Maj Cav Salgueiro Maia – Exército Português
Deve-se a Carlos VII, rei da França, o aparecimento da Cavalaria como Arma. Foi ele que, por volta de 1445, instituiu o primeiro exército permanente, constituído por duas Armas: a Cavalaria e a Infantaria.
Devido à evolução dos armamentos no final do século XV, começaram a aparecer unidades de Cavalaria com armas de fogo, e no século seguinte a Cavalaria passa a ser constituída por três tipos de unidades: COURACEIROS (Cavalaria pesada), HUSSARDOS (Cavalaria ligeira) e DRAGÕES (Cavalaria apta a combater a pé e a cavalo).
Com o século XVII, devido à ação de Gustavo Adolfo, a Cavalaria como arma alcança vários êxitos, em especial na batalha de Breitenfeld, junto a Leipzig (guerra dos Trinta Anos). Esses êxitos são devidos à justa utilização da Arma, aproveitando a sua aptidão para o reconhecimento, ação de choque e a perseguição. Podemos definir a Cavalaria desta época pelas palavras do Marechal de Saxe: “A Cavalaria deve ser lesta, deve ser montada sobre cavalos próprios para suportar a fadiga, deve ter poucas equipagens, e sobretudo não deve ter cavalos gordos”. Nem todos compreenderam assim a ação da Cavalaria, continuando-se a fazer o fogo a cavalo, numa ação conhecida como “caracolada”, que consistia em carregar sobre o inimigo, disparar as armas de determinada distancia, fazer uma pirueta, e voltar à retaguarda para carregar as armas, com vistas a desenvolver novamente a mesma ação.
Foi na Prússia, com Frederico II, que a Cavalaria começou a traçar caminho certo. Bem apoiado em seus generais Zeithen e Sedlitz, Frederico II abandona o fogo a cavalo, criando a Artilharia a cavalo, tendo por missão apoiar a ação das cargas da Cavalaria, mantendo as demais peças fixas da Artilharia para fazer o fogo de cobertura. Frederico II determina que as cargas se façam a galope, que os cavaleiros continuem a usar mosquetes e espingardas para o combate a peado; utilizou ainda largamente, a Cavalaria no reconhecimento, dizendo que ela era “os olhos e ouvidos do Exército”.
A influência da ação de Frederico II, estendeu-se a França, onde cimentou as bases do que seria a famosa Cavalaria Napoleônica, que fica definida através das palavras do seu chefe Napoleão: “A Cavalaria de linha só pode ser eficaz em grandes massas, tanto no começo, como no decorrer, como no fim do combate, conforme as circunstâncias; deve ser independente das outras armas para poder ser empenhada oportuna e independentemente delas, concorrendo no entanto com elas para o fim comum. Deve pertencer por isso à reserva do Exército”. Napoleão criou um Corpo de Cavalaria de 28.000 homens, o “Corpo Murat”, com dois Regimentos de Cavalaria Ligeira; o primeiro, antecessor das unidades blindadas e o segundo, das unidades mecanizadas. Com Napoleão a cavalaria passou a ser a Arma do ataque decisivo, explorando a brecha que a Artilharia preparava. Assim ele atuou em Wagron, Moscou, Essling e Iéna.
A intervenção em massa do Corpo de Cavalaria (Corpo Murat), era caracterizada pela velocidade e violência, em ligação com a Artilharia. O Corpo de Cavalaria estava organizado para poder atuar isoladamente (reconhecimento e perseguição). Com a substituição das armas de repetição por armas de maior cadencia de tiro, chegou-se na guerra de 1870, entre a França e a Prússia, à conclusão de que o emprego da carga a cavalo com grandes massas era impraticável no campo de batalha. A agravar a situação, a Cavalaria estava sendo utilizada junto com a Infantaria, não tirando proveito de sua mobilidade, passando a desempenhar só ações de reconhecimento e cobertura.
Quando em 1914 se iniciaram as operações, a Cavalaria francesa estava possuída de um alto espírito ofensivo e desejosa de tirar a desforra das ações de 1870. Assim, a Cavalaria francesa procura a todo o instante o encontro à arma branca, enquanto a Cavalaria alemã a atrai e espera, sob a ação de seu fogo.
A Cavalaria alemã atua em cooperação com ciclistas, metralhadoras e Artilharia, sem abandonar o combate a cavalo e à arma branca. Com a estabilização da frente, a Alemanha quase abandona a Cavalaria, enquanto que a França lhe dá meios mais potentes, sem lhe tirar a mobilidade. Desta maneira, quando a guerra termina, de um lado quase não há Cavalaria, do outro existe a Cavalaria pronta para passar à exploração do sucesso.
Com o desenvolvimento dos armamentos, e com a guerra de posição que foi a guerra de 1914/1918, foi necessário criar algo, que pudesse atuar fora das trincheiras, protegido dos fogos do inimigo; baseados em máquinas agrícolas idealizadas para o trabalho em todo o terreno, constroem-se viaturas com blindagem suficiente para anular os efeitos dos fogos contrários, surgem assim as primeiras viaturas blindadas.
Em outubro de 1914, um Oficial inglês, o Ten Cel Stern, segundo uns, ou o Ten Cel Swinton segundo outros, apresenta o projeto da construção de uma viatura blindada, capaz de transportar pessoal através do campo de batalha, abrigado da ação das armas ligeiras e estilhaços das granadas de Artilharia. Como meio de locomoção seria utilizado o sistema de lagartas usado pelos tratores, que podiam deslocar-se por terrenos onde viaturas com rodas ficavam detidas. Os resultados dessas ideias depressa se concretizam e, em 20 de novembro de 1917, na ofensiva de Cambrai, 500 carros de combate sob o comando do Brigadeiro H. J. Elles, realizam a ruptura da Linha Hindemburgo, numa profundidade de 15 km, com a captura de 8.000 homens e 100 peças de Artilharia, em cerca de 12 horas de combate, com um volume de perdas e um gasto de munição muito menor, quando comparado com operações anteriores de idênticos resultados. Essas viaturas viriam a desempenhar as funções para as quais foi criada a Cavalaria a cavalo: o reconhecimento, a ruptura e a exploração do sucesso. Foram essas viaturas para a Cavalaria as sucessoras dos cavalos, para que a arma pudesse continuar a cumprir as missões para que fora criada.
Depois da Primeira Grande Guerra, voltaram a ser aplicados os conceitos de Napoleão sobre a ação da Cavalaria, agora aplicados ao novo material e às novas situações. Defendendo estes conceitos, surge na França o Cel Charles de Gaulle e na América o Gen Chaffe. Infelizmente ambos não foram compreendidos e suas Pátrias somente anos mais tarde vieram a lhes dar razão, quando a Alemanha surgia cheia de força, concretizando os princípios por eles defendidos.
Na Alemanha, o Cel Heinz Guderian, tornou-se o orientador da nova Cavalaria, criando as Panzerdivisionen, nos moldes preconizados por de Gaulle. Von Guderian seria o pai das unidades blindadas alemãs e o invasor da Rússia; soube conjugar grandes massas de blindados, acompanhados por Infantaria motorizada, apoiados por Artilharia autopropulsada e pela nova arma, a aviação, através dos seus aviões de caça, de proteção, e de outros, construídos essencialmente obedecendo às novas necessidades, tais como os célebres Stukas (aviões de assalto idealizados para fazerem o acompanhamento dos blindados pelo fogo).
A máquina de guerra da Alemanha, ensaiada durante a guerra civil da Espanha, surgiu plena de mobilidade e poder de choque, baseada numa Cavalaria que soube aproveitar as possibilidades, do que foi e será sempre uma Arma ofensiva. São de assinalar as palavras do Marechal Montgomery, ao constituir o Corpo de Reserva do VIII Exército na Líbia: “Este Corpo, praticamente formado de Divisões Blindadas, deverá ser preparado para constituir a ponta de lança da nossa ação ofensiva e nunca deverá ser empregado para defender posições estáticas”.
Depois da guerra de 1939/1945, com o advento da guerra nuclear, maior desenvolvimento sofreram as unidades de Cavalaria, tornando-se mais móveis, flexíveis e com maior poder ofensivo, para manter a possibilidade de facilmente se concentrar para um ataque , e dispersar depois deste, com vistas a não oferecer um objetivo compensador a um bombardeio nuclear, aperfeiçoando as suas blindagens para agora se protegerem também da ação das poeiras radioativas.
No fundo, todas as alterações são superficiais, visto que permanecem imutáveis os dois tipos essenciais de unidades de Cavalaria, os blindados para desenvolver a ação de choque, ruptura e a exploração do sucesso, e as unidades de Cavalaria Mecanizada, empregando meios terrestres e aéreos, para garantir o reconhecimento.
Como contraste verificamos que sempre o papel da Cavalaria se eleva ou apaga através dos tempos, conforme é respeitada ou esquecida a sua doutrina de emprego.
Fonte: Facebook
.
Nenhum comentário:
Postar um comentário