por Janer Cristaldo
São Paulo está virando Paris. Na capital francesa, já faz parte dos usos e costumes a depredação anual de centenas de carros nos réveillons. Aqui, segundo a Veja, só nos quatro primeiros meses deste ano, ao menos 227 ônibus foram incendiados no Brasil em 38 cidades. Não temos notícia de um só responsável pelo vandalismo que tenha ficado atrás das grades. Pelo menos doze capitais registraram o mesmo tipo de ocorrência.
No que diz respeito a São Paulo, o número de coletivos queimados nesse período ultrapassa o total de ocorrências registradas durante todo o ano de 2013. Foram 70 e 53, respectivamente. O Estado do Rio de Janeiro aparece como a segunda frota mais afetada — 31 ônibus — e Minas Gerais e Pernambuco surgem na sequência com 15 e 14 veículos atingidos. Apenas na cidade de Caruaru, em Pernambuco, no último dia 7, um incêndio criminoso atingiu uma garagem e destruiu 12 coletivos em uma só noite.
Mês passado, a depredação de ônibus nesta capital acabou da noite para o dia. Foi após descobrir-se a ligação de um vereador do PT com o PCC, o grande responsável pela queima de coletivos. O serviço de vans, que é dominado pelos criminosos, não teve um só veículo queimado nesse tempo todo. Cobram o que querem durante as greves e permanecem incólumes. Se alguém precisa de prova maior do comprometimento dos proprietários de vans, é porque se recusa a aceitar o óbvio.
Ontem (Quinta-feira, 19/6/14) foi dia de festa para os bagunceiros em São Paulo. Para não sujar mais o pau de galinheiro em que virou o PT, nenhum ônibus foi incendiado. Mas foram invadidas duas concessionárias de carros importados. Só aí, um prejuízo de 3 milhões de reais. Foram ainda quebrados os vidros de agências bancárias e lojas, e destruídas lixeiras, orelhões e vasos de plantas. A manifestação, que reuniu 1.300 pessoas, pedia fim da tarifa do transporte e bloqueou marginal Pinheiros. Era uma comemoração da gloriosa Revolução de Junho de 1913. Tudo contra o capital e o comércio! Viva 1917!
Segundo a Folha de São Paulo, o protesto, organizado pelo MPL (Movimento Passe Livre), terminou com ao menos cinco agências bancárias, duas lojas de carros de luxo e um veículo de imprensa depredados ontem, na zona oeste de São Paulo. O ato, iniciado na av. Paulista, reuniu 1.300 pessoas. Ou seja, basta algumas centenas de pessoas para paralisar o trânsito das principais vias da cidade e depredar a gosto o que quiser.
Índios munidos de arcos e flechas também participaram do ato e cobraram a demarcação de terras. Tudo isso com total permissão das autoridades. A televisão mostrou batalhões de choque, munidos de ameaçadoras armaduras, escudos e bombas de gás... a 300 metros de onde os arruaceiros quebravam os carros. Mais não se aproximaram. O ano é eleitoral e urge evitar alguém ferido. Ou seja, teremos ainda muito a ver até as eleições.
Curiosamente, a imprensa absolve os ativistas do MPL e atribui a baderna aos tais de black block que, coincidentemente, sempre estão juntos com os primeiros. O MPL se exime dos quebra-quebras. "Não escolhemos quem participa dos nossos atos. Não foi o MPL que começou a destruição e não conseguimos sequer terminar o nosso ato, pois quando chegamos perto do largo da Batata fomos atingidos por bombas da polícia."
Até pode ser. Mas as manifestações pacíficas do movimento sempre terminam com carros e lojas incendiadas e milhões de reais de prejuízo. Quando alguém é preso — ou apreendido, este gentil eufemismo que a imprensa endossou quando o arruaceiro é menor de idade — tem seu nome registrado na polícia e é logo liberado, sem precisar sequer de advogado.
Segundo Denis Cicuto, diretor do Grupo Caltabiano, dono das duas lojas de carros depredadas, que foram abertas nove dias atrás: "Isso aqui não é terra de ninguém". Tem razão. É terra dos que se julgam no sagrado direito de destruir propriedades alheias. Com apoio das mais altas autoridades do país.
Alguém ainda lembra de Dona Dilma, quando, em junho do ano passado, saudava os vândalos como a nova força da nação? Se alguém já não lembra, eu lembro. Segundo a presidente, depredar ônibus, carros e bancos eram manifestações pacíficas próprias da democracia.
“O Brasil hoje acordou mais forte. A grandeza das manifestações de ontem comprovam (o plural é dela) a energia da nossa democracia, a força da voz das ruas e o civismo da nossa população. É bom ver tantos jovens e adultos, o neto, o pais, o avô juntos com a bandeira do Brasil cantando o hino nacional, dizendo com orgulho ‘eu sou brasileiro’ e defendendo um país melhor. O Brasil tem orgulho deles”, disse então a presidente.
O Brasil se orgulhava de seus baderneiros. Fernando Henrique Cardoso, que de seu glorioso climatério assistia de camarote os distúrbios de rua, perdeu uma ocasião única de ficar calado. Desqualificar os protestos dos jovens em São Paulo e outras capitais "como se fossem ação de baderneiros" constituía, na avaliação do ex-presidente, "um grave erro".
Para ele, "dizer que essas manifestações são violentas é parcial e não resolve. É melhor entendê-las, perceber que essas manifestações decorrem da carestia, da má qualidade dos serviços públicos, das injustiças, da corrupção". Geraldo Alckmin, que iniciou classificando os manifestantes como "vândalos" e "baderneiros", logo acudiu com panos quentes: "Queria fazer um elogio às lideranças do movimento e também à segurança pública e à Polícia Militar”. Para o governador, a primeira reunião com os utópicos desvairados do Movimento Passe Livre (MPL) foi positiva. "Foi uma reunião muito madura, muito proveitosa."
O resultado é o que vimos ontem, antes de ontem e desde há um ano. Não bastasse isto, o Crakgarten inaugurado por Haddad continua conquistando território. Os viciados na droga (perdão, leitor! Viciado é quem fuma cigarros. Quem fuma crack é usuário) ergueram nova favela no centro da cidade, entre a alameda Cleveland e a rua Helvétia, região mais degradada da Luz, centro de São Paulo, a uns 15 minutos de caminhada aqui de casa. E olhe que meu bairro é tido como nobre!
Trata-se do mesmo terreno onde foi erguida uma pequena favela removida no mês passado pela prefeitura ao lançar o programa "de Braços Abertos”, que consistiu em retirar os barracos e alojar seus moradores em quatro hotéis da região em troca de salário e emprego. Na época, com estes subsídios aos — como direi? — usuários, o preço do crack subiu em flecha no pedaço. A nova favela nem é para residência. Segundo um dos proprietários dos "imóveis", servem para ganhar algum dinheirinho: são alugadas para consumo do crack e relações sexuais. Leio no IG:
“Pode passar! Se você andar pelo canto da calçada, ninguém mexe”. O conselho é de um agente da Guarda Civil Metropolitana (GCM), que às 15h da última quinta-feira (20) acompanhava do carro a movimentação de pelo menos uma centena de dependentes de crack concentrados na região.
“Eles começaram a voltar faz umas duas semanas”, estimou ao iG um dos seguranças particulares que montam guarda na região, mas que pediu sigilo sobre sua identidade. Ao todo, cinco vigilantes observam o tumulto munidos de escuta e rádio. “Sem nenhuma autoridade ninguém anda aqui.”
Aos mais desavisados, a surpresa começa no largo Coração de Jesus, entre as alamedas Glete e Dino Bueno. O lixo pela rua, o comércio fechado e as discussões em voz alta impedem o avanço de quem precisa atravessar a via. A única garantia de segurança é uma viatura da CGM estacionada na metade do caminho.
A surpresa se transforma em susto ao se aproximar da esquina da Helvétia com a Cleveland. No entroncamento, dezenas de usuários de crack andam de um lado para o outro. Alguns consomem a droga, outros trocam socos, enquanto há quem prefira atendimento médico em uma tenda montada no terreno, mas ninguém ultrapassa o perímetro, delimitado por duas viaturas, duas motos e um micro ônibus da CGM.
A polícia está lá para proteger os — como direi? — utentes do crack, não o cidadão que paga seus tributos. Ou alguém já viu duas viaturas, duas motos e um micro ônibus da polícia protegendo alguém que não os crackeiros.
São Paulo é refém da democracia. Em ano eleitoral, em baderneiro não se bate nem com flor.
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