terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Os Soldados que Sobreviveram a 20 Anos de Guerra

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por Ricardo Monsalve Gaviria
Ser Soldado profissional na Colômbia significa, entre muitas outras coisas, sacrifício. Porém chegar aos 20 anos de atividade e poder terminar o serviço pelo país, é uma conquista que poucos podem contar com finais felizes. Essa historia, a escreveram 665 homens que se retiraram da instituição em 2015, e iniciaram este ano de 2016 como civis.
A estes, lhes tocaram as épocas mais difíceis do conflito armado que assola a Colômbia. Cada um deles tem recordações boas e más - trágicas -, mas sempre chegam à mesma conclusão: tudo que viveram foi com amor à Pátria e à família que tiveram e formaram durante o tempo em que estiveram no Exército.
"Nossos Soldados são pessoas que em um ano veem seus familiares por duas vezes; uma no primeiro semestre e a outra no segundo semestre. Por isso, agora que a Instituição os devolve ao seio de seus lares, sentem-se muito orgulhosos. A mim pessoalmente impactou muito perceber em muitos deles um sentimento de pesar por deixar as fileiras do Exército; demonstrando que isto é muito importante, porque apesar da alegria de estarem regressando para suas casas, já sentem a nostalgia da perda da sua Instituição que os teve durante 20 anos", comentou o General Leonardo Pinto, que até dezembro foi Comandante da 7ª Divisão de Exército e agora se encontra no Estado Maior da Instituição.  

Memórias para toda a vida
Hugo León López é um desses Soldados profissionais que passaram à vida civil e qualifica seus 20 anos como "maravilhosos, cheios de recordações boas, más ou tristes ao lado de companheiros que voltou a encontrar depois da inatividade, muitas histórias com uma mescla de emoções inesquecíveis".
Ainda que tenha servido nas Forças Especiais, na Escola de Lanceiros, na Diretoria de Recrutamento e até na Presidência, seus pensamentos sempre terminam em um lugar conhecido como Tamborales, localizado na zona rural e limítrofe dos municípios de Mutatá (Antioquia) e Riosucio (Chocó). Alí, em 14 de agosto de 1998, um ataque de várias "frentes" do Bloco José María Córdoba das FARC, que alcançavam centenas de guerrilheiros, tomaram de surpresa as unidades militares. Esse dia dividiu sua história em duas partes.
"Éramos uns 150 homens e entramos em choque com 2.000 guerrilheiros, depois de horas de combate nos acabou a munição, ficamos limpos, aí iniciou o desespero de ver como morriam Soldados; nos restou usar esses corpos dos companheiros e armar uma pilha para que nos servissem como trincheira. Eram os nossos companheiros caídos, com os quais havíamos nos divertido na noite anterior, porém naquele momento era questão de vida ou morte, nos tocou usa-los como barreira para poder sobreviver", recorda Hugo León, que acrescentou que o pior, para ele, apenas se iniciava naquela noite.
Os combates terminaram com 42 Soldados mortos e 21 sequestrados, entre eles, Hugo León. "Lá estive quase três anos sequestrado, por sorte, apareceu uma oportunidade e consegui escapar com uma guerrilheira, que era namorada de um chefete que, depois de tanto [sofrer] maus tratos, me escutou e consegui convence-la para escaparmos e, assim foi. Nos 'mandamos', ela, outro Soldado e eu; conseguimos sobreviver 15 dias com uma libra (500g) de rapadura e outra de açúcar até que encontramos a tropa e conseguimos nos salvar, porque os guerrilheiros já estavam por perto e para lá [acampamento] não voltaríamos com vida", relata o ex militar, que pouco sabe sobre a vida atual da mulher que o ajudou a recuperar a liberdade. "Ela esta viva e creio que vive no Canadá, gozando de um asilo político", diz.

Com os melhores
As operações denominadas "Odisséia" e "Fênix", nas quais morreram "Alfonso Cano" e "Raul Reyes" - os dois principais homens das FARC -, sempre serão motivo de orgulho para William de Jesús Posada Úsuga, ex Soldado profissional que também disse adeus à Instituição, que segundo ele o "formou como pessoa e o converteu em homem e Herói da Pátria".
Este ex integrante das Forças Especiais do Exército foi um daqueles homens que, depois dos bombardeios aos acampamentos guerrilheiros, tinham como missão cercar e proteger a área afetada, e recuperar os corpos das "pessoas importantes" que morreram em função dos ataques.
William recorda que depois do bombardeio a "Raul Reyes", o movimento de tropa foi algo que nunca havia visto antes. "Não pensávamos que iria cair alguém grande, mas depois de ver tantos cadáveres, os especialistas se fixaram especificamente em um, depois nos contaram quem era".
Apesar de tudo o que viveu no Exército, o ex Soldado Posada nunca vai esquecer a morte de um companheiro no departamento (Estado) de Meta. "Ele sentiu o disparo e gritou que lhe haviam acertado, quando chegamos onde estava, sorria e assim morreu, com um sorriso na cara. Foi ali que eu entendi que tudo isso valeu a pena".

Tempo para a família
Depois desses 20 anos de serviço, nos quais esses Soldados riram, gozaram, sofreram, choraram e deixaram para trás a dezenas de companheiros e amigos, dedicarão seu tempo para suas famílias, as pessoas mais contentes com essa "aposentadoria". São centenas de pais, mães, esposas e filhos que tiveram que apegar-se a orações para pedir que esses Soldados regressassem e conseguissem superar cada dia.
Adriana María Cano Sepúlveda é a esposa de Hugo León López, e diz que não há mulher que seja mais feliz que ela; e reconhece que “ainda restam sequelas porque meu esposo ainda tem pesadelos e se levanta assustado, eu o admiro muito por sua valentia e pelo homem que é. Agora posso desfruta-lo cem por cento, temos muitos planos e sonhos. Graças a Deus que pode regressar são e salvo depois de 20 anos, minhas orações foram escutadas”.


PARA SABER MAIS:

A Carreira de um Soldado Regular Colombiano:
Os Soldados profissionais como William de Jesús Posada e Hugo León López se formaram na Escola de Soldados Profissionais do Exército Nacional.
Uma vez graduados começam a contar os 20 anos para sua inatividade assistida.
Sem dúvidas, dentro dessa instituição se da a oportunidade, nos casos de boas qualificações, de entrar na Escola de Suboficiais (no Brasil: Sargentos), onde os Soldados podem aspirar chegar até a graduação de Sargento Mayor (equivale aos Subtenentes e Suboficiais brasileiros). 
Se a carreira de um militar começa com um curso de oficial, ela lhe da a oportunidade de iniciar como Subtenente (Guarda-Marinha ou Aspirante, no Brasil) e terminar como General.
Fonte:  tradução livre de El Colombiano
COMENTO: por aqui, o tempo mínimo de permanência no serviço ativo, para passar à inatividade, é de 30 anos de serviço. A não ser nos casos de inaptidão por problemas de saúde surgidos em serviço. É claro que o diferencial colombiano é que são 20 anos sob a tensão de viver em combate durante os 20 anos. Parabéns aos Soldados colombianos que conseguiram sobreviver na luta contra os narco bandoleiros.

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