência com o mesmo Chiang numa guerra contra o Japão Imperial e, finalmente, outra vez contra os mesmos nacionalistas que esse "caudilho chinês" representava) que arrasou a China até a fundação oficial da República Popular em outubro de 1949.
Já dissemos acima que o papel dos camponeses e o voluntarismo são distinções fundamentais entre o comunismo chinês e maoísmo. Falta agora salientar dois dados importantes. Jamais pode alguém falar em maoísmo verdadeiro sem lembrar da importância do Exército de Libertação Popular - nome dado ao antigo Oitavo Exército Revolucionário cujo comando foi conquistado pelo próprio Mao depois de uma série de intrigas e assassinatos que aqui deixamos de lado. Além disso, a cooptação pela guerra de guerrilha dos assaltantes e bandoleiros que assolavam a China desde o século XIX também distingue, em muito, os maoistas dos primeiros comunistas chineses.
Passemos agora a estudar o papel da violência revolucionária. Muito antes de Mao afirmar que o "poder político vem do cano de uma arma", Lênin já sustentava que não haveria revolução sem violência mas foi em Mao, não em Lênin, que a ela adquiriu no pensamento revolucionário o papel de categoria "estrutural" da sociedade chinesa. A noção de guerra revolucionária alcança na China Maoista uma importância no inconsciente coletivo que jamais teve na URSS.
Enquanto em Lênin e Stalin as execuções são secretas e a perseguição feita pela Tcheka (mais tarde KGB) faz-se às escondidas, na China de Mao elas são públicas. Enquanto a violência do regime soviético tem um papel "instrumental" pode-se dizer que no maoísmo ela é a essência.
Mesmo distorcida por Stalin, a visão de uma sociedade ideal concebida por Lênin atravessa toda história da URSS de uma maneira que simplesmente não existe na China de Mao Tse Tung — nela a guerra de movimento contra o Japão e os nacionalistas, uma vez encerrada, deve ser levada adiante dentro da própria sociedade num fanatismo constante de purificação que, mesmo nos expurgos de Stalin, jamais foi visto e que alcança o ápice na Revolução Cultural de 1966.
O que preocupa, consideradas todas as diferenças entre o Brasil do PT e a China de Mao, é a semelhança de tamanho entre os dois países, a ignorância da grande maioria da população, e a associação com grupos criminosos. Feita novamente a ressalva de que não existe, até agora no Brasil do PT, o controle total do Exército Brasileiro por esse partido criminoso, as demais coincidências são interessantes. Talvez a mais assustadora delas seja exatamente aquela relacionada ao famoso voluntarismo da militância esquerdista.
Desde o Manifesto de Agosto — de 1950 — que marcou a crise dentro do PCB dando origem à "linha chinesa" (PCdoB) e mais tarde à "Ala Vermelha", o que vemos são sucessivas "rupturas" protagonizadas por dissidências partidárias que cada vez mais aproximam os novos partidos do pensamento original de Mao Tse Tung.
Hoje, em 2013, o país assiste em silêncio as declarações da "Liga dos Camponeses Pobres" e pode ler com a maior facilidade, pelo menos na Internet, as manifestações assustadoras da "Nova Democracia" e do "Movimento Estudantil Popular Revolucionário aviso sombrio para quem pensa que maoísmo não existe mais (ou está restrito à Índia e ao Nepal) e que a China é um país que fica muito longe daqui.
Dedicado à minha amiga, Graça Salgueiro.
Porto Alegre, 21 de julho de 2013
Milton Simon Pires é Médico.
Fonte:  Alerta Total
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