por Maynard Marques de Santa Rosa.
“É tempo de murici, que cada um cuide de si!”, foi o que respondeu o Cel Tamarindo, comandante em exercício da 3ª Expedição contra Canudos ao oficial que, ansiosamente, o interpelara sobre o que fazer, na tarde de 3 de março de 1897. A investida tinha fracassado, parte da tropa estava em pânico e o comandante de ofício, Cel Moreira César, jazia moribundo no leito de morte.
O relato primoroso de Euclides da Cunha, em “Os Sertões”, traduz a perplexidade de um comandante pusilânime no momento decisivo.
Faltou firmeza. Em choque, sentado na caixa de um tambor, chupando longo cachimbo, o Cel Tamarindo não deliberava. O peso da responsabilidade era maior do que a sua força vital. Por insegurança, relegou os companheiros à própria sorte.
Não obstante, a maior parte dos soldados e das armas continuava incólume, e ainda havia dois terços da munição. Vendo-se, porém, abandonada, a tropa foi dominada pela sugestão de um terror sobrenatural. A retirada virou fuga e foi uma debandada. As armas foram abandonadas, peças de equipamento jogadas fora, as padiolas com feridos arriadas, dentre elas, o cadáver do Cel Moreira César. Embaixo, o sino soava desabaladamente. A população de Canudos a tudo contemplava com assovios estridentes, longos, implacáveis.
Caindo em si, Tamarindo lançou-se pela estrada, inteiramente só, o cavalo a galope, como se buscasse se redimir. Ordenou toques de meia-volta e alto, inutilmente; as cornetas, por fim, cessaram. Logo adiante, quando transpunha a galope o córrego do Angico, foi precipitado do cavalo por uma bala.
O episódio de Canudos é figurativo das crises de todos os tempos. Um comandante não abandona impunemente os companheiros de armas em perigo, porque o efeito moral da omissão pode ser devastador para o destino da sua tropa.
Meses depois, quando escoava pela estrada a coluna do Gen Arthur Oscar, durante a 4ª Expedição, renques de caveiras a branqueavam, alinhadas as cabeças, as faces voltadas para o caminho. Por cima, nos arbustos mais altos, restos de fardas pendurados, quepes de listras rubras, capotes, cantis e mochilas e, a uma banda, o espectro desaprumado do coronel Tamarindo, empalado num galho de angico seco, os braços e pernas pendidos, oscilando à feição do vento.
327 combatentes jaziam mortos. Os jagunços nada lhes haviam tirado, exceto a munição e as armas. Havia até, no lenço envolto na tíbia descarnada de um combatente, um maço de notas somando quatro contos de réis.
O desfecho macabro da 3ª Expedição passou para a História como lição do resultado da omissão e da fraqueza de um comandante de qualquer época.
Maynard Marques de Santa Rosa é Gen Ex R1
COMENTO: o cretino tido como mentor principal da cambada que se identifica como "dazisquerda", escreveu em um de seus livros — O 18 Brumário de Luis Bonaparte — que "A história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa".
Esta frase me passou pela cabeça ao fazer algumas comparações, entre fatos da História e outros recentes.
O texto acima trata sobre um triste fato da História do Brasil, onde a miséria e o fanatismo religioso, aliados a interesses políticos, terminaram provocando uma tragédia na Bahia; semelhante a outra desgraça ocorrida no Rio Grande do Sul, cerca de duas décadas antes — menor em número de vítimas, mas não menos significante em termos de barbárie —, também causada pela penúria do povo, atraído pelo fanatismo religioso, melindrando interesses políticos e atraindo o preconceito.
Não gosto do falecido João Goulart, mas respeito a atitude adotada em 1964. Incitado pelo patife Leonel Brizola a resistir à deposição iminente, afirmou que preferia perder a presidência e sua vida política, do que causar uma guerra civil, com brasileiros matando-se por política. E abandonou o Brasil, indo refugiar-se no Uruguai.
Se Bolsonaro pensou da mesma forma, deveria ter deixado isto bem especificado, determinando aos seus generais que se esforçassem para desmobilizar os milhares de apoiadores acampados em frente aos quartéis, evitando a arapuca posteriormente armada pelos canalhas ora no poder, que deu no que deu. A mensagem deveria ter sido clara: perdemos uma batalha, mas seguiremos lutando — conforme fez o atual presidente eleito dos EUA —, e retornaremos para outros embates.
Mas, seguindo o costume brasileiro de esperar que algum outro tomasse a frente da situação e determinasse as atitudes necessárias, preferiu confiar na proteção divina e esperar algum milagre em atendimento às orações de seus seguidores acantonados em áreas militares Brasil a fora.
O que isto tem a ver com o texto principal? Na minha opinião, o mau uso da religiosidade.
Bolsonaro começou bem seu governo mas, logo depois parece que — deixando-se levar por aliados religiosos — sonhou ser um "predestinado por Deus". O respeito ao Criador ou a alguma entidade de sua crença, é um fator positivo em qualquer pessoa. Mas essa manifestação, de forma exagerada como se viu em diversas ocasiões, provoca dissensões e, no exercício do cargo presidencial, chega a ser inconveniente. A manifestação de que, na escolha de seus auxiliares diretos — até mesmo no caso dos dois ministros indicados ao STF — prevaleceria o critério de ser "terrivelmente evangélico" não parece ter dado bons resultados. Sou cristão mas costumo dizer que não se deve deixar tudo por conta de Deus. Há questões em que Ele prefere deixar que a liberdade da escolha humana prevaleça. E é nessas horas que a ATITUDE humana se manifesta.
Para não alongar mais, voltemos à frase de Karl Marx lembrando que o ditador venezuelano Hugo Rafael Chavez Frias projetou-se politicamente graças a um fracassado golpe de estado em 1992. Cumpriu dois anos de prisão e cinco anos depois fundou um partido político, sendo eleito para a presidência do país em 1998, permanecendo no cargo, mediante reeleições, até sua morte, em 2013, mesmo enfrentando até mesmo uma tentativa de golpe.
Vamos torcer para que a história não se repita como tragédia!
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