por Agnaldo Del Nero Augusto
General de Divisão Ref
Os jornais anunciaram, em meados de fevereiro, muito discretamente, em pequena nota, que Napoleão não morreu envenenado. Não apresentaram detalhes dos métodos que permitiram essa afirmação categórica. Napoleão não foi a primeira e nem a ultima autoridade cuja morte gerou suspeitas de assassinato.
Napoleone Buonaparte era um líder, que mesmo banido, conseguiu voltar ao poder e mostrara-se capaz de superar fracassos, fazendo prevalecer no público a lembrança de seus sucessos. Lembrava-se dos sucessos de sua campanha na Itália e não do fracasso da expedição ao Egito. Fez-se proclamar Imperador da França, além de colocar três irmãos nos tronos de outras nações europeias, atitudes que provocara ressentimentos nos republicanos franceses — que consideravam o comportamento grande traição aos ideais da Revolução Francesa. Tinha inimigos no Egito e Rússia que invadira, na Áustria e Prússia que mantinha sob o jugo francês, na Península Ibérica que ocupou por muitos anos.
Não foi Bolívar, mas Napoleão que engendrou a artimanha de uma constituição elaborada, ratificada por plebiscito, máscara para a ditadura, que lhe permitiu permanecer 14 anos no poder. Era considerado egomaníaco, causando seu retorno ao poder medo a seus inimigos, o que explica a credibilidade da invencionice de seu suposto envenenamento. Este preâmbulo é para dizer que este fato motivou-me tratar do propalado assassinato de Jango, que não era um Napoleão, não metendo medo em ninguém.
Caro leitor. Você sabe quem é Mário ou Antonio Neira Barreto? Não sei se ele é Mário (O ESP do dia 28 Jan) ou Antonio (no mesmo jornal do dia 29), mas as notícias sobre esse bandido apareciam sempre, com o título Anos de Chumbo. Nem seu nome certo, ou codinome se ficou sabendo pela imprensa. Chamemo-lo apenas Neira Barreto.
Neira Barreto é um meliante que está preso em Charqueadas, no Rio Grande do Sul. Intitulando-se ex-agente, esse indivíduo em entrevista à Folha de São Paulo, disse ter integrado o grupo Centauro, um comando militar uruguaio destacado para matar Goulart. Segundo esse bandido, o pedido para assassinar Jango teria sido transmitido a militares uruguaios pelo delegado Sérgio Fleury, que teria atribuído a decisão ao então presidente Geisel. Nomes que estavam na imprensa e podiam ser do conhecimento de qualquer pessoa. Qual a causa de Neira Barreto ter se tornado assaltante? Perdeu seu emprego? Por quê? Há alguma informação relativa à existência desse tal grupo Centauro? Nada esclarece a imprensa investigativa.
Parece verossímil, mesmo hipoteticamente, que um simples agente, de um órgão desconhecido, tivesse conhecimento de quem partira tão grave ordem? O ex-presidente Geisel pode ser taxado de tudo por seus desafetos, menos de burro, assim como seus prepostos. O mínimo que um órgão responsável deveria exigir, antes de veicular notícia dessa gravidade, era saber se esse meliante pertenceu a algum órgão militar veiculado ao governo uruguaio e em que período. Nada se informa a respeito. Apenas tratam-no como um agente, notícias sempre precedidas do título Anos de Chumbo. Segundo o Aurélio, agente pode ser secreto, funerário, agenciador de enterros, papa defunto, e também, agente laranja, aquela mistura desfolhante. Quanto se trata de pessoas o “pai dos burros”, no verbete “laranja”, refere-se a agente intermediário, envolvido em transações geralmente irregulares ou fraudulentas, ficando oculta a identidade do verdadeiro interessado. Muito usado, ultimamente, por parlamentares para comprar emissoras de rádio e alguns empresários para outros fins escusos.
Não estou aqui para defender o ex-presidente Geisel, mas trata-se de um ex-presidente do Brasil e de um general do Exército. Não é a ele que querem atingir, são os governos do período revolucionário e em particular as Forças Armadas.
Até 31 de março muita água correrá por baixo da ponte. Até então, qualquer vagabundo, que inventar uma estória que desqualifique os governos do período revolucionário, ou as Forças Armadas, terá guarida em boa parte de nossa imprensa.
O ex-presidente Geisel é falecido, assim como o delegado Fleury. Mas mortes, aparentemente naturais, é pouco em uma história cabalística. Nesta, a forma escolhida para matar Jango teria sido colocar uma drágea com cloreto desidratado num esterilizador em meio aos comprimidos dos seus remédios, o que simularia um enfarte. A substância letal, disse o agente, teria sido preparada pelo médico legista uruguaio Carlos Milles, também falecido. Mas, numa estória fabulosa, o Dr Milles não poderia falecer de causa natural, “morto em Montevidéu como queima de arquivo”, complementa o agente. A estória está completa. Todos participantes mortos.
Segundo o Dr Fernando Luquessi, conceituado médico de Porto Alegre, Goulart estava internado no Hospital Universitário de Montevidéu e seus médicos providenciaram a presença na cidade do Dr Zerbini, um dos mais conceituados cardiologistas do Brasil. Era intenção dos que o atendiam levá-lo, disfarçado, a São Paulo, para atendimento especializado no Instituto do Coração, um centro de excelência em moléstias do coração. O Dr Zerbini foi a Montevidéu acompanhado de um assistente, o Dr Ariê. Após os exames realizados, a conclusão a que chegaram é que Goulart estava acometido de uma cardiopatia severa e não adiantaria levá-lo a S Paulo, pois não havia o que fazer. No caso, a conclusão é que Jango estava condenado. Sua zelosa família nada sabia da pretensão de levá-lo a S Paulo, ou da ida do Dr Zerbini a Montevidéu?
Não chequei esses dados, nem tinha condições de fazê-lo, pois não sou agente. Ouvi-os, no comentário que o jornalista Alexandre Garcia faz normalmente na rádio CBN/Brasília. Apenas no contato que fiz com o jornalista, tive-os confirmado. O jornalista até comparou a doença de que estava acometido Goulart, à gravidade da que sofreu o deputado Luís Eduardo Magalhães, que apesar dos recursos de que dispõe sua família, não pode evitar seu prematuro passamento.
Essas são duas versões do mesmo fato. Um fato não contêm em si a verdade. Verdadeira ou falsa será a percepção que dele temos, assim como mais ou menos justo pode ser o juízo que sobre ele formamos. É esse livre juízo que permite as falsificações da história. É esse livre juízo que permite a deturpação de memórias nacionais, pelos revanchistas odientos. Se a intenção fosse chegar à verdade, ai estariam, pelo menos dois caminhos. Ou se recorre à França, para se conhecer o que a ciência, hoje, disponibiliza, para se chegar a uma certeza dessa ordem, passados quase dois séculos, ou segue-se o caminho das pedras, a começar pelo Dr Marquesi e os outros envolvidos que estiverem vivos. Esta última alternativa, embora nos ofereça elementos importantes para formarmos nosso juízo, não elimina a hipótese criada, não nos conduz a certeza, à verdade. Mas quem deseja a verdade? A verdade elimina o tema que objetivam explorar. Mais um dado para o leitor, no dia 19 último, notícia no O ESP dava conta que a família de Goulart deseja ser indenizada pelos Estados Unidos, pela pretensa interferência no “golpe” de 1964, outra história farsesca, que voltará ser orquestrada.
Acredito que o leitor perspicaz tem nas informações aqui agregadas, elementos para refletir sobre os fatos com espírito crítico e chegar a um juízo mais próximo da verdade.
Ternuma Regional Brasília
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