por Maynard Marques de Santa Rosa
“O governo, o povo e as Forças Armadas do Estado de Minas Gerais declaram-se fora da União Federal”.
A proclamação do governo Magalhães Pinto, propalada em tom retumbante pelo “Repórter ESSO”, causou impacto na geração de 1964, sinalizando a ruptura da ordem estabelecida e culminando o longo processo de crise que remontava à sucessão do presidente Getúlio Vargas.
Naquele momento, a desarmonia imperava entre os poderes constitucionais. O clamor por reformas de base “na lei ou na marra” pressionava o Congresso, de forma sincronizada, combinando tensões geradas pelo Executivo com a agitação dos movimentos sindical e estudantil.
A inflação fugia ao controle. Nas áreas urbanas, um estado permanente de greve paralisava a atividade produtiva. No campo, os produtores rurais viviam sobressaltados pela ameaça de invasão de grupos organizados. O País jazia virtualmente paralisado.
É inegável a ingerência externa na crise brasileira. O planeta vinha conflagrado pela “Guerra Fria” bipolar. Os países do Terceiro Mundo, transformados em campos de batalha nos termos da “detente” Washington–Moscou, serviam de instrumento para as manobras subversivas da União Soviética e da reação militarista americana. Nem mesmo o talento de Eric Hobsbawm conseguiu convencer os historiadores da inocência socialista.
O Brasil tornou-se alvo prioritário, pelo seu potencial estratégico e importância na América do Sul. Aqui atuaram grupos políticos nacionais como quintas-colunas do movimento comunista internacional, abrigados confortavelmente nas legendas dos partidos legais.
No dia 13 de março, durante o comício da Central do Brasil, o chefe do Estado-Maior do Exército, da janela do seu gabinete no Palácio Duque de Caxias, assistiu à ovação dos sargentos rebelados que, fardados, conduziam nos braços o próprio presidente da República. A praça estava emoldurada por bandeiras nacionais, ostentando a esfera em vermelho, e tendo a foice e o martelo no lugar do dístico “ordem e progresso”.
Mais uma vez na História, os chefes militares viram-se forçados a intervir no processo político, antecipando-se ao caos projetado pela ameaça revolucionária. Assim ocorrera, igualmente, em 15 de novembro de 1889 e 29 de outubro de 1945.
Posteriormente, o IPM 709 comprovou a conspiração, ao encontrar as listas das pessoas que seriam executadas pelos “grupos dos onze”, após o dia 1º de maio.
O apoio popular foi evidente, como atesta o fato de não se conhecer uma única baixa causada pela tropa. Pacífica e silenciosamente, a nação legitimou a intervenção, ratificando que “todo o poder emana do povo e em seu nome deve ser exercido”.
A maior parte da mídia nacional colaborou para o êxito do novo regime. O Poder Legislativo, transformado em Colégio Eleitoral, elegeu o presidente Castello Branco. O Poder Judiciário, preservado nas suas prerrogativas, jamais protestou contra os atos de exceção do governo revolucionário. Tacitamente, o Supremo Tribunal Federal reconheceu-lhe a legalidade institucional.
Considerando a conjuntura global em 1964, não havia alternativa, pois as grandes potências não ficariam impassíveis diante do caos brasileiro. Ou seria a iniciativa dos nossos militares, ou a probabilidade de uma intervenção estrangeira, com risco de evoluir para um desastre fratricida, como foi a Guerra Civil Espanhola.
Os governos pós-64 imprimiram uma gestão patriótica e progressista, recuperando a credibilidade e a auto-estima nacionais. Equilibrou-se o balanço de pagamentos. O programa de integração nacional resgatou a Amazônia. Os planos nacionais de desenvolvimento modernizaram os transportes, as telecomunicações e a infra-estrutura econômica. As taxas de crescimento atingiram e mantiveram-se em níveis sem precedente. O ciclo revolucionário operou a transição de uma sociedade agrária tradicional para uma sociedade moderna, levando o Brasil a ser a 8ª economia mundial.
O espírito conciliador manifestou-se desde o início. Os cargos de primeiro escalão foram entregues à administração civil, sendo poucos os militares que ocuparam os demais ministérios.
O princípio da compartimentação preservou a tropa do envolvimento direto com a atividade anti-subversiva. Pacificado o País com a extinção da luta armada, adotou-se a anistia, criando as condições humanas para a reconciliação nacional. Quando a ação do tempo superar as paixões políticas e erradicar as ideologias fratricidas, a memória nacional haverá de fazer justiça à coragem moral e ao espírito empreendedor dos líderes militares que legaram o exemplo de 31 de março de 1964.
Maynard Marques de Santa Rosa é Gen R1
e este texto é de 31 Mar 2011
Fonte: recebido por correio eletrônico
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