por Janer Cristaldo
Em fevereiro passado, o CNPq anunciou a cobrança dos bolsistas que não voltaram para o Brasil. Os casos analisados em 2008 somam R$ 22 milhões. Alguns estudantes desistiram do curso. O CNPq pretende reaver cerca de R$ 22 milhões referentes a 65 bolsas de estudo concedidas a universitários que estudaram em outros países, mas que não concluíram a pós-graduação ou não voltaram ao Brasil. Muitos dos processos são de bolsas concedidas há anos, no entanto, só em 2008 foram finalizados e encaminhados ao Tribunal de Contas da União. Desde 2002, a CGU recebeu processos do CNPq que totalizam cerca de R$ 71 milhões (valor corrigido). Com o recurso, seria possível pagar 300 bolsas no exterior.
Na ocasião, manifestei meu ceticismo aos bons propósitos do CNPq. Se um bolsista, tendo concluído seu doutorado, recebe boa oferta de trabalho no Exterior, qual instância, humana ou divina, o obrigará a ressarcir a União? Terá seus bens executados no Exterior? Será pedida sua extradição? Qualquer destes procedimentos custará bem mais caro que o valor da bolsa.
Na ocasião, o Estado de São Paulo citou o caso do advogado Cláudio Rollemberg, de quem estão sendo cobrados R$ 608 mil (em valores corrigidos). O advogado foi para a França em 1991 fazer um mestrado em direito internacional. Até hoje, 18 anos após a obtenção da bolsa, ainda não conseguiu elaborar um ensaiozinho de 400 ou 500 páginas. Mas não pretende devolver um centavo à União. Só entregará sua tese quando conseguir elaborá-la e estamos conversados. Devo, reconheço, mas não pago. Sua atitude é a mesma dos deputados e senadores, que declararam não saber que não podiam levar mulher, filhos, sogras e amantes para Paris e Miami. Diz que quando assinou o contrato não foi avisado de que poderia ser obrigado a devolver os valores caso não cumprisse as obrigações. "Todo mundo entendia que era gratuito, que era uma questão ideológica".
Leio hoje na Folha Online que o TCU condenou a pesquisadora Ana Maria dos Santos Carmo a devolver R$ 489 mil ao CNPq, por descumprir um compromisso firmado com a instituição. Nada menos que US$ 223 mil, ao câmbio de hoje. A estudante não retornou ao Brasil após concluir seus estudos de pós-doutorado nos Estados Unidos, em química de solos, custeados pelo conselho. Carmo alega a falta de emprego em sua área de trabalho. Até se dispõe a pagar o montante, desde que parcelados em US$ 100 mensais. Em apenas 2.230 meses, a dívida estaria quitada. Ou seja, em pouco mais de 185 anos, os cofres públicos seriam ressarcidos. Proposta generosa, não chega sequer a dois séculos. O CNPq não gostou e sugeriu à moça outro parcelamento, de US$ 860,36 mensais. Não vai levar. Nesses termos, a pesquisadora prefere não pagar.
E daí? Irá o CNPq entrar com um processo de cobrança internacional? Vai constituir advogado nalgum Estado americano para executar a dvedora? Pedirá aos Estados Unidos a extradição da universitária inadimplente? Segundo o TCU, Carmo garantiu que, concluído o curso, retornaria ao Brasil. Garantiu como? Disse “te juro que eu volto”? Ou assinou um termo de compromisso? A verdade é que a farra da bolsa no Exterior é tão ou mais vasta que a farra das passagens aéreas e o Estado não tem meios de coibi-la. A cobrança do CNPq é meramente retórica.
Na quinta-feira, eu comentava outra anomalia da universidade brasileira, a dos doutorandos carecas, pessoas que defendem tese já em idade de aposentar-se. A Folha noticiava — como se fosse um caso de suscitar admiração — o caso de um senhor que concluiu mestrado aos 63 anos e doutorado aos 68. Ora, segundo o TCU, o retorno exigido dos pesquisadores tem como objetivo disseminar e aplicar os conhecimentos adquiridos pelo estudante em benefício da sociedade brasileira. Como vai um professor em idade de aposentadoria aplicar os conhecimentos adquiridos em benefício da sociedade brasileira? A nortear-se pelos critérios do TCU, todo professor que defende tese e logo se aposenta também deveria devolver o que nele foi investido. Estes não são poucos no universo acadêmico nacional. Postulam o título para garantir uma aposentadoria mais gorda.
A farra com o dinheiro dos contribuintes que hoje fazem os parlamentares há muito vem sendo feita junto ao CNPq. Se deputados e senadores, que representam o eleitorado brasileiro, não estão nenhum pouquinho propensos a devolver o dinheiro gasto em turismo aos cofres públicos, por que razões devolveria o despendido em uma bolsa um profissional que não representa nada, nem mesmo a entidade que o enviou ao Exterior?
O CNPq fala em 65 bolsistas inadimplentes. A cifra é tímida. Escândalos no Brasil são como filhos de bispo, escrevi ontem. Você puxa um e vem uma fieira. O Estado tem bolso grande e ninguém cuida. Por outro lado, que moral tem um Estado — cujos credores estão morrendo às dezenas de milhares, sem que lhes seja pago o que Estado deve — para exigir cobrança de quem quer que seja? Este Estado não tem moral nem mesmo para cobrar o Imposto de Renda. Eu não sonego porque não posso. Mas considero que sonegar, neste país nosso, é legítima defesa do patrimônio.
Há um clamor nacional contra os deputados e senadores turistas. Que vai dar em nada, é claro. Mesmo que sejam cortadas as passagens aos familiares, amigos e prostitutas, nada impede que o parlamentar continue viajando a pretexto de congressos, viagens de observação e estudos por países cuja língua desconhece e não tem interesse algum em conhecer. O turismo de luxo virou objeto de desejo e nossos representantes, afinal de contas, são seres humanos, como se justifica o ex-bispo presidente do Paraguai, Dom Fernando Lugo, el semental de la Pátria. Acontece que o Congresso é a bola da vez dos jornalistas.
As viagens se tornaram constrangedoras para os senhores deputados. Hoje, quem quiser conhecer as prestigiosas capitais do Primeiro Mundo, seus monumentos, restaurantes e gastronomia, melhor fará se optar pelo magistério universitário. É a fórmula mais confortável de viajar pelo mundo sem pagar um vintém do próprio bolso.
Na ocasião, manifestei meu ceticismo aos bons propósitos do CNPq. Se um bolsista, tendo concluído seu doutorado, recebe boa oferta de trabalho no Exterior, qual instância, humana ou divina, o obrigará a ressarcir a União? Terá seus bens executados no Exterior? Será pedida sua extradição? Qualquer destes procedimentos custará bem mais caro que o valor da bolsa.
Na ocasião, o Estado de São Paulo citou o caso do advogado Cláudio Rollemberg, de quem estão sendo cobrados R$ 608 mil (em valores corrigidos). O advogado foi para a França em 1991 fazer um mestrado em direito internacional. Até hoje, 18 anos após a obtenção da bolsa, ainda não conseguiu elaborar um ensaiozinho de 400 ou 500 páginas. Mas não pretende devolver um centavo à União. Só entregará sua tese quando conseguir elaborá-la e estamos conversados. Devo, reconheço, mas não pago. Sua atitude é a mesma dos deputados e senadores, que declararam não saber que não podiam levar mulher, filhos, sogras e amantes para Paris e Miami. Diz que quando assinou o contrato não foi avisado de que poderia ser obrigado a devolver os valores caso não cumprisse as obrigações. "Todo mundo entendia que era gratuito, que era uma questão ideológica".
Leio hoje na Folha Online que o TCU condenou a pesquisadora Ana Maria dos Santos Carmo a devolver R$ 489 mil ao CNPq, por descumprir um compromisso firmado com a instituição. Nada menos que US$ 223 mil, ao câmbio de hoje. A estudante não retornou ao Brasil após concluir seus estudos de pós-doutorado nos Estados Unidos, em química de solos, custeados pelo conselho. Carmo alega a falta de emprego em sua área de trabalho. Até se dispõe a pagar o montante, desde que parcelados em US$ 100 mensais. Em apenas 2.230 meses, a dívida estaria quitada. Ou seja, em pouco mais de 185 anos, os cofres públicos seriam ressarcidos. Proposta generosa, não chega sequer a dois séculos. O CNPq não gostou e sugeriu à moça outro parcelamento, de US$ 860,36 mensais. Não vai levar. Nesses termos, a pesquisadora prefere não pagar.
E daí? Irá o CNPq entrar com um processo de cobrança internacional? Vai constituir advogado nalgum Estado americano para executar a dvedora? Pedirá aos Estados Unidos a extradição da universitária inadimplente? Segundo o TCU, Carmo garantiu que, concluído o curso, retornaria ao Brasil. Garantiu como? Disse “te juro que eu volto”? Ou assinou um termo de compromisso? A verdade é que a farra da bolsa no Exterior é tão ou mais vasta que a farra das passagens aéreas e o Estado não tem meios de coibi-la. A cobrança do CNPq é meramente retórica.
Na quinta-feira, eu comentava outra anomalia da universidade brasileira, a dos doutorandos carecas, pessoas que defendem tese já em idade de aposentar-se. A Folha noticiava — como se fosse um caso de suscitar admiração — o caso de um senhor que concluiu mestrado aos 63 anos e doutorado aos 68. Ora, segundo o TCU, o retorno exigido dos pesquisadores tem como objetivo disseminar e aplicar os conhecimentos adquiridos pelo estudante em benefício da sociedade brasileira. Como vai um professor em idade de aposentadoria aplicar os conhecimentos adquiridos em benefício da sociedade brasileira? A nortear-se pelos critérios do TCU, todo professor que defende tese e logo se aposenta também deveria devolver o que nele foi investido. Estes não são poucos no universo acadêmico nacional. Postulam o título para garantir uma aposentadoria mais gorda.
A farra com o dinheiro dos contribuintes que hoje fazem os parlamentares há muito vem sendo feita junto ao CNPq. Se deputados e senadores, que representam o eleitorado brasileiro, não estão nenhum pouquinho propensos a devolver o dinheiro gasto em turismo aos cofres públicos, por que razões devolveria o despendido em uma bolsa um profissional que não representa nada, nem mesmo a entidade que o enviou ao Exterior?
O CNPq fala em 65 bolsistas inadimplentes. A cifra é tímida. Escândalos no Brasil são como filhos de bispo, escrevi ontem. Você puxa um e vem uma fieira. O Estado tem bolso grande e ninguém cuida. Por outro lado, que moral tem um Estado — cujos credores estão morrendo às dezenas de milhares, sem que lhes seja pago o que Estado deve — para exigir cobrança de quem quer que seja? Este Estado não tem moral nem mesmo para cobrar o Imposto de Renda. Eu não sonego porque não posso. Mas considero que sonegar, neste país nosso, é legítima defesa do patrimônio.
Há um clamor nacional contra os deputados e senadores turistas. Que vai dar em nada, é claro. Mesmo que sejam cortadas as passagens aos familiares, amigos e prostitutas, nada impede que o parlamentar continue viajando a pretexto de congressos, viagens de observação e estudos por países cuja língua desconhece e não tem interesse algum em conhecer. O turismo de luxo virou objeto de desejo e nossos representantes, afinal de contas, são seres humanos, como se justifica o ex-bispo presidente do Paraguai, Dom Fernando Lugo, el semental de la Pátria. Acontece que o Congresso é a bola da vez dos jornalistas.
As viagens se tornaram constrangedoras para os senhores deputados. Hoje, quem quiser conhecer as prestigiosas capitais do Primeiro Mundo, seus monumentos, restaurantes e gastronomia, melhor fará se optar pelo magistério universitário. É a fórmula mais confortável de viajar pelo mundo sem pagar um vintém do próprio bolso.
Fonte: Janer Cristaldo
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