por Janer Cristaldo
A presidente Dilma Rousseff citou ontem, na Argentina, o regime de Cuba como exemplo de sua posição em relação aos direitos humanos. Questionada sobre a ditadura, disse que se deve protestar "contra todas as falhas que existam em relação aos direitos humanos em Cuba".
Ó, como são gentis os petistas! A ditadura cubana não comete crimes. Tem suas falhas, é claro. O Tarso Genro, por exemplo, jamais falou em crimes do stalinismo. No máximo, desvios do stalinismo. Você jamais ouvirá da boca de um petista a palavra crime, quando a discussão for sobre comunismo.
Falar nisso, a Folha de São Paulo publicou ontem artigo do repórter americano Patrick Symmes (1), sobre como viver 30 dias na ilha com o salário de um jornalista cubano, isto é, 15 dólares. Sem falar que deixou de lado as despesas de aluguel de um imóvel vagabundo.
Segundo Symmes, a ração padronizada de produtos básicos consiste, por pessoa, em dois quilos de açúcar refinado, meio quilo de açúcar bruto, meio quilo de grãos, um pedaço de peixe, três pãezinhos.
Riram muito quando perguntei se recebiam carne de vaca. "Frango", disse a mulher, mas isso provocou uivos de protesto: "Qual foi a última vez que recebemos frango?", o marido questionou.
"Pois então, é verdade", ela disse. "Já faz alguns meses". A ração de proteína é distribuída a cada 15 dias e consiste numa carne moída de misteriosa composição, que inclui uma bela proporção de pasta de soja (se a carne for suína, a mistura recebe o falso nome de "picadillo"; se for frango, é conhecida como "puello com suerte", ou frango com sorte).
A ração basta para o equivalente a quatro hambúrgueres. Por mês, mas até aquele momento, em janeiro de 2010, cada um só havia recebido um peixe — em geral,uma cavala seca e oleosa. E há os ovos. A mais confiável das fontes de proteínas, eles são conhecidos como "salva-vidas".
Antigamente, a ração era de um ovo por dia; depois, um ovo a cada dois dias; agora, é de um ovo a cada três dias. Eu teria dez deles como ração para o mês seguinte. A opinião geral é de que a ração mensal hoje só dá para 12 dias de comida.
A minha viagem serviria para que eu fizesse o meu próprio cálculo: como alguém pode sobreviver durante um mês com comida para apenas 12 dias?
Resumindo: em um mês, Symmes perdeu quatro quilos.
Eu havia perdido primeiro dois, depois três, por fim quatro quilos. Mas estômago e mente se ajustaram com facilidade assustadora. Meus gastos totais com comida foram de US$15,08 ao longo do mês. (...) Minha última manhã: sem desjejum, para complementar o jantar que não tive na noite anterior. Usei a moeda que ganhei de uma prostituta para apanhar um ônibus até perto do aeroporto. Tive de caminhar os 45 minutos finais até o terminal; quase desmaiei no caminho.
No entanto, se um dia você conversar com uma assistente social petista — com perdão pelo pleonasmo — ela vai jurar de mãos juntas que em Cuba ninguém passa fome e todos gozam de excelente saúde. Ora, desde quando pode existir população saudável em um país em que o salário de um jornalista pode comprar, em um mês, o suficiente para viver doze dias?
Comentei, ano passado, um filme muito safado, Sicko, do agitprop ianque Michael Moore. O filme é de 2007 e se pretende documentário. No fundo, uma defesa inverossímil da medicina cubana. Moore começa expondo os altos custos da medicina americana, no que não vai nada de novo. Depois se transporta para o Canadá, França e Inglaterra, onde a saúde é subsidiada pelo Estado. Mostra americanos felizes morando em Paris e Londres, como se estivessem no paraíso. No Canadá, há até mesmo americanas casando com canadenses, por um seguro saúde.
O “documentarista” é tão fiel aos fatos que chega a mostrar um cidadão que se fere em Londres, no momento em que atravessa uma rua plantando bananeira e logo após suas démarches junto aos serviços de saúde. Documentarista bom é isso mesmo, pega a história desde o início. Moore estava no exato instante do acidente, para depois acompanhar a história toda. Mas o filme não tem por objetivo mostrar as excelências dos serviços de saúde da Europa. E sim dos de Cuba, o paraíso do Caribe.
Moore descobre que em Guantánamo os prisioneiros lá encarcerados têm assistência médica total e gratuita. E reúne vários americanos em dois barcos, três deles com seqüelas decorrentes do socorro às vítimas do atentado às torres gêmeas. Aproxima-se da prisão, pelo mar, e pede internação de seus passageiros na prisão americana. Como se Guantánamo fosse um hospital público. Na verdade, Moore fala apenas para seu câmera. Fala de longe, em pleno mar, sem ao menos usar um megafone. Claro que não recebe resposta alguma.
O agitprop pega então sua turma e dirige-se ao paraíso. Em Cuba, como se fosse a coisa mais normal do mundo chegar a um país para receber tratamento médico, todos são bem recebidos em um hospital de primeira linha. Com cuidados personalizados. Voltam curados para casa. Sem pagar nada ou quase nada. Por remédios que custam U$ 120 nos Estados Unidos, os americanos pagam 0,5 cents em Havana. Por tratamentos que custam de 7 mil a 15 mil dólares, pagam zero dólar em Cuba. Porque é assim? — pergunta o cineasta à Aleida Guevara, filha de um dos mais operosos assassinos do continente. “Porque nós podemos e vocês não” — responde Aleida.
Resposta definitiva. Incontestável. Ingênuos no Brasil é o que não falta para acreditar que a saúde é um direito de todo cidadão na Disneylândia das esquerdas. Mas o cineasta se revelou mais castrista do que os Castro. O jornal espanhol El País, em sua edição de ontem, trouxe à tona um informe confidencial de 2008, no qual uma delegação americana na ilha descrevia uma paisagem desoladora da saúde.
Segundo o relatório, as autoridades cubanas proibiram Sicko, por subversivo. Embora o filme trate de desacreditar a política sanitária nos Estados Unidos, salientando as excelências do sistema cubano, o regime sabe que o filme é um mito e não quis arriscar-se a uma reação violenta das pessoas, quando os cubanos vissem instalações que não estão disponíveis para a maioria deles. Quando os cubanos da delegação americana viram o filme, alguns se incomodaram tanto com a descarada distorção do sistema de saúde em Cuba que “se foram da sala”.
No entanto, o filme de Moore fez fortuna no Ocidente. Haja panacas neste nosso mundinho.
Fonte: Janer Cristaldo
COMENTO: coloquei o texto de Patrick Symmes (1) logo abaixo. É uma leitura angustiante. A "experiência" do jornalista foi feita no ano passado e, ao chegar à metade do relato, não aguentei e fiz "um ataque" à geladeira, devido à angústia da leitura. Experimente ler e reflita como estaríamos hoje no Brasil se não fosse a "violenta intervenção armada dos militares" contra a democracia que os "jovens sonhadores" de meados do século passado queriam implantar "neçepaíz"!
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