Por nove votos a cinco, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados rejeitou, na quarta-feira 6/5/09, a realização de uma audiência pública para apurar as denúncias de tortura, no Rio Grande do Sul, contra a empregada doméstica Ivone da Cruz, em 2001, durante interrogatório comandado pelo delegado Luiz Fernando Corrêa, atual diretor-geral da Polícia Federal. O requerimento havia sido feito pelo deputado Chico Alencar (PSol-RJ) com base em reportagem publicada na edição de 25 de março da CartaCapital. Ivone acusa Corrêa de tê-la torturado, com a ajuda de outros agentes da PF gaúcha para que confessasse a participação em um assalto na casa da avó da mulher do delegado federal. Por causa das supostas sevícias, Ivone ficou cega. Na Câmara, a empregada tem a companhia de outro denunciante, a ser convocado pela CDH, o deputado José Edmar (PR-DF). Há seis anos, o parlamentar acusa Corrêa de, também, tê-lo torturado.
Comandada pelo ministro da Justiça, Tarso Genro, a base governista da comissão montou uma operação de guerra para evitar a aprovação do requerimento de Chico Alencar. Até o líder do PT na Câmara, deputado Cândido Vacarezza (SP), foi chamado por Tarso para evitar a convocação — na verdade, um convite — do delegado Luiz Fernando Corrêa. Aos petistas e aliados da base governista, Vacarezza reverberou a tese da defesa de Corrêa, baseando pedido de arquivamento da denúncia feito pelo Ministério Público Federal, em 2007. “Como de costume, o Legislativo foi a reboque, submisso a outras instâncias”, lamentou Alencar. “Ivone vai seguir carregando sua cruz, o diretor-geral da PF perde a chance de jogar luz sobre este nebuloso episódio e a Câmara se apequena”, resume.
Todos os deputados do PT presentes à sessão da Comissão de Direitos Humanos da Câmara seguiram a orientação do líder Vacarezza. Entre eles, Iriny Lopes (ES), Pedro Wilson (GO) e Domingos Dutra (MA), todos com histórico de defesa na área de direitos humanos. O deputado Luiz Couto (PT-PB), presidente da comissão, foi um dos primeiros parlamentares a pedir providências para uma apuração parlamentar sobre as denúncias feitas pela empregada Ivone da Cruz. Na sessão de quarta-feira, contudo, se absteve de votar. Dos que ajudaram o PT a engavetar o pedido de audiência pública o maior destaque foi o deputado Edmar Moreira (sem partido-MG), acusado de usar verbas da Câmara para construir um castelo na cidade mineira de São João do Nepomuceno. Indicado pelo DEM, Moreira nunca havia comparecido antes a uma sessão da comissão.
Sem o apoio da Câmara dos Deputados, a única chance de Ivone da Cruz, agora, é conseguir levar o caso adiante na Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul. A julgar pela ação do PT, na quarta-feira passada, em Brasília, as chances da empregada, em Porto Alegre, deverão ser menores ainda. Lá, Tarso Genro se articula ostensivamente para sair candidato do partido ao governo do estado, em 2010. Uma ação dos deputados estaduais contra o delegado Luiz Fernando Corrêa, homem de confiança do ministro da Justiça no comando da PF, está, portanto, fora dos planos do PT gaúcho, também detentor da maioria na comissão de direitos humanos da Assembléia.
A reportagem de CartaCapital demonstrou que o delegado Corrêa comandou uma operação ilegal para interrogar a empregada Ivone da Cruz, em 2001, e depois forjou uma versão para justificar o fato de ter atropelado a competência da Polícia Civil do Rio Grande do Sul. Ouvido pela sindicância interna da PF, em 2005, o delegado civil Fernando Rosa Pontes, responsável pela investigação do assalto à casa da avó da mulher de Corrêa, negou ter solicitado ajuda do colega da PF — justamente a viga mestra da defesa do diretor-geral. Em 29 de janeiro passado, o corregedor-geral da PF, Valdinho Caetano, nomeado por Corrêa pouco mais de um mês antes, arquivou o processo.
Chama a atenção, nesse processo, duas circunstâncias distintas, mas convergentes. A primeira, diz respeito à posição do ministro Tarso Genro e, por extensão, do secretário especial de Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vannuchi. Ambos defendem a punição dos torturadores que operaram nos porões da ditadura militar (1964-1985). Para tal, contam, basicamente, com os depoimentos dos torturados, exatamente como no caso de Ivone da Cruz. Mas a semelhança do caso não para por aí. Assim como ocorreu com a empregada, as vítimas da ditadura também foram neutralizadas por processos legais. Talvez, no entanto, não tenham passado pelo vexame de, como Ivone, já totalmente cega, serem chamadas para fazer o reconhecimento visual dos possíveis algozes.
A segunda circunstância diz respeito à gritante diferença na utilização de pesos e medidas, dentro da Câmara dos Deputados, para levar investigações adiante. Na quinta-feira 7, a malfadada CPI das Escutas Clandestinas, conhecida como CPI dos Grampos, teve um fim melancólico depois de ter sido criada e mantida artificialmente. Nelson Pelegrino (PT-BA), relator da comissão, abandonou o posto para assumir um cargo no governo da Bahia. Foi substituído pela colega Iriny Lopes (PT-ES), que assumiu a inglória tarefa de encerrar um trabalho totalmente inócuo.
A Câmara dos Deputados perdeu, ainda, a chance de esclarecer a razão de, na tarde de 18 de setembro de 2008, o deputado José Edmar (PR-DF), com as narinas tapadas por chumaços de algodão, ter invadido uma sessão da Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência (CCAI) do Congresso Nacional. Na ocasião, o parlamentar virou-se para o presidente da comissão, senador Heráclito Fortes (DEM-PI) e anunciou: “Luiz Fernando é um torturador”. Ao lado do deputado, sentado à mesa de autoridades, o diretor-geral da Polícia Federal não sabia onde meter as mãos. “E reafirmo, e tenho como provar”, reforçou Edmar.
Naquele mesmo dia, pela manhã, José Edmar havia enviado duas cartas, ambas com o mesmo conteúdo, uma para Tarso Genro, outra para o ministro da Defesa, Nelson Jobim. No texto, o parlamentar chama o delegado Corrêa de “reles”, “trapalhão” e “maquiavélico” e o acusa, nominalmente, de tê-lo torturado, em 2003, nas dependências da Superintendência da Polícia Federal em Brasília. Na época, Edmar, então deputado distrital ligado ao grupo do ex-governador Joaquim Roriz, foi preso no bojo da Operação Grilo, da PF, acusado de grilagem de terras na capital federal. Ficou 29 dias na carceragem da PF. Lá, diz ter sido torturado física e psicologicamente por Corrêa.
A história de José Edmar foi registrada na Procuradoria-Geral da República, em 16 de setembro de 2008, dois dias antes de o delegado Luiz Fernando Corrêa comparecer à CCAI, uma espécie de CPI pirata comandada por Heráclito Fortes, líder da bancada do banqueiro Daniel Dantas no Congresso Nacional, montada para dar apoio à CPI dos Grampos, presidida pelo deputado Marcelo Itagiba (PMDB-RJ). Em ambas as comissões, tinha-se como atividade fundamental desconstruir a Operação Satiagraha e criminalizar as ações do delegado que a chefiou, Protógenes Queiroz, agora afastado da corporação.
Na representação criminal, ainda em avaliação, encaminhada ao procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, o deputado José Edmar faz uma série de acusações contra o delegado Corrêa, quando este ocupava o cargo de diretor regional da PF em Brasília, portanto, segundo na hierarquia da corporação na superintendência da capital federal. Corrêa, segundo a denúncia, costumava infernizar a vida do deputado — e dos outros 50 presos mantidos na carceragem — ao bater, sistematicamente, com um cassetete nas grades da prisão. “Ele gritava ‘confessa, deputado’, e dizia que eu iria ficar muito tempo preso se não falasse nada”, conta José Edmar. Mas o pior vinha a seguir, diz o deputado, eleito suplente, mas empossado na Câmara, no ano passado, na vaga de Augusto Carvalho (PPS-DF), atual secretário de Saúde do Distrito Federal.
De acordo com o depoimento de José Edmar, logo depois das sessões de cassetete nas grades, Luiz Eduardo Corrêa ia embora para casa, no final do expediente, mas mandava cortar a água da carceragem, por até 48 horas. “Éramos 50 homens, urinando e defecando num lugar sem água sequer para lavar as mãos”, lembra Edmar. “Para agüentar o mau cheiro, tínhamos que encher as narinas de papel higiênico, mesmo assim, era muito difícil suportar”, afirma. Foi por essa razão, inclusive, que o deputado decidiu protestar na CCAI, no dia do depoimento de Corrêa, com o nariz tapado por bolas de algodão.
“Como o delegado (Corrêa) dizia que a água era cortada por minha causa, os presos começaram a se voltar contra mim”, conta José Edmar. “Isso deu início a uma revolta generalizada, e passei a ser ameaçado todo o tempo”, diz o parlamentar. Corrêa, segundo o deputado, queria que ele confessasse ser o chefe de um esquema de grilagem de terras cujo principal articulador, segundo a polícia, era o ex-governador Joaquim Roriz. José Edmar diz ter sido implicado no caso porque Roriz queria, na verdade, proteger o ex-deputado distrital Pedro Passos (PMDB). De acordo com Edmar, Passos, que renunciou ao mandato, em 2007, é “filho bastardo” de Roriz — outro que renunciou ao mandato de senador, no mesmo ano, para não ser cassado sob suspeita de corrupção.
José Edmar denunciou Luiz Fernando Corrêa logo depois de sair da cadeia, em setembro de 2003, há seis anos, portanto. Na tribuna da Câmara Legislativa do DF, no dia 9 daquele mês, ele contou, pela primeira vez, ter sofrido maus tratos dentro da carceragem da PF, em Brasília. Além dos eventos relativos às batidas de cassetetes nas grades das celas e ao corte de água, Edmar também denunciou a tortura, por choques elétricos, de um preso identificado apenas pelo primeiro nome, Marcelo. Na época, o assunto foi encaminhado à Comissão de Direitos Humanos da Câmara Distrital, mas não deu em nada.
Em 22 de setembro de 2008, quatro dias depois de protestar contra o diretor-geral da PF no plenário da CCAI, no Senado Federal, José Edmar voltou a denunciar a tortura. Desta vez, subiu à tribuna da Câmara dos Deputados. “Fui jogado, injustamente, numa fétida masmorra, e ali penei por 29 dias”, discursou o deputado. Acusou novamente Corrêa de torturá-lo e desafiou a PF a provar, seis anos depois, a participação dele no esquema de grilagem apontado pela Operação Grilo. “Nunca sequer fui processado”, afirma José Edmar. A prisão dele, no entanto, não resultou só em complicações pessoais e políticas. Quatro meses depois de ter sido solto, o filho mais novo dele, de 20 anos, cometeu suicídio. “Ele não agüentou a pressão contra o pai”, lamenta o deputado.
Em entrevista a CartaCapital, quando da denúncia de tortura feita pela empregada Ivone da Cruz, o delegado Luiz Fernando Corrêa negou todas as acusações feitas pelo deputado José Edmar. De acordo com a assessoria de imprensa da PF, nenhuma investigação a respeito foi realizada. Na verdade, a representação criminal feita por José Edmar foi acolhida pelo Ministério Público e ainda tramita, na Procuradoria-Geral da República, na forma de procedimento administrativo, e aguarda parecer.
Comandada pelo ministro da Justiça, Tarso Genro, a base governista da comissão montou uma operação de guerra para evitar a aprovação do requerimento de Chico Alencar. Até o líder do PT na Câmara, deputado Cândido Vacarezza (SP), foi chamado por Tarso para evitar a convocação — na verdade, um convite — do delegado Luiz Fernando Corrêa. Aos petistas e aliados da base governista, Vacarezza reverberou a tese da defesa de Corrêa, baseando pedido de arquivamento da denúncia feito pelo Ministério Público Federal, em 2007. “Como de costume, o Legislativo foi a reboque, submisso a outras instâncias”, lamentou Alencar. “Ivone vai seguir carregando sua cruz, o diretor-geral da PF perde a chance de jogar luz sobre este nebuloso episódio e a Câmara se apequena”, resume.
Todos os deputados do PT presentes à sessão da Comissão de Direitos Humanos da Câmara seguiram a orientação do líder Vacarezza. Entre eles, Iriny Lopes (ES), Pedro Wilson (GO) e Domingos Dutra (MA), todos com histórico de defesa na área de direitos humanos. O deputado Luiz Couto (PT-PB), presidente da comissão, foi um dos primeiros parlamentares a pedir providências para uma apuração parlamentar sobre as denúncias feitas pela empregada Ivone da Cruz. Na sessão de quarta-feira, contudo, se absteve de votar. Dos que ajudaram o PT a engavetar o pedido de audiência pública o maior destaque foi o deputado Edmar Moreira (sem partido-MG), acusado de usar verbas da Câmara para construir um castelo na cidade mineira de São João do Nepomuceno. Indicado pelo DEM, Moreira nunca havia comparecido antes a uma sessão da comissão.
Sem o apoio da Câmara dos Deputados, a única chance de Ivone da Cruz, agora, é conseguir levar o caso adiante na Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul. A julgar pela ação do PT, na quarta-feira passada, em Brasília, as chances da empregada, em Porto Alegre, deverão ser menores ainda. Lá, Tarso Genro se articula ostensivamente para sair candidato do partido ao governo do estado, em 2010. Uma ação dos deputados estaduais contra o delegado Luiz Fernando Corrêa, homem de confiança do ministro da Justiça no comando da PF, está, portanto, fora dos planos do PT gaúcho, também detentor da maioria na comissão de direitos humanos da Assembléia.
A reportagem de CartaCapital demonstrou que o delegado Corrêa comandou uma operação ilegal para interrogar a empregada Ivone da Cruz, em 2001, e depois forjou uma versão para justificar o fato de ter atropelado a competência da Polícia Civil do Rio Grande do Sul. Ouvido pela sindicância interna da PF, em 2005, o delegado civil Fernando Rosa Pontes, responsável pela investigação do assalto à casa da avó da mulher de Corrêa, negou ter solicitado ajuda do colega da PF — justamente a viga mestra da defesa do diretor-geral. Em 29 de janeiro passado, o corregedor-geral da PF, Valdinho Caetano, nomeado por Corrêa pouco mais de um mês antes, arquivou o processo.
Chama a atenção, nesse processo, duas circunstâncias distintas, mas convergentes. A primeira, diz respeito à posição do ministro Tarso Genro e, por extensão, do secretário especial de Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vannuchi. Ambos defendem a punição dos torturadores que operaram nos porões da ditadura militar (1964-1985). Para tal, contam, basicamente, com os depoimentos dos torturados, exatamente como no caso de Ivone da Cruz. Mas a semelhança do caso não para por aí. Assim como ocorreu com a empregada, as vítimas da ditadura também foram neutralizadas por processos legais. Talvez, no entanto, não tenham passado pelo vexame de, como Ivone, já totalmente cega, serem chamadas para fazer o reconhecimento visual dos possíveis algozes.
A segunda circunstância diz respeito à gritante diferença na utilização de pesos e medidas, dentro da Câmara dos Deputados, para levar investigações adiante. Na quinta-feira 7, a malfadada CPI das Escutas Clandestinas, conhecida como CPI dos Grampos, teve um fim melancólico depois de ter sido criada e mantida artificialmente. Nelson Pelegrino (PT-BA), relator da comissão, abandonou o posto para assumir um cargo no governo da Bahia. Foi substituído pela colega Iriny Lopes (PT-ES), que assumiu a inglória tarefa de encerrar um trabalho totalmente inócuo.
A Câmara dos Deputados perdeu, ainda, a chance de esclarecer a razão de, na tarde de 18 de setembro de 2008, o deputado José Edmar (PR-DF), com as narinas tapadas por chumaços de algodão, ter invadido uma sessão da Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência (CCAI) do Congresso Nacional. Na ocasião, o parlamentar virou-se para o presidente da comissão, senador Heráclito Fortes (DEM-PI) e anunciou: “Luiz Fernando é um torturador”. Ao lado do deputado, sentado à mesa de autoridades, o diretor-geral da Polícia Federal não sabia onde meter as mãos. “E reafirmo, e tenho como provar”, reforçou Edmar.
Naquele mesmo dia, pela manhã, José Edmar havia enviado duas cartas, ambas com o mesmo conteúdo, uma para Tarso Genro, outra para o ministro da Defesa, Nelson Jobim. No texto, o parlamentar chama o delegado Corrêa de “reles”, “trapalhão” e “maquiavélico” e o acusa, nominalmente, de tê-lo torturado, em 2003, nas dependências da Superintendência da Polícia Federal em Brasília. Na época, Edmar, então deputado distrital ligado ao grupo do ex-governador Joaquim Roriz, foi preso no bojo da Operação Grilo, da PF, acusado de grilagem de terras na capital federal. Ficou 29 dias na carceragem da PF. Lá, diz ter sido torturado física e psicologicamente por Corrêa.
A história de José Edmar foi registrada na Procuradoria-Geral da República, em 16 de setembro de 2008, dois dias antes de o delegado Luiz Fernando Corrêa comparecer à CCAI, uma espécie de CPI pirata comandada por Heráclito Fortes, líder da bancada do banqueiro Daniel Dantas no Congresso Nacional, montada para dar apoio à CPI dos Grampos, presidida pelo deputado Marcelo Itagiba (PMDB-RJ). Em ambas as comissões, tinha-se como atividade fundamental desconstruir a Operação Satiagraha e criminalizar as ações do delegado que a chefiou, Protógenes Queiroz, agora afastado da corporação.
Na representação criminal, ainda em avaliação, encaminhada ao procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, o deputado José Edmar faz uma série de acusações contra o delegado Corrêa, quando este ocupava o cargo de diretor regional da PF em Brasília, portanto, segundo na hierarquia da corporação na superintendência da capital federal. Corrêa, segundo a denúncia, costumava infernizar a vida do deputado — e dos outros 50 presos mantidos na carceragem — ao bater, sistematicamente, com um cassetete nas grades da prisão. “Ele gritava ‘confessa, deputado’, e dizia que eu iria ficar muito tempo preso se não falasse nada”, conta José Edmar. Mas o pior vinha a seguir, diz o deputado, eleito suplente, mas empossado na Câmara, no ano passado, na vaga de Augusto Carvalho (PPS-DF), atual secretário de Saúde do Distrito Federal.
De acordo com o depoimento de José Edmar, logo depois das sessões de cassetete nas grades, Luiz Eduardo Corrêa ia embora para casa, no final do expediente, mas mandava cortar a água da carceragem, por até 48 horas. “Éramos 50 homens, urinando e defecando num lugar sem água sequer para lavar as mãos”, lembra Edmar. “Para agüentar o mau cheiro, tínhamos que encher as narinas de papel higiênico, mesmo assim, era muito difícil suportar”, afirma. Foi por essa razão, inclusive, que o deputado decidiu protestar na CCAI, no dia do depoimento de Corrêa, com o nariz tapado por bolas de algodão.
“Como o delegado (Corrêa) dizia que a água era cortada por minha causa, os presos começaram a se voltar contra mim”, conta José Edmar. “Isso deu início a uma revolta generalizada, e passei a ser ameaçado todo o tempo”, diz o parlamentar. Corrêa, segundo o deputado, queria que ele confessasse ser o chefe de um esquema de grilagem de terras cujo principal articulador, segundo a polícia, era o ex-governador Joaquim Roriz. José Edmar diz ter sido implicado no caso porque Roriz queria, na verdade, proteger o ex-deputado distrital Pedro Passos (PMDB). De acordo com Edmar, Passos, que renunciou ao mandato, em 2007, é “filho bastardo” de Roriz — outro que renunciou ao mandato de senador, no mesmo ano, para não ser cassado sob suspeita de corrupção.
José Edmar denunciou Luiz Fernando Corrêa logo depois de sair da cadeia, em setembro de 2003, há seis anos, portanto. Na tribuna da Câmara Legislativa do DF, no dia 9 daquele mês, ele contou, pela primeira vez, ter sofrido maus tratos dentro da carceragem da PF, em Brasília. Além dos eventos relativos às batidas de cassetetes nas grades das celas e ao corte de água, Edmar também denunciou a tortura, por choques elétricos, de um preso identificado apenas pelo primeiro nome, Marcelo. Na época, o assunto foi encaminhado à Comissão de Direitos Humanos da Câmara Distrital, mas não deu em nada.
Em 22 de setembro de 2008, quatro dias depois de protestar contra o diretor-geral da PF no plenário da CCAI, no Senado Federal, José Edmar voltou a denunciar a tortura. Desta vez, subiu à tribuna da Câmara dos Deputados. “Fui jogado, injustamente, numa fétida masmorra, e ali penei por 29 dias”, discursou o deputado. Acusou novamente Corrêa de torturá-lo e desafiou a PF a provar, seis anos depois, a participação dele no esquema de grilagem apontado pela Operação Grilo. “Nunca sequer fui processado”, afirma José Edmar. A prisão dele, no entanto, não resultou só em complicações pessoais e políticas. Quatro meses depois de ter sido solto, o filho mais novo dele, de 20 anos, cometeu suicídio. “Ele não agüentou a pressão contra o pai”, lamenta o deputado.
Em entrevista a CartaCapital, quando da denúncia de tortura feita pela empregada Ivone da Cruz, o delegado Luiz Fernando Corrêa negou todas as acusações feitas pelo deputado José Edmar. De acordo com a assessoria de imprensa da PF, nenhuma investigação a respeito foi realizada. Na verdade, a representação criminal feita por José Edmar foi acolhida pelo Ministério Público e ainda tramita, na Procuradoria-Geral da República, na forma de procedimento administrativo, e aguarda parecer.
Leandro Fortes
Fonte: Carta Capital.
COMENTO: reitero o que foi escrito em uma postagem anterior sobre o assunto: Alguém fará passeata contra isso? Vão pegar o megafone? Vão até alguma sede da PF? Vão nada! Claro que não vão! Nem mandarão cartinha! Cadê os intelectuais? Não farão nada! Cadê o megafone? Nada, né? Nem vão usar as vítimas como massa de manobra partidária.
Isso porque são uns paus-mandados e têm uma indignação ideológica curiosamente seletiva. O compromisso não é com um ideal ou uma causa: o rabo é preso a um partido, uma legenda. É mesquinharia partidária, e não grandeza ideológica. E o mais interessante do caso é que não me lembro de ter lido nada na "grande imprensa". Terá sido falha minha ou as verbas governamentais de "comunicação social" falaram mais alto?
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Isso porque são uns paus-mandados e têm uma indignação ideológica curiosamente seletiva. O compromisso não é com um ideal ou uma causa: o rabo é preso a um partido, uma legenda. É mesquinharia partidária, e não grandeza ideológica. E o mais interessante do caso é que não me lembro de ter lido nada na "grande imprensa". Terá sido falha minha ou as verbas governamentais de "comunicação social" falaram mais alto?
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