por Valdesio Guilherme de Figueiredo
Realmente, as coisas não vão bem, mas fruto da eterna desunião que existe entre os componentes do EB. Começa com a separação estatutária entre oficiais e praças, hoje bastante acirrada, inclusive com a tentativa de organização de sindicatos. Tudo, falta de capacidade de comando e de medo da ideia errada de que deva existir ampla defesa e contraditório em tudo.
É interessante que se faça uma reflexão sobre o que é ser comandante na Infantaria de Sampaio. Existem comandantes de diversos níveis, a começar pelo “Cabo”, que pode ser comandante de esquadra, ou de peça, após realização de curso; o Terceiro Sargento exerce um comando mais importante, o de Comandante de Grupo de Combate, ou de seção, preparado na Escola de Sargento das Armas; o Tenente comanda pelotão, habilitado pelo curso da Academia Militar das Agulhas Negras; o Capitão comanda a subunidade, já com um efetivo de mais de uma centena de militares; o Coronel comanda a unidade, após um curso de aperfeiçoamento realizado na Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais e o General comanda as Grande Unidades, ou Grandes Comandos, após ter realizado curso na Escola de Comando e Estado Maior do Exército.
No caso dos oficiais, considere-se que a evolução processa-se ao longo de anos, não só pelo preparo adquirido em cursos, mas, também, pela observação dos diversos comandantes que passam pela nossa vida profissional, alguns dando bons exemplos e outros, nem tanto, mas sempre acatando a decisão do comandante — isto é básico, ou pelo menos foi!
Não se pode aceitar passivamente que um qualquer que caia de pára-quedas na estrutura de comando, seja aceito como preparado para integrá-la. A Constituição Federal e Lei Complementar deram ao Presidente da República o título de Comandante em Chefe das Forças Armadas. Isto poderia funcionar quando o mesmo dispunha, junto de si, os ministros militares a assessorá-lo; o Ministro da Defesa, que tem até vestido farda e criou insígnias que o definam como militar, não tem nenhum preparo de comando e o faz intuitivamente, contando, ou não, com a assessoria militar, ou “genuinamente” civil.
Tudo é cópia mal feita da estrutura de defesa dos Estados Unidos, onde a Secretaria de Defesa é um órgão essencialmente político, assim como os secretários das cinco forças armadas americanas são civis e tratam, apenas, do aspecto político das forças. A estrutura militar está ligada ao chefe do estado maior conjunto e os comandantes de teatros de operações ligam-se diretamente ao presidente da república.
A criação do ministério da defesa no Brasil deu-se por pressão americana. Quando fui chefe da Delegação do Brasil na Junta Interamericana de Defesa, por várias vezes, recebi convite para eventos internacionais dirigido ao ministro da defesa do Brasil. Em todas elas restituí o convite informando que se desejassem a presença do estamento militar brasileiro, deveriam enviar quatro convites: ao Chefe do EMFA, ao Comandante da Marinha, ao Comandante do Exército e ao Comandante da Aeronáutica. Isto se passou no governo do Presidente Itamar Franco. A partir daí, prevaleceu a vontade yankee.
É de estranhar o episódio recente atribuído aos Clubes Militares e a estrutura política do poder executivo brasileiro. O Clube Militar, que nem é destinado aos militares do Exército, mas sim aos das três forças e a civis, é um entidade civil, pessoa jurídica que não é vinculada a nenhuma das três Forças Armadas e não recebe nenhum valor do orçamento da União para sustentar-se. Logo, por que deveria receber ordem do presidente da república, do ministro da defesa, ou mesmo, do Comandante do Exército? Admito que pudesse ter havido um acordo entre amigos, pois o Presidente do Clube Militar e o Comandante do Exército são generais da mesma safra, quase companheiros de turma.
Também sou amigo e admirador do Comandante do Exército, mas nem por isso eu deixaria de discutir com ele a conveniência da tomada da atitude de recuar. Não haveria cabimento para tal. Se a nota dos clubes militares desagradou ao presidente da república e a seu ministro da defesa, também são inúmeras as atitudes, o descaso, a legislação revanchista por eles levada adiante, sem que os clubes militares impusessem um recuo.
Costumo dizer que quem muito abaixa as calças mostra a cueca, ou a calcinha. Não posso admitir que a alta estrutura de comando do Exército deixe de lado a disciplina, ou a hierarquia, nem permitir que qualquer civil de passado não muito recomendável, venha humilhar o Exército, empregando-o como polícia militar, fazendo com que a Força Armada agora passe a ser força auxiliar das polícias militares estaduais, ou que inverta a hierarquia permitindo que os soldos de determinados militares estaduais sejam infinitamente superiores aos dos militares do Exército.
Não quero revolução, mas exijo respeito, ainda que tenha de impô-lo pela força. Não me acusem de estar falando por estar imune às sanções disciplinares, de acordo com lei de 1986. Posso falar de política, posso combater ideologias e posso e devo defender a minha Instituição e meus antigos subordinados. Não me acusem de covardia, porque nunca me apeguei a cargos e sempre coloquei minha cabeça a prêmio na Extinta Diretoria Patrimonial de Brasília, no comando da 23ª Brigada de Infantaria de Selva, no comando da Guarnição da Vila Militar, no Departamento Geral do Pessoal e no Comando Militar da Amazônia. No Superior Tribunal Militar, do qual fui ministro, sempre julguei à luz da Lei do Serviço Militar e de seu regulamento, visando guardar a Instituição dos maus militares. Se falhei algumas vezes, faz parte da minha condição de ser humano.
Diz-se que vingança é um prato que se come frio. Se há espírito de vingança de um lado, por que não partir também para a vingança em igual ou maior intensidade. Quem tem o telhado mais vulnerável?
Insisto que devamos nos unir, se possível, oficiais e praças, da ativa e da reserva, mesmo da reserva de segunda classe, não para derrubar nenhum governo que o povo quis para si, mas para prestigiar a estrutura de comando militar e fazer sentir que atacado o comandante, atacados estaremos todos.
Não permitamos que os militares sejam tratados como cidadãos de segunda classe, que só são valorizados quando há que se construir estradas onde não seja compensador para as empreiteiras, ou para levar desaforo de bandidos ocupantes dos morros cariocas, ou ainda, para ocupar o subalterno lugar de grevistas impunes.
Valdesio Guilherme de Figueiredo
é General de Exército Reformado
e Ministro do STM aposentado
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Atravanca um palpite aqui: