por Haroldo Amorim
Dia desses conversei com o Mike, um inglês boa praça casado com uma brasileira, dono de uma lan house perto da minha casa. A conversa descambou para política, pobreza e corrupção no Brasil. No meio do papo, o Mike externando a verve da lógica saxônica soltou a seguinte pergunta: o Brasil tem muitos pobres, mas alguém perguntou o motivo da pobreza? Espantosa e simples indagação. Concluímos que a pobreza é prima da ignorância, filha da corrupção, neta da omissão, irmã do populismo e bastarda da ausência de oportunidades. Saí de lá com esse pensamento. Diante dos atuais, e porque não dizer históricos problemas salariais dos militares brasileiros, cabe também a lógica pergunta do Mike: porque as Forças Armadas ganham mal?
As explicações são várias: estrutura verticalizada da autoridade, com as decisões centradas no que manda mais, ou seja o Comandante. Quem manda é o Comandante. Por isso, quem está logo abaixo quer o cargo dele. É a fila que anda sem marolas, e assim vai até a base. Daí o círculo vicioso dos emarolados que não querem se queimar ou se indispor, de olho numa merreca a mais como insinuou o Lula. Militares são “migalheiros”, o Lula acertou.
Outra explicação, consequência da primeira, é a acomodação com a miséria. Estamos precariamente aparelhados e equipados, nos acostumamos a cumprir a missão constitucional dessa forma, aliás muito bem. Nossos hotéis de trânsito são ruins, habitamos moradias acanhadas porque incorporamos esse modo acochambrado de viver, afinal somos militares e militar não pode ter conforto. Daí nos contentarmos com migalhas salariais, como disse o Lula. Sempre foi assim. É o conformismo da merreca, pior do que não vir nada...., já dizia o meu avô.
Uma terceira explicação é a conveniência da disciplina. A disciplina é usada para justificar a mudez conveniente. Não podemos dizer isso ou tomar tal atitude porque somos disciplinados, o regulamento não permite, temos de acreditar nos chefes, não posso manifestar porque o estatuto assim o exige, então só resta mandar a mulher protestar batendo panela, isso é ridículo. Alguém já viu mulher de juiz, político, diplomata, auditor da receita ou procurador batendo panela no meio da rua?
Marola quando justa não faz mal a ninguém, pelo contrário, alerta sobre um estado de coisas. O que é mais feio: esposa batendo panela ou a penúria com disciplina? As carreiras citadas acima são carreiras de estado, mas os militares pagam mais pelas mazelas do estado.
Uma quarta e última explicação é a mania de se desvalorizar. Militar não se dá valor. Os cursos são difíceis, as exigências profissionais são absurdas, mas o militar despreza esse fato. Quando faz um curso, tira do contracheque a habilitação anterior. Não incorpora gratificações, não ganha hora extra e está disponível ao empregador em regime integral, sem receber por isso, ao contrário, os chefes antigos até aquiesceram quando a MP 2215 subtraiu injustamente a gratificação por tempo de serviço e o posto acima na reserva, só que quem negociou e assinou embaixo não perdeu nada. A culpa não é do Chefe “A” ou do Comandante “B”. A culpa é do patriotismo errante, da postura filha do carreirismo, irmã da autoflagelação merrequeira, neta do comodismo da marola, prima do complexo de inferioridade e bastarda da conveniência verticalizada.
Um dos sinais da desagregação de uma nação é quando as Forças Armadas dão sinais de fragilidade.
Na queda do Império Romano foi assim. Mas isso eu não falei pro Mike.
Haroldo Amorim é Cel R/1 do Exército
Recebido por correio eletrônico
do meu amigo Dari
.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Atravanca um palpite aqui: