domingo, 19 de setembro de 2010

De Jornal Sério a Pasquim Venal

Enquanto o país afunda em negociatas oriundas de Brasília, a imprensa francesa, que sempre foi crítica em relação ao Brasil, agora se entrega ao charme do presidente mais conivente com a corrupção em toda a história da República. Por mãos amigas, recebo de Paris um suplemento do Le Monde — 98 páginas em formato de revista —, louvando não só o Brasil de Lula mas também Lula, intitulado Brésil un géant s’impose.
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Leitora me escreve:
Caro Janer, você sacou bem a relação da bajulação com os Rafales. Li, a propósito, num destes sites jornalísticos, que o Franklin Martins teria contratado firmas internacionais de marketing por valores milionários. Na véspera de mais um desastre, com a eleição da Dilma, você acha que esta reportagem, logo agora, nas eleições, teria a ver? Afinal a turma do Le Monde é bem afinadinha com eles, e poderá estar levando uma grana brava.
O suplemento tem toda a cara de matéria paga, leitora. É pura louvação ao Brésil de Lula e a Lula. O mitômano analfabeto é visto como gênio da oratória. Nenhuma palavrinha sobre as corrupções que saltam de seu governo como cogumelos após a chuva. No artigo sobre a Rocinha, nada sobre drogas ou criminalidade, muito menos sobre o poder paralelo dominado pelos traficantes. Apenas uma simpática menção à prática de boxe tailandês. As favelas desde há muito são Estados dentro do Estado e sobre isto o jornal não disse água.
Nenhuma menção tampouco à guerrilha católica do MST, que invade terras e destrói laboratórios em total impunidade. Mais ainda, com financiamento do governo. Ao falar dos índios, entrevista um ridículo caiapó, de óculos, short grunge e tórax pintado, que caça macacos ou pássaros, “presas fáceis para suas flechas coroadas de plumas vermelhas”.
Nenhuma versão ao Paulinho Paiakan, o grande ícone caiapó, que foi saudado em capa de uma revista americana como “o homem que pode salvar a humanidade”.
Que estuprou barbaramente, com o auxílio de sua mulher, uma jovem professorinha.
E que hoje, apesar de condenado à prisão, vive em sua reserva livre como um passarinho.

Tampouco falou da exportação ilegal de mogno praticada pelos caiapós, mogno que hoje reveste os corredores quilométricos da Grande Bibliothèque, obra faraônica de Tontonkhamon. Sobre a prática comum de enterrar crianças vivas, em pleno século XXI, comum a várias tribos indígenas no Brasil, nenhum pio.
Sintomaticamente, ao falar do território conquistado em Roraima pelos selvagens, em momento algo pronuncia a palavra ianomâmi. Parece que a ficção criada por Claudia Andujar já não está convencendo sequer os crédulos franceses. Em outro artigo, uma menção gentil ao assassino Raoni: “A cruzada do cacique Raoni, em 1989, ao lado do cantor Sting, permitiu ao povo caiapó financiar a demarcação definitiva das reservas”.
O articulista só esqueceu de dizer que, nos anos 80, Raoni (em verdade, txucarramãe) exibia orgulhosamente aos jornais a borduna com que matou onze peões de uma fazenda. Não só permaneceu impune, totalmente alheio à legislação brasileira, como foi recebido com honras de chefe de Estado na Europa. O papa João Paulo II, François Mitterrand e os reis da Espanha, entre outros, o receberam como líder indígena. Raoni, com seus belfos, se deu inclusive ao luxo de expor sua pintura em Paris. Um dos quadros do assassino atingiu US$ 1.600 em uma lista de preços que começava a partir de mil dólares.
A área da literatura é representada por Jorge Amado, o mais venal dos escritores brasileiros, que na juventude foi nazista e comunista e, depois de velho, rendeu-se aos charmes da rede Globo. Um box diz que o baiano viveu quase toda sua vida no Estado da Bahia, “do qual ele fez o décor de sua obra”. Le Monde esqueceu de dizer que Amado gostava mesmo era de viver às margens do Sena, contemplando a Notre Dame. “Em 86, os americanos me pagaram um adiantamento alto pelos direitos de tradução de Tocaia Grande: US$ 250 mil. Juntamos com os guardados de Zélia e compramos nossa mansarda no Marais, em Paris”, declara o escritor que em 1940 recebia dinheiro da Alemanha nazista e, em 1945, da Rússia stalinista.
O suplemento enaltece o que de pior o Brasil ostenta e omite o que de pior o Brasil produz. Le Monde, que já gozou de credibilidade, hoje é pasquim decadente. Ao que tudo indica, vendeu suas páginas à propaganda eleitoreira do PT.
Pois não se admite que um jornal europeu, que um dia se pretendeu sério, incense um governo notoriamente corrupto em plenos trópicos. Pelo que sei, o outrora glorioso jornal francês anda mal das pernas. Uma graninha, ainda que do Terceiro Mundo, sempre vem a calhar.

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