por Percival Puggina
"Guardai-vos do fermento dos fariseus que é a hipocrisia. Porque nada há de oculto que não venha a descobrir-se, e nada há de escondido que não venha a saber-se. Por isso, as coisas que dissestes nas trevas, serão ditas às claras, e o que falastes ao ouvido nos quartos será apregoado sobre os telhados" (Lc. 12,1-3).
Há quem ande bisbilhotando os namoros e infidelidades conjugais de antigos ocupantes do trono presidencial para mostrar que nada de extraordinário ocorre no affaire de Lula com Rosemary Nóvoa de Noronha. Opa! Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa.
As aventuras de Lula, enquanto aventuras, só interessam a ele e, provavelmente, a dona Mariza Letícia. Mas não é disso que se vem tratando. Não consta dos anais da história que algum outro presidente tenha criado um cargo para acomodar convenientemente sua namorada. Aliás, o cargo, com as atribuições que bem convinham aos dois pombinhos, era tão desnecessário que a presidente Dilma o extinguiu de um dia para o outro. Qual outro presidente teve a ousadia de conceder passaporte diplomático à sua amante e a fez embarcar com ele em dezenas de viagens oficiais, com direito a diárias e às custas do erário, constrangendo a tripulação? Qual outro presidente da República deu-se ao desplante de determinar que o nome de sua manteúda fosse omitido da lista de passageiros, num desrespeito a normas nacionais e internacionais relativas ao tráfego aéreo? Nenhum presidente falou tão bem de si mesmo e nenhum chegou tão longe no uso abusivo do poder para atender conveniências pessoais. Nisso e em muitas outras coisas, Lula enxovalhou o cargo que ocupava. E prevaricou.
Ele aprendeu ainda cedo, nos tempos do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, a usar as instituições e seus recursos para fins políticos partidários (Augusto Nunes, em Direto ao Ponto, 10/09/2012). Nem as viúvas dos companheiros que procurassem o sindicato escapavam das investidas de Lula (entrevista dele próprio à revista Playboy, mês de julho de 1979). O sindicalismo brasileiro tem longa ficha corrida de mamatas, boquinhas e abusos. Por isso é impossível dizer se Lula foi professor ou aluno numa escola de malandragens. Mas tornou-se, também nelas, Doutor Honoris Causa. O desempenho de funções de mando com respeito aos limites determinados por necessário senso moral não fazem parte de sua biografia. Foi graças a essa característica de seu caráter que, sem qualquer constrangimento, uniu-se àqueles a quem mais atacara e trouxe para perto de si quase todos os maiores patifes da República.
Espanta-me que certas pessoas de seu partido, tão verticais quanto doutrinárias e professorais quando se tratava de cobrar espírito e conduta republicana de seus opositores, ergam-se agora em defesa de malfeitores condenados pelo STF. E formem tropa de choque para blindagem de um ex-presidente que sempre se julgou acima da lei e governou o país rodeado por quase todos os trezentos congressistas que ele mesmo, como deputado, contabilizara como picaretas. Deus cria, a vida separa e o diabo junta.
Para concluir: em profundo constrangimento devem estar os jornalistas que cobrem o cotidiano da presidência da República. Foi preciso uma ação da Polícia Federal para trazer a lume algo que passou batido por todos eles ao longo de oito anos e dezenas de viagens presidenciais! Ou foram patetas ou se fizeram de patetas, seguindo o exemplo do nosso estadista de Garanhuns. Um jornalismo nada republicano esse, também.
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