sexta-feira, 11 de novembro de 2022

A Caça aos Arquivos Secretos do DAS

Manuel Casanova, Diretor de Inteligência, pediu para acessar pastas que foram mantidas em reserva, o pedido está pendente.
Nos arquivos do antigo DAS está armazenada informação recolhida durante 58 años, com relatórios de Inteligência, dados migratórios e antecedentes judiciais, entre outros. FOTO ARCHIVO
por Nelson Matta Colorado
A chegada do ex-guerrilheiro do M-19 Manuel Casanova Guzmán à chefia da Direção Nacional de Inteligência (DNI), acendeu a busca pelo conteúdo dos arquivos sigilosos do Departamento Administrativo de Segurança (DAS), o antigo serviço secreto da Colômbia.
Casanova completou dois meses no cargo, após ser designado em finais de agosto pelo presidente Gustavo Petro, com quem compartilhou a militância no M-19 e na Alcaldía [Prefeitura] de Bogotá (2012-15), onde atuou como profissional em políticas de segurança alimentar da Secretaria de Integração Social.
Fontes de Inteligência contaram reservadamente, que uma das primeiras solicitações do novo chefe foi a revisão das bases de dados do DAS, o organismo civil subordinado ao Poder Executivo que se encarregou da Inteligência estratégica do Estado entre 1960 e 2011, antes de ser suprimido por escândalos de corrupção.
O pedido causou espanto entre os agentes mais veteranos da DNI e os ex-integrantes do DAS que hoje trabalham para outras entidades. A razão: nesses arquivos há múltiplas anotações de Inteligência, seguimentos, interceptações telefônicas, fotos, vídeos, informes, codificações de linguagem cifrada e declarações contra pessoas que hoje integram o Governo Nacional.
Entre eles estão o próprio Casanova, o presidente Petro e outros altos funcionários que também fizeram parte do M-19, como Augusto Rodríguez, diretor da Unidade Nacional de Proteção (UNP), e Carlos García, chefe de Migração Colombiana.
Há muita preocupação na comunidade de inteligência; se teme que haja algum revide, porque na esquerda há pessoas muito revanchistas, manifestou uma das fontes consultadas.
Detalhou que vários dos agentes que obtiveram ou elaboraram os informes, como parte do trabalho de vigilância contra objetivos que ameaçavam a segurança nacional, incluindo o M-19 e outros grupos insurgentes, estão pensando em sair do país, antes que comece uma caça às bruxas.
Após a liquidação do DAS, suas bases de dados ficaram sob custodia do Arquivo Geral da Nação, adscrito ao Ministério da Cultura e com sede em Bogotá. Ali se armazenam os documentos que fundamentam a historia institucional desde a época da Conquista Espanhola.
Acessar a eles não é tão simples, mesmo se tratando do novo diretor da DNI. As informações do DAS estão protegidas pela Lei de Inteligência e Contra-inteligência (nº 1.621 de 2013) e normas subsidiarias, que exigem o sigilo de secretos, uma ordem judicial emanada de um juiz, e a presença de um delegado da Procuradoria, entre outros requisitos.
O decreto presidencial 1.303 de 2014 estabeleceu que o acesso e consulta da documentação dos arquivos de inteligência estará sujeita à reserva legal nos termos estabelecidos na Constituição e a lei (...). Só se propiciará informação às autoridades judiciais que, dentro de um processo judicial, a solicitem ou aos entes de controle que a solicitem.
Essas condições dificultam um acesso imediato às bases de dados. No momento, a cúpula solo tem disponibilidade absoluta sobre a informação produzida a partir de 2011, quando nasceu a DNI.
Essa situação freou os novos chefes, mas sabemos que estão fazendo os trâmites para acessar os arquivos, relatou um ex-agente.

Copias clandestinas
Mais além da desconfiança que gera a nova cúpula da Inteligência, para as fontes é claro que, mesmo com as medidas para proteger os citados conhecimentos, na última década muitos segredos do DAS foram vazados aos poucos.
A entidade produziu conhecimentos estratégicos durante 58 anos, tendo em conta que herdou os arquivos do antigo Serviço de Inteligência Colombiano (SIC), um aparato de origem policial, criado em 1953 pelo General Gustavo Rojas Pinilla, o qual funcionou por sete anos.
Ao largo de sua historia, o DAS reuniu informação confidencial — oficial e extraoficial — sobre acontecimentos políticos, sociais, econômicos, criminais e internacionais, que moldaram a nossa nação. Entre eles estão a Tomada do Palácio de Justiça, os magnicídios (Luis Carlos Galán, Álvaro Gómez Hurtado, etc.), a luta contra as guerrilhas e os grandes cartéis do narcotráfico, a guerra fria contra o comunismo, o paramilitarismo e a para-política, os falsos positivos, “a comunidade do anel”, a evolução dos partidos políticos, as relações diplomáticas e a espionagem com outros países.
O presidente Juan Manuel Santos ordenou sua dissolução em 2011, com o Decreto 4.057, em resposta a escândalos de corrupção como os "grampos ilegais" em telefones de magistrados, jornalistas e opositores ao governo de Álvaro Uribe (2002-2010); nexos de seus funcionários com as autodefesas paramilitares e a espionagem contra organizações de Direitos Humanos.
No artigo 24 desse mesmo decreto ficou estabelecido que enquanto se procedia na supressão do DAS, a Procuradoria devia vigiar “o processo de custodia, consulta e depuração dos arquivos de Inteligência”.
Nos deram a ordem de digitalizar os conhecimentos e estivemos muitos meses escaneando cada documento. Entregamos muitíssimos terabytes de dados em discos rígidos, não saberia dizer a quantidade exata. Também foi entregue material físico: cada unidade e direção regional apresentou uma media de 100 a 400 caixas, e cada uma delas tinha dez pastas de arquivo com 100 a 200 folhas, disse um conhecedor do processo.
Nas caixas e discos rígidos se guardaram os dados criptografados de três bases de dados usadas pelos detetives. Uma delas era o Sistema de Informação do DAS (SIFDAS), que continha informação migratória, antecedentes judiciais e anotações de Inteligência.
Ainda que se supunha que tudo era ultra-secreto, as fontes revelaram que de maneira clandestina foram feitas milhares de cópias de documentos. Parte da informação, relativa a operações que se executaram com cooperação internacional, foi copiada por agencias como a CIA estadunidense, o MI-6 britânico e o Mossad israelita.
Com esses sócios foram feitos trabalhos contra o comunismo e as guerrilhas, os cartéis de droga, o financiamento do terrorismo e o recrutamento de ‘convertidos’, uns católicos colombianos que aderiram ao Islã e foram enviados ao Oriente Médio para trabalhar com grupos extremistas, contou um ex-agente.
Ratificou que ditas agências armazenam as réplicas de informações como evidencia do que fizeram naqueles tempos e uma espécie de seguro, no o caso de que alguém pretenda alterar os fatos.

Informação compartilhada
Outra parte dos arquivos foi copiada por gente da direita entre 2012 e 2013, em plena etapa de dissolução do DAS. Eram empresários, políticos e gente da Força Pública, que lograram acesso porque tinham amizade com funcionários da Procuradoria que lhes faziam, o repasse.
Algumas caixas, aparentemente, saíram do inventario e foram espalhadas pelas instituições criadas para assumir as funções do DAS: a DNI, Migração Colombiana e a UNP, hoje comandadas pelos ex-membros do M-19.
Há ex-detetives que pensam que durante o processo de liquidação foram violados o sigilo dos arquivos, quando a empresa contratada para o armazenamento e classificação das bases de dados reorganizou seu conteúdo.
A Armada, a Fiscalía e a Polícia também receberam alguns desses insumos. Nesta última entidade, a Direção de Investigação Criminal (DIJIN) obteve informação relacionada com os acordos de cooperação com a Interpol; e a Direção de Carabineiros (Dicar) ficou com os informes do outrora Grupo de Segurança Rural do DAS.
Mais além do que repousa no Arquivo Geral da Nação, as informações secretas seguem vivas na memoria dos cerca de 6.000 empregados que laboravam no DAS.
A maioria foi realocada na Polícia (SIJIN e DIJIN), no CTI da Fiscalía, na UNP ou Migração, onde seus talentos costumam ser desaproveitados.Nos tratam com muita desconfiança, como se fossemos párias, porque a inteligência civil ficou estigmatizada depois do ocorrido com o DAS, narrou um deles.
Há ex-agentes expertos em contraterrorismo que estão trabalhando de mensageiros ou secretarias nos novos escritórios; outros, especializados em administrar fontes internacionais, servindo como simples escoltas; e uns mais, que antes se infiltravam na máfia, agora estão carimbando passaportes em um cubículo.
Entre eles, figuram alguns dos que pensam abandonar o país, temendo retaliações de altos funcionários do Governo que perseguiram no passado, agora que tem acesso aos secretos mais fundos do Estado.
Se abrirem esses arquivos para mudar coisas da historia, ou simplesmente para atacar a oposição, podem desestabilizar o Estado. Em troca, se o fazem para descobrir a corrupção, seria muito importante, porque ali há informação que nunca gerou processos judiciais e que demonstra quem é quem entre os corruptos, concluiu um ex-investigador.

A Vigilância sobre governos de esquerda
Entre as funções principais da DNI está a construção de informação de Inteligência e Contra-inteligência com fontes estrangeiras, em especial sobre aqueles governos que de alguma maneira ameaçam as políticas e bens da nação. Até a presidência de Iván Duque, a entidade mantinha redes de informantes e uma vigilância detalhada das atividades dos governos de Venezuela, Nicaragua e Cuba, entre outros regimes de esquerda, segundo as fontes consultadas. Também sobre os movimentos de Rússia e China na Colômbia e América Latina, com apoio de agencias de segurança ocidentais como a CIA e o MI-6.Agora que temos um novo governo, que quer acercar-se a esses países, quem sabe como se procederá. Há queixas porque se atrasaram os pagamentos para os informantes do exterior, relatou um ex-agente.

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Formado na U.P.B. é Jornalista da Área de Investigações, especializado em temas de segurança, crime organizado e delinquência local e transnacional.
Fonte: tradução livre de El Colombiano

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