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Na data em que se comemora o nascimento do Patrono da Arma de Cavalaria, transcrevo o texto de Carlos Fonttes, Sargento da Reserva do Exército, membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil (AHIMTB) publicado em Artistas Gaúchos e atualizado por correio eletrônico.
"Quando publicamos a obra “Regimento Dragões do Rio Grande – Evolução Histórica do 4º Regimento de Cavalaria Blindado” em 2001, sobre a OM da cidade de São Luiz Gonzaga, uma das mais antigas Unidades da Arma de Cavalaria em nosso estado, realizando as várias “pesquisas de campo” deparei-me com um emocionante fato sobre o grande Marechal Manoel Luiz Osório, Marquês do Herval e patrono da Arma de Cavalaria, durante sua brilhante carreira militar, acontecido na região da Barra do Quaraí, (Uruguaiana-RS).
Ao ser promovido ao posto de Tenente em 12 de outubro de 1827 no 5º Regimento de Cavalaria (hoje 4º RCB), sediado na cidade de Bagé, teve sua unidade transferida para Rio Pardo, onde permaneceu até 1834.
A fama do jovem oficial de apenas 20 anos de idade, já corria o mundo, causando entre as moças da sociedade local, grande interesse por ouvirem falar a seu respeito, narrativas de heroísmo e bravura.
J.B. Magalhães, um dos mais completos biógrafos de Osório, narrando sua vida amorosa nesse período, cita o que talvez tenha sido um dos grandes infortúnios na vida de Osório, o relacionamento com uma jovem chamada Ana, a quem Osório apelidou de Lídia, musa inspiradora de seus versos. Apesar da imposição restritiva da família da jovem, sob a alegação de que Osório, como Tenente, não teria condições de garantir a vida promissora de Ana, ela continuou esse romance, não desanimando. O pai da jovem, um rico fazendeiro daquela região, com forte influência na Corte, intercedendo junto ao Comandante das Armas, consegue a transferência de Osório para os destacamentos de fronteira.
Sem esquecer sua amada, parte Osório para sua árdua missão, em guarnecer as fronteiras da Província.
Os pais de Ana, preocupados em zelar pela filha e tratando de apagar as lembranças de seu grande amor, divulgam a notícia de que Osório havia morrido, fazendo-a casar-se com um pretendente rico.
Alguns anos mais tarde, sabendo a verdade da trama, a jovem foi definhando até a morte e, quando preparavam seu corpo para o sepultamento, descobriram marcado em seu peito, sobre o coração inerte, uma espécie de tatuagem com as iniciais do nome: Manuel Luiz.
Sabedor de todo o enredo e da morte de seu grande amor, Luiz Osório mergulha, tristemente, pelos caminhos dos inspirados versos que compõe.
Muito embora curtindo as duras mágoas, exerceu comissões durante dois anos, iniciando em 2 de agosto de 1831, destacado nesta região, na linha fronteiriça formada pelo rio Quarai.
Grassava, naquela época, uma onda de vandalismo e contrabando na fronteira, com elevado número de arruaceiros em Bella União, do lado Cisplatino, povoação que se criara com os índios trazidos das missões pelo Gen Frutuoso Rivera, que constantemente cruzavam nossas divisas, roubavam gado, matavam, incendiavam propriedades e retornavam àquela povoação impunes, sem que ninguém ousasse detê-los.
Do lado brasileiro, o hoje município emancipado da Barra do Quarai - que conforme sua história teria iniciado com a instalação de uma Guarda Portuguesa por 1814 -, era encarregado pelo Governo Imperial Brasileiro de garantir a defesa do território conquistado, apesar das frequentes investidas espanholas na área.
A atual cidade da Barra do Quarai, foi elevada a categoria de Vila, em 31 de março de 1938, sendo desmembrada, como 2º Distrito de Uruguaiana, pela sua emancipação como cidade, em 28 de dezembro de 1995, pela Lei Estadual nº 10.655.
Naqueles idos de 1831, os poucos habitantes da região, cansados dos maus tratos desses bandoleiros, apelam pela ajuda do Comandante do Destacamento da Guarda desta fronteira, sendo atendidos por Osório que determina aos seus comandados a missão de abater ou prender tais arruaceiros.
Apesar de reiteradas recomendações do Império com respeito à soberania vizinha, Osório, resoluto, vê a necessidade de reprimir com violência o vandalismo que imperava na região. Sob seu Comando e transpondo a fronteira do velho rio Quarai, a tropa surpreende os assaltantes ainda com os produtos de roubo. Dizima todos no local, inclusive mulheres que portavam armas e enfrentaram sua escolta militar.
Consequentemente, em 8 de janeiro de 1832, Osório foi preso pela sua atitude, porém a opinião pública e o bom conceito estavam a favor do jovem Comandante que, após quase um ano foi solto e nada ficou constando em sua fé de ofício que viesse empanar o brilho de sua carreira. Conforme extrato de sua “fé de ofício”, enviada pela Divisão de História, do Arquivo Histórico do Exército, Osório foi solto em 11 de dezembro, “por falta não comunicada ao Corpo”. Comenta-se que este fato, produzido pela integração corajosa de seu caráter, marca em sua trajetória, regada por um grande sentimento amoroso, a frase que certa vez dissera: “A farda não abafa o Cidadão no peito do Soldado”.
Durante a realização do “Projeto Pró-memória Histórica das Propriedades Rurais”, de minha autoria, para o livro “As Estâncias Contam a História – Uruguaiana”, encontrei na região de Pay-Passo (do Espanhol: Passo dos Padres), a beira do rio, uma velha trincheira, completamente encoberta pela vegetação e arvoredo. Sempre me suscitou dúvidas a sua origem. Não poderia afirmar o motivo porque foi construída, nem por qual força militar ou paramilitar que ali esteve. Moradores antigos comentam terem encontrado cápsulas de munições e restos de metal, como se tivesse havido um paiol de munições.
Teria sido o acampamento de Osório? Ou alguma outra força imperial?
- Quem sabe um dia a história irá nos comprovar esta dúvida, pois pelo que conta ainda a tradução oral dos moradores daquele local, existe a entrada de um fosso naquela trincheira.
Em 2008, quando se comemorava nacionalmente os duzentos anos de nascimento de Osório e que culminava com a data de seu falecimento, levamos um pedido ao então Comandante da 2ª Brigada de Cavalaria Mecanizada, Gen Ricardo de Matos Cunha, para que fosse perpetuado na Região da Barra, na localidade do Pai Passo, um marco que demarcasse a área em que Osório esteve acantonado, comandando uma pequena guarda.
E no dia 4 de outubro (data de falecimento do homenageado) realizou-se uma grande cavalgada por membros do 8º RCMec, alguns integrantes do 5º RCMec, 6º RCB e gaúchos civis, com saída do Circulo Militar de Uruguaiana. Ao termino da cavalgada, no local determinado, foi realizada uma missa crioula e inaugurado um pequeno marco, com a imagem de São Jorge, padroeiro da Cavalaria, para perpetuar as façanhas deste vulto da nossa história, onde podemos ler na placa o seguinte:
“É fácil a missão de comandar homens livres, basta mostrar-lhes o caminho do dever”
"Nesta região da Barra do Quaraí, de agosto de 1831 a janeiro de 1832, comandou um “Destacamento de Fronteira”, o Tenente Manoel Luis Osório, hoje Marechal Patrono da Arma de Cavalaria, defendendo a fronteira.
Barra do Quaraí, RS, 04 de outubro de 2008.
Comando da 2ª Brigada de Cavalaria Mecanizada
Liga de Defesa Nacional
Academia de História Militar Terrestre do Brasil."
Carlos Fonttes, Sargento da Reserva do Exército,
é Delegado da Academia de História Militar Terrestre do Brasil
Fonte: Artistas Gaúchos
texto atualizado via e-mail
COMENTO: tanto o triste episódio envolvendo a jovem Ana quanto a "invasão e ataque" ao acampamento de bandidos em Bella Unión, em território cisplatino, são confirmados pelo relato constante nas páginas 26 a 30 do livro biográfico "Osório - Síntese de Seu Perfil Histórico", escrito pelo Cel João Baptista Magalhães e publicado pela Biblioteca do Exército (BibliEx) em 1978.
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