por Javier Alexander Macías
Nos últimos 15 dias de julho passado Jairo Chaverra(*) andou pelas ruas de Cartagena com três escoltas, seis pistolas na cintura e uma sentença sobre suas costas: ou pagava a “seus sócios” os 820 quilos de cocaína que a Polícia lhe apreendeu, ou sua esposa o iria visitar em qualquer cemitério da costa colombiana.
A carga “caiu” por um defeito na solda do piso do contêiner onde seria transportada a “mercadoria” e os policiais descobriram a tramoia. Eram 440 quilos de cocaína que terminariam em um dos portos da Europa, inundando de pó branco as ruas das cidades aditas ao químico mortal.
"O resto da encomenda estava no que chamamos 'creche', que é uma casa próxima aos portos, mas com a queda do primeiro carregamento [os policiais] chegaram aos 380 quilos que tínhamos no esconderijo", diz Jairo.
Após a apreensão veio a captura, uma ameaça dos "narcos", e um pacto de proteção de testemunhas com as autoridades que por enquanto o mantém fora da cadeia em troca de revelar as rotas e donos de carregamentos ilícitos que saem camuflados em contêineres desde os diferentes portos de Barranquilla, Santa Marta, Cartagena e Urabá para América Central e do Norte, Europa e Ásia.
Após a apreensão veio a captura, uma ameaça dos "narcos", e um pacto de proteção de testemunhas com as autoridades que por enquanto o mantém fora da cadeia em troca de revelar as rotas e donos de carregamentos ilícitos que saem camuflados em contêineres desde os diferentes portos de Barranquilla, Santa Marta, Cartagena e Urabá para América Central e do Norte, Europa e Ásia.
Contaminar os contêineres
Introduzir a droga em um contêiner é uma tarefa que só pode demorar entre cinco e oito minutos. Como em uma colonia de formigas, os obreiros dividem o trabalho para cumprir esse prazo, e se demorarem mais, os “contaminadores” correm o risco de serem capturados pela Polícia ou pela Armada (Marinha) e, assim, derrubar-se um império ilegal que segundo investigadores da Armada Nacional deixa um lucro de 890 por cento.
Desestimular e combater um negocio em cujo investimento se obtém ganhos tão altos é uma tarefa extremadamente difícil. As contas, obtidas pela Inteligencia da Armada e a Polícia, são sensíveis: toda a operação de compra e embarque de 100 quilos de droga ascende a um custo médio de 760 milhões de pesos (cerca de 760 mil reais). Se essa droga logra penetrar no mercado europeu, o valor da venda final será de $9.314.250.000 (aproximadamente 9,3 milhões de reais). Descontando as comissões estimadas em mais de $1.820.512.500 milhões de pesos, o lucro bruto para o narcotraficante é de 7,493 bilhões de pesos (ou 7,4 milhões de reais).
Em um vídeo obtido por El Colombiano e gravado em uma missão de infiltração da Armada, seis pessoas, em uma operação relâmpago, metem 20 quilos de cocaína em um contêiner carregado de pratos plásticos. No trabalho, dois homens rompem um lacre que indica que aquela carga já havia sido revisada e tiram parte das caixas, o manobrista de uma grua eleva os que romperam o lacre até a parte superior do caminhão, outro sujeito lhes passa duas sacolas negras com “a mercadoria” para metê-las no mais profundo da carga legal, e um operador logístico de aduanas tranca as portas do contêiner e põe outro lacre falso de fiscalizado, antes de que o contêiner seja embarcado para a Europa.
É justamente aí onde entra Jairo. Na hierarquia do narcotráfico, seu papel é de “coordenador”. Sua função primordial consiste em “contaminar” os contêineres de frutas ou produtos que serão exportados com os carregamentos de cocaína. Este trabalho, diz ele, lhe fez ganhar grandes quantidades de dinheiro, mas também “perder muita grana quando cai a encomenda” e tem que pagar à vista ou com sua vida. Seu último ganho bruto, assegura, foi de $500 milhões de pesos.
“Eu tenho gente que são operadores logísticos de empresas de aduanas que trabalham comigo. Eles me informam quais contêineres estão disponíveis, qual é o destino, o percurso e em qual barco serão levados”, comenta Jairo, e acresce que com ele trabalham policiais antinarcóticos que lhe passam informação para que o contêiner seja contaminado sem inconvenientes.
Além disso, consegue as planilhas de viajem, as rotas, os lacres que serão substituídos quando a droga esteja camuflada nos carregamentos legais de empresas que desconhecem que junto a seus produtos vai uma carga ilegal.
Para confrontar a versão de Jairo, El Colombiano buscou a versão da DIAN encarregada da Sociedade de Intermediação Aduaneira, SIA, onde segundo o “coordenador” se conseguem os lacres e as planilhas e de lá nos remeteram à Polícia Antinarcóticos. Também buscamos a versão da diretora de Aduana a quem enviamos as perguntas, mas não foi possível a entrevista com a funcionaria.
Ainda buscamos a versão da Polícia Antinarcóticos sobre a denuncia de policiais implicados e a segurança nos portos. Em três ocasiões se conversou com o General José Ángel Mendoza, Chefe dessa unidade, que adiou o encontro alegando compromissos de suas funções policiais. Depois de oito chamadas e mensagens no celular, não respondeu ao solicitado.
Revisão, ponto vulnerável
A rota mais cômoda para este elo da cadeia do narcotráfico é Cartagena-Puerto Limón, Costa Rica, porque segundo Jairo, “a Polícia e outras autoridades civis de lá trabalham [aceitam] mais fácil com cargamentos de cocaína que as mesmas autoridades colombianas”.
Esconder droga entre carregamentos legais que sairão do país não é um assunto novo, sem dúvidas, se converteu em uma das modalidades mais exitosas para tirar a coca da Colômbia, pois como explica o Contra-Almirante da Armada, Francisco Herrera Leal, no mundo se movem cerca de 600 milhões de contêineres ao ano, e destes, só se revista uns 12 por cento, quer dizer, 72 milhões. (Dados do Banco Mundial registraram que em 2014 o movimento foi 679.254.658).
Na Colômbia a situação não é diferente. Segundo o alto oficial naval “a carga comercial legal usa a mesma rota da ilegal. Cartagena é um dos portos que mais move carregamentos, cerca de 7 milhões de toneladas (segundo a Superintendência de Portos e Transporte foram 7.881.745 em exportação em 2016), e dessa grande quantidade se inspeciona cerca de 2 por cento (140.000), e ao fazer isso, realmente temos uma grande brecha para que saia mais droga”.
Para contrastar este fenômeno, diz o Contra-Almirante, estamos realizando trabalhos aliados com a Polícia Nacional.
“Quando avaliamos o tema portuário nos chama a atenção essa grande quantidade de droga apreendida pelas agencias da Europa, e sobretudo em um porto muito específico que é Amberes (Bélgica). Estamos fortalecendo nossas capacidades nos portos para entender o significado do padrão dos contêineres, o quê significa o padrão de empresas e com base na Inteligencia tratar de focalizar nosso esforço para um tipo de contêineres que, com a Polícia, possamos inspecionar e obter resultados”.
Herrera explica que graças à cooperação internacional puderam cruzar contas com agencias estrangeiras como a aduana francesa, os alemães, o MAOC (Maritime Analysis and Operationnns Centre Narcotics em inglês) de quanta droga apreendida na Europa era proveniente da Colômbia e estabeleceram que entre 2015 e 2016 foram confiscadas 30 toneladas.
Segundo o Almirante, com dados de investigação do SIMCI e EUA sobre a base de quantidade de cultivos de uso ilícito que há na Colômbia, e partindo do cálculo de que um hectare de coca produz 2 quilos de cloridrato de cocaína, estimaram que em 2016 houve uma produção de 646 toneladas no país, 160 das quais possivelmente saíram pelo Caribe. Continuando com as contas, da possível saída das 160 toneladas de drogas se capturaram só 30, um porcentual de 18,75 por cento de eficiência.
“Há que seguir trabalhando e potencializando as capacidades de Inteligencia. Temos especialistas em veleiros, em lanchas go fast, mas nos temas de contêiner e portos ainda estamos elaborando este conhecimento e temos que ser mais fortes nisto para lograr neutraliza-lo”, conclui o Contra-Almirante Herrera.
As outras modalidades
Orlando(*) é um dos investigadores mais experientes da Polícia no tema de narcóticos no mar. Em suas pesquisas aos narcos descobriu que entre as formas de carregar coca, os donos dos carregamentos tem varias modalidades. Uma delas é a que as autoridades chamam parásitos (parasitas), ou seja, prendem na parte física da embarcação e abaixo da linha d'água, barriletes ou outros elementos carregados com droga.
Sem dúvida, para o investigador há outra modalidade que vem crescendo: o veleiro. “Eles utilizam tudo que sirva para navegar. Descobrimos que há velejadores que vem de outros países, que em teoria estão fazendo turismo e chegam provisoriamente para abrigar-se ou para logística, mas tem que ver com o narcotráfico”.
Orlando afirma que no acompanhamento feito a estas pequenas embarcações e através do intercambio de informação com agencias internacionais, nos países de registro dos veleiros eles eram dados por perdidos. “Esta é a importância da comunicação com essas agencias para obter melhores resultados”.
Uma luta que não para
O último contêiner contaminado com uma grande quantidade de droga caiu faz alguns dias (4 Nov 17). Em um carregamento de peles de animais que saía para a Europa, a Polícia Antinarcóticos e a Armada apreenderam 1.891 quilos de cocaína. A procura durou quatro horas até que no fundo da carga encontraram a coca recoberta com borracha para o caso de ter que lançá-la ao mar por pressão das autoridades.
“A droga ia metida em uma carga de peles porque estas geram um odor característico que evita que possa ser detectada por nossos cães. Sem dúvida, a pericia dos policiais do porto foi fundamental para descobri-la”, explicou o General José Ángel Mendoza, em entrevista coletiva de imprensa.
O oficial indicou que este carregamento estava marcado com diferentes logotipos, pertencentes a vários grupos que se uniram para envia-lo, modalidade que vem sendo utilizada e que pode pertencer a quadrilhas como o “Clan del Golfo”, os “Pachenca” ou até mesmo as dissidências das FARC que permaneceram com o negócio da coca.
Jairo, o “Chacho”, o coordenador de remessas que acumulou uma fortuna contaminando contêineres com drogas, assegura que desta vez não teve que ver com a delação deste carregamento. Por enquanto, passa seus dias em uma das grandes cidades da Colômbia evitando a execução da sentença de morte que seus inimigos lhe impuseram.
OBS: (*) Nomes trocados por segurança.
EM RESUMO:
Os narcotraficantes usam os portos da Colômbia para a coca produzida, aproveitando o baixo controle existente neles. A cocaína é camuflada em contêineres de frutas ou outras mercadorias.
Sequência de ações:
1. Compra de 100 quilos de cocaína que serão enviados ao exterior por 500 milhões de pesos.
2. Pagar 100 milhões de pesos ao coordenador para contaminar o contêiner com os 100 quilos de coca.
3. A reunião e o transporte dos 100 quilos de cocaína custa mais 12 milhões de pesos.
4. Compra de planilhas e documentos duplicados para tirar os 100 quilos de droga custa mais 3 milhões de pesos.
5. Compra de instrumentos vários como serras, martelos, soldaduras, tem um costo de um milhão.
6. Adquirir os lacres que substituirão os verdadeiros do contêiner custa 2 milhões de pesos.
7. O pagamento da contaminação do contêiner no porto custa 12 milhões de pesos.
8. O pagamento aos “donos” da zona (quadrilha) donde sairá o embarque é de 130 milhões de pesos.
9. O investimento total de um narcotraficante para tirar a droga do país é de 760 milhões de pesos.
- Um carregamento de coca enviado desde um porto da Colômbia demora cerca de 25 dias para chegar à Turquia.
Fonte: tradução livre de El Colombiano
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