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De acordo com Lobo, nas reportagens sobre Planalto, Presidência, economia e política, "há um cuidado que vai além do jornalístico"
por Daniel Castro
Folha de São Paulo
Primeiro âncora da TV Brasil, o jornalista Luiz Lobo, 42, afirma que o Palácio do Planalto interfere no jornalismo praticado pela TV pública federal, lançada pelo governo Lula, em dezembro, com a promessa de que não seria uma emissora chapa-branca. "Existe, sim, interferência do Planalto lá dentro. Há um cuidado que vai além do jornalístico", afirma.
Lobo foi demitido na última sexta-feira, segundo ele, por ter resistido às interferências. Afirma que o Planalto controla o conteúdo das reportagens por meio da jornalista Jaqueline Paiva, mulher do também jornalista Nelson Breve, assessor de imprensa da Presidência da República. Lobo era também editor-chefe do "Repórter Brasil", primeiro e único, até agora, programa da TV Brasil. Jaqueline ocupa o cargo de coordenadora de telejornais.
Lobo diz que a "pressão" aumentou nas últimas duas semanas, quando a crise dos cartões corporativos atingiu a ministra Dilma Rousseff, com o vazamento de um dossiê, elaborado pela Casa Civil, de gastos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e de sua mulher, Ruth Cardoso.
"Não podíamos falar em dossiê, mas em "levantamento sobre uso dos cartões". Depois, a orientação era falar "suposto dossiê'", relata Lobo.
Autonomia
"Todo texto sobre Planalto, Presidência, política e economia tem que passar por ela [Jaqueline Paiva]. É ela quem edita, faz as cabeças [a introdução das reportagens de televisão, lida pelo apresentador]. Existe um poder dentro daquela redação. Eu era editor-chefe, mas perdi autonomia até para fazer a escalada [as manchetes de um telejornal]. A Jaqueline muda os textos dos repórteres freqüentemente. Há muita insatisfação entre os jornalistas", afirma.
Outro exemplo de interferência, de acordo com Lobo, foi a orientação para, nas reportagens sobre deficiências da saúde pública, informar que o setor sofreu um corte orçamentário devido ao fim da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira). A derrubada da CPMF foi uma vitória da oposição.
"Fizemos uma reportagem falando que a verba do SUS [Sistema Único de Saúde] acabaria antes do fim do ano. A Helena [Chagas, diretora de jornalismo da TV Brasil] me chamou na sala dela e disse que era um absurdo uma matéria daquelas ir ao ar, porque em nenhum momento mencionava a falta dos bilhões da CPMF", diz.
Lobo e Jaqueline Paiva travavam embates quase diários na redação de Brasília da TV Brasil. Para o jornalista, a função de Jaqueline deveria ser a de dar direcionamento ao telejornal, não a de editá-lo. "Nunca gravei nem uma nota que ela [Jaqueline Paiva] não revisasse. Não vou dizer que fui um editor-chefe de faz-de-conta porque lutei muito", afirma.
Para Lobo, o espaço dado à oposição na TV Brasil é um disfarce. "A forma que se encontrou para mostrar que a TV não era chapa-branca foi ouvir os dois lados. Mas isso é obrigatório no jornalismo."
A demissão de Lobo ocorreu dois dias depois de ele, como conta, ter relatado interferências a Orlando Senna, diretor-geral da TV Brasil.
O jornalista, que trabalhou durante seis anos na PBS (TV pública americana), afirma que continua acreditando no projeto: "Sou defensor da TV Brasil. Ainda acredito no projeto de uma TV pública. Mas de domínio público, não estatal".
Fonte: Folha de São Paulo
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