por Olavo de Carvalho
Na década de 60, as organizações de esquerda tinham de se esforçar muito para recrutar dez militantes entre cada cem ou duzentos jornalistas. A lei que tornou obrigatório o curso universitário para o exercício da profissão mudou isso, entregando sucessivas gerações de jovens desmiolados à guarda de doutrinadores e recrutadores bem capacitados.
A conversão maciça da classe jornalística ao esquerdismo tornou possíveis fenômenos como o da ocultação do Foro de São Paulo e a farsa da eleição presidencial de 2002, arranjo entre partidos de esquerda, com exclusão de toda oposição possível, celebrado pela mídia nacional em peso como uma apoteose da livre concorrência democrática.
O STF fez muito bem ao eliminar a pérfida exigência do diploma, armadilha maquiavélica que rebaixou a qualidade dos nossos jornais e reduziu sua credibilidade, a ponto de que hoje eles não vendem mais exemplares do que nos anos 50, quando a proporção de analfabetos em nossa população era imensamente maior. Mas a simples eliminação desse instrumento de seleção ideológica não basta para garantir que um pluralismo de verdade venha a reinar na nossa imprensa.
Há meios de controle mais sutis e eficientes do que a imposição legal direta. No seu livro The True Story of the Bilderberg Group (Chicago, Independent Publishers Group, 2009), o jornalista espanhol Daniel Esturin mostra como essa plutocracia globalista, empenhada na construção de uma ditadura mundial, conseguiu se manter oculta desde 1954 até pelo menos 1998, estigmatizando como “teoria da conspiração” qualquer tentativa de revelar sua existência: seus componentes simplesmente compraram todos os grandes jornais e redes de TV dos EUA e da Europa. Isso determinou uma mudança mais profunda das funções do jornalismo do que a maioria da população pode conceber.
Como o objetivo da elite globalista é derrubar a economia americana e implantar sobre seus escombros um novo sistema, com moeda mundial unificada, impostos globais e administração burocrática planetária, as notícias, na quase totalidade da mídia, já não são selecionadas por nenhum critério de importância objetiva, mas pelo serviço que prestem à programação mental das multidões, de modo a fazê-las aceitar passivamente mudanças que, em condições normais, suscitariam explosões de ódio e revolta. A supressão e a manipulação tornaram-se gerais e sistemáticas, a ponto de atentar diariamente contra a dignidade da inteligência humana e de transformar os mecanismos eleitorais da democracia num mero jogo de aparências.
Quando a elite globalista faz eleger presidente dos EUA um desconhecido, proibindo qualquer investigação séria da sua biografia e reprimindo por toda sorte de ameaças a exigência de que ele apresente seus documentos pessoais, é claro que a noção de "transparência" se tornou uma utopia inalcançável e está instaurado o império do segredo. Quando o indigitado mata um mosquito, compra um cachorro ou brinca de "dama por um dia" nos jardins da Casa Branca, de mãos dadas com a digníssima, o fato é noticiado com alarde em todos os jornais e noticiários de TV, mas até atos oficiais do seu governo, quando arriscam criar alguma resistência, são omitidos ou publicados com discrição que beira o silêncio.
O mesmo acontece com inúmeras notícias de importância histórica mundial que, se reveladas, teriam o dom de despertar as multidões do torpor hipnótico que as imobiliza e incapacita.
Dificilmente o leitor encontrará nas páginas dos jornais, tão cuidadosamente foi escondida, a notícia de que Kaing Guek Eav, ex-diretor do sistema de prisões no regime comunista do Camboja, confessou ter mandado assassinar sistematicamente milhares de crianças, filhas de prisioneiros políticos, para que não tentassem vingar seus pais depois de crescidas (veja em Reuters.com). Nada ilustra melhor a natureza do comunismo. Essas crianças não foram mortas acidentalmente por bombas durante uma guerra. Se o fossem, e as bombas fossem americanas, estariam nas primeiras páginas como provas da maldade capitalista. Como foram assassinadas deliberadamente, é preciso abafar o horror para que, no mínimo, as massas continuem na ilusão do equivalentismo moral entre os países comunistas e os EUA.
Do mesmo modo, as vítimas das FARC e do terrorismo latino-americano em geral, brasileiro inclusive, são meticulosamente excluídas do noticiário, proibidas de entrar no círculo da piedade humana e esquecidas, por fim, como meros dejetos acidentais, indignos de atenção. Enquanto isso, a mídia considera normal e aceitável publicar palavras como estas do Dr. Emir Sader: "Há personagens com tal estatura histórica que, independente dos adjetivos e de todos os advérbios, ainda assim não conseguimos retratá-los em nada do que podemos dizer ou escrever. O que falar de Marx, que permaneça à sua altura? O que escrever sobre Fidel?... O Che é um desses personagens cósmicos”.
Num rápido manejo de teclado, criminosos desprezíveis, mentores de Pol-Pot, são elevados às alturas do indizível, do inefável, do transcendente à linguagem humana. Será exagero chamar isso de idolatria psicótica? Mas mesmo os que não apreciam o comunismo aceitam essa monstruosidade em nome da "diversidade de idéias", como se a matança deliberada de crianças fosse uma idéia, uma hipótese, um mero jogo acadêmico.
A longa convivência com essas enormidades, forçada diariamente pela mídia, dessensibiliza as consciências e as torna incapazes de perceber diferença entre a santidade e o crime, entre a virtude e a abominação. Na mesma medida e pela mesma razão, a estatura moral das sociedades democráticas vai baixando, e, com a ajuda de milhões de emires sáderes, os Ches e Pol-Pots se aproveitam disso para ostentar mais um pouco da sua infinita superioridade moral, anjos de bondade que pairam no céu, longe do “inferno capitalista”.
Olavo de Carvalho é jornalista, ensaísta
e professor de Filosofia.
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