por Juliana Gil Gutierrez
Só depender de si mesmo. Esse é o objetivo da Rússia com a criação do Runet, um projeto soberano da Internet que objetiva que o país garanta o funcionamento da rede e que o sistema russo possa se isolar dos grandes servidores mundiais se detectar uma ameaça externa. Isto, em palavras simples, significa que o governo poderia operar e monitorar a conexão sem necessidades externas.
A Rússia diz que é um método de defesa contra nações hostis como os Estados Unidos, que controla grande parte do espectro, mas os defensores dos direitos humanos indicam que é uma maneira de monitorar e limitar a liberdade. A Human Right Watch, por exemplo, disse que "o governo agora pode censurar diretamente o conteúdo ou até transformar a Internet russa em um sistema fechado sem informar sobre o que fez ou por quê".
O que diz o novo regulamento
Os provedores de Internet terão que instalar equipamentos que direcionam o tráfego através de servidores russos, dando às agências estatais a capacidade de monitorar e controlar informações. É uma tática para rotear o tráfego, o que, na prática, oferece a possibilidade de bloquear conteúdo externo.
Se alguém atacar o sistema, Roskomnadzor — a agência estatal encarregada da Internet —, poderá assumir o controle de toda a rede do país e isolá-la dos servidores mundiais. Ele também terá sua própria versão dos sistemas de endereço de rede (DNS), que são grandes bancos de dados que hospedam informações em páginas da internet.
O professor titular de Engenharia de Sistemas da Universidade Javeriana, Rafael González , explica que o RuNet dará à Rússia suficiência de armazenamento e processamento de informações, mas também soberania sobre toda a infraestrutura de rede. "Em um contexto geopolítico, pode ser preocupante, mais em um cenário como o atual, onde já falamos sobre guerra cibernética e defesa cibernética", diz o especialista.
Essa soberania na qual o regime de Vladimir Putin aposta significa que, toda vez que um endereço é pesquisado, o serviço de Internet ao qual ele está conectado deve rastreá-lo nos diretórios que o próprio governo controla. A Rússia também pretende que todos os portais acessados pelo país sejam hospedados no domínio .ru.
Ameaça à liberdade?
A Rússia implementa o RuNet no mesmo contexto em que bloqueou o acesso de seus cidadãos ao Dailymotion, LinkedIn e Telegram. Não é que Moscou viva em uma bolha em relação à rede do resto do mundo: no país você pode entrar no Google, Mozilla Firefox, Facebook, Instagram, entre outras plataformas. A questão é que o regime agora centralizará os movimentos de seus cidadãos em rede.
O El Colombiano consultou uma jornalista que mora em Moscou, e ela informou que, embora na sexta-feira (01 Nov 19) tenha iniciado a vigorar o novo regulamento, até o governo de Putin precisa fazer ajustes que levarão até um ano para implementar completamente o RuNet. Ela diz que acessa sites bloqueados pelo regime por meio de uma VPN (rede virtual privada), uma tecnologia que esse país declarou ilegal em julho de 2017.
“Nosso governo quer controlar tudo. Eles não fecharam a Internet, mas pretendem controlar algumas pessoas, especialmente políticos da oposição”, disse em um telefonema desde Moscou.
Por esse motivo, é que o regulamento foi rejeitado pela população e houve até manifestações contra ele em abril e maio, quando ainda estava em andamento na Duma Estatal (Parlamento russo). No final, o projeto de lei foi aprovado, apesar do freio à cidadania.
Disputa com o Ocidente
Países como China e Coréia do Norte estão apostando em uma Internet soberana como a Rússia, uma rede independente do ocidente. No entanto, Pequim foi além: possui redes sociais próprias e centralizou completamente a conectividade de seus cidadãos. O internacionalista russo e professor da Universidade Icesi de Cali, Vladimir Rouvinski , comenta que a medida adotada pelo governo Putin não é semelhante à desses países.
“Estamos vendo uma segunda Guerra Fria entre a Rússia e o Ocidente. Moscou teme que a outra parte do mundo possa controlar a Internet dentro do país. Mas não é como na China, e o regulamento tem uma motivação: dar segurança”, diz Rouvinski. O professor também diz que a norma formaliza o que as autoridades vêm fazendo há muito tempo, para que não haja mudanças drásticas no acesso à rede.
Um compromisso com a segurança da Rússia ou um freio à liberdade para o Ocidente, mas o [resultado é que] o país tem sua Internet própria com a qual promete ser soberano na rede. Igual a quando um governo quer ser auto-suficiente para fornecer alimentos ao seu povo, mas com as condições da era digital.
Cerco à oposição
Em julho, o oposicionista russo Alexéi Navalni foi preso por 30 dias por encorajar manifestações pedindo eleições justas. Enquanto Navalni foi privado de sua liberdade, foi envenenado. Em agosto, no meio da campanha para eleições regionais, a polícia revistou casas de candidatos que se opunham ao governo. Esses casos lembraram o de Boris Nemtsov, um forte histórico político adversário de Putin, morto a tiros no centro de Moscou em 2015. O assédio e a falta de garantias de liberdade de expressão, e agora esta regulamentação da Internet, atormentam a oposição na Rússia.
Concluindo
A regulamentação do acesso à Internet na Rússia pode se tornar uma limitação à liberdade de expressão dos cidadãos russos pelo controle estatal implícito nas condições de criação da RuNet.
A regulamentação do acesso à Internet na Rússia pode se tornar uma limitação à liberdade de expressão dos cidadãos russos pelo controle estatal implícito nas condições de criação da RuNet.
Fonte: tradução livre de El Colombiano
COMENTO: este é um assunto que merece um estudo muito bem balanceado entre a manutenção da segurança e as liberdades civis. Até que ponto o Governo de um país deve permitir o livre uso das redes cibernéticas, quando este uso pode afetar a Segurança do país?? Até que ponto um Governo pode regular o uso da Internet pelos cidadãos do país?? É o eterno dilema de quem trata sobre Segurança: dosar Segurança X Liberdade.
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E até que ponto o "govrno" pode espionar a vida dos seus cidadãos?
ResponderExcluirIsso já ocorre praticamente em TODOS os países ditos de prieiro mundo...Existem vários aspectos importantes aí
para se analisar.
Por exemplo, as empresas privadas que são contratadas pelos governos para fazerem "vigilância específica" em certas operações
financeiras garantem que não se beneficiam do "conhecimento" adquirido? Outras empresas/grupos podem comprar essas informações?
E o câmbio e a bolsa e o dolar?
E futuras transações imobiliárias?
Ciência, tecnologia, armamentos, estão a salvo desse escrutínio?
Por que não se autoriza a encriptação total dos dados enviados pela Internet?
Quem ganha com isso?