quarta-feira, 17 de junho de 2009

Cesare Battisti

pelo Gen Bda Celso Krause Schramm
Sr. Jornalista Merval Pereira
Revendo matérias publicadas na semana que findou, li a coluna onde é aberto espaço para que o advogado do italiano Cesare Battisti exponha suas opiniões.
Senhor colunista, pelo que a imprensa noticia sobre o caso, o Sr. Battisti foi acusado, julgado e condenado por quatro homicídios. Nas palavras do advogado, não se encontra a palavra homicídio, assassinato, nem sequer morte. O advogado começa afirmando que seu cliente não é “terrorista” e sim um “ativista político radical”. Ora, o que é ser um “ativista político radical”? Por acaso a condição de “ativista político radical” conferiria aos que assim são identificados o direito de matar? Crimes de morte cometidos por “ativistas políticos radicais” seriam justificados? Seriam os “ativistas políticos radicais” inimputáveis? Ou será que, com inspiração nos romances de Ian Fleming, aos ativistas políticos radicais se confere o duplo zero — com direito de matar — do agente 007 James Bond?
Ao fazer considerações sobre terrorismo, o advogado diz que os termos terrorismo e terrorista, “sobretudo depois do 11 de setembro, ficaram associados a atentados em larga escala, com vítimas inocentes”. Bem, se assim fosse, deveria existir uma tabela de vítimas que caracterizasse a “larga escala” e, consequentemente o terrorismo. Quantas vítimas caracterizariam terrorismo? Cem? Mil? Cinco mil? Ah, e as vítimas devem ser inocentes. Seriam as quatro vítimas do Sr. Battisti inocentes ou culpadas? Se não são inocentes, são culpadas de quê? Que crime cometeram as quatro vítimas que justificasse que o “ativista político radical” lhes aplicasse a pena de morte? Só falta caracterizar as vítimas como culpadas de terem se oposto ao projeto político de certos “ativistas políticos radicais”. Idéias, aliás, rejeitadas pela imensa maioria da nação italiana. Estranho raciocínio que considera injusto condenar à prisão, após julgamento, uma pessoa que cometeu quatro homicídios, mas não se refere aos quatro mortos. Foi justo privá-los da vida? Houve justiça no ato de sua execução?
Ao que me consta, a legislação brasileira não tipifica o crime de “terrorismo”. O que a lei tipifica como crime são os atos violentos que normalmente instrumentalizam o terrorismo. Sem ter formação jurídica, me arrisco a dizer que, se o 11 de setembro tivesse acontecido no Brasil e seus responsáveis capturados, não seriam julgados por “terrorismo” mas por múltiplos homicídios e tantas outras coisas nefastas que o ato materializou, e que estão tipificadas como crime. Ou será que seguindo a linha de argumentação do advogado, os autores e mentores do 11 de setembro seriam apenas “ativistas políticos radicais”? Dessa forma, discutir se o Sr. Battisti é um terrorista ou um ativista político radical parece ter claro objetivo: tirar o foco da ocorrência de crimes de morte.
É interessante salientar que o advogado diz que o Ministro da Justiça do Brasil “não revogou a decisão italiana. Ele apenas afirmou que ela pode ter sido proferida em um contexto que, em razão de contágio político impediu a ampla defesa, sobretudo por ter se baseado em delação premiada feita contra um réu revel.” Brilhante conclusão, provavelmente baseada na visão de uma bola cristal, ou baseada na imaginação de algum “stalinista” de que a justiça italiana funcione como os antigos “Processos de Moscou”. Chega-se ao absurdo de supor que a ampla defesa possa ser prejudicada pela condição de revel do réu. Assim sendo, deve bastar a qualquer réu manter-se foragido para que seu julgamento seja “injusto”. Ou será que alguém de juízo iria perguntar: o réu é revel porque a acusação o impediu de assistir ao próprio julgamento ou é revel por vontade própria?
Igualmente curioso é que o advogado admite que “se formou um consenso poderoso na Itália contra os ativistas de esquerda (e aqui mais uma vez se classifica assassinos como “ativistas”) e em favor da condenação de todos eles. Governo, Parlamento, Judiciário e Imprensa do mesmo lado, unidos pelo mesmo sentimento”. Por que seria? Por que um país democrático, com um bom nível cultural, com liberdade de expressão e tantas outras virtudes chegaria a esse consenso? Pela ânsia de “punir derrotados”? Ou pelo reconhecimento de que os atos de barbárie praticados pelos tais ativistas foram criminosos? No ponto de vista das opiniões expressas pelo advogado do Sr. Battisti, devemos agradecer aos céus por termos uma autoridade administrativa que, do Brasil, identifica esse “brutal erro coletivo do consenso italiano” e restabelece a justiça no caso. Temos, aqui no Brasil, marchando de passo certo, um único soldado, enquanto todo o batalhão italiano marcha de passo errado...
Finalmente, o advogado pergunta por que “mandar para a prisão perpétua, sem luz solar, um homem que não oferece perigo a ninguém?” Sem entrar em considerações sobre a existência ou não de luz solar nas prisões italianas, cabe outra pergunta: toda pessoa que cometa um crime, mas se arrependa e jure não constituir perigo para os demais deve ser imediatamente absolvida do crime cometido? Criminosos que casem, tenham filhos e escrevam livros têm direito a atestado de bons antecedentes?
Concluindo, volto a lembrar que em nenhuma linha do canto de sereia publicado na coluna, se fala na palavra morte, na palavra homicídio, na palavra assassinato. O canto da sereia procura desviar o foco da discussão da extradição de quem assassinou para a extradição de um idealista, de um defensor de idéias políticas radicais. Fala-se nas idéias na cabeça, mas se omite o sangue nas mãos. Na linha de raciocínio apresentada, os parentes e amigos das quatro pessoas cujas mortes a justiça italiana atribui ao Sr. Battisti não devem guardar traumas nem tristezas. Afinal, seus entes queridos pereceram em contato com “ativistas políticos radicais”, não foram abatidos por um assassino.
Infelizmente, nosso país ainda sofre de algo que foi recentemente definido como “sarna ideológica”. Ainda convivemos com pessoas de visão míope, tendenciosa e maniqueísta. O que vem da esquerda é bom e se justifica, o resto é o resto. Às vezes, é preciso inventar novos termos e definições para suavizar os atos da esquerda. Na época da luta armada no Brasil, as organizações da esquerda revolucionária não matavam, elas “justiçavam”; não roubavam, elas “expropriavam”. Hoje, um assassino se torna “ativista político radical”. No contexto dessa visão míope, um coronel, aspirante a ditador, seria execrado e amaldiçoado como mais um militar sul-americano golpista e autoritário. Seria, se não tivesse se declarado socialista e declarado sua admiração pelo mais longevo ditador das Américas. Nessas condições, até o bolivarianismo se torna legítimo e todos os seus atos se justificam. Até os atos que se confrontam com os interesses do Brasil. Quando cidadãos comuns norteiam suas opiniões por essa visão canhestra, é lamentável, mas sempre pode ser visto como uma oportunidade de debate intelectual, de amadurecimento. Quando servidores públicos, pagos pelo povo brasileiro para defender os legítimos e justos interesses de nossa Nação, o fazem, é criminoso.
Fonte: Ternuma

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