sexta-feira, 31 de março de 2017

Aos Que Não Viveram a Contra-Revolução de 31 de Março de 1964

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Texto de 2004, do saudoso Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra
No dia 31 de março próximo faz 40 anos que foi deposto o Presidente da República, João Goulart.
Uns chamam esse acontecimento de golpe militar, outros de tomada do poder, alguns outros de Revolução de 1964. Eu prefiro considerá-lo como a Contra-Revolução de 31 de março de 1964.
Vou lhes explicar o meu ponto de vista ao longo deste artigo. Espero que ao final vocês tenham dados suficientes para julgar se estou certo.
Vocês foram cansativamente informados por seus professores, jornais, rádios, TV e partidos políticos:
- que os militares tomaram o poder dos civis para impedir que reformas moralizantes fossem feitas; 
- que para combater os "generais que usurparam o poder" os jovens da época uniram-se e lutaram contra a ditadura militar e que muitos deles morreram, foram mutilados, presos e torturados na luta pela "redemocratização" do país;
- que os militares assim agiram a mando dos Estados Unidos, que temiam o comunismo instalado no Brasil; 
- que jovens estudantes, idealistas, embrenharam-se nas matas do Araguaia para lutar contra a ditadura e pela redemocratização do país.
Com quantas inverdades fizeram a cabeça de vocês! E por que essas mentiras são repetidas até hoje? Foi a maneira que eles encontraram para tentar justificar a sua luta para implantar um regime do modelo soviético, cubano ou chinês no Brasil.
Por intermédio da mentira, eles deturparam a História e conseguiram o seu intento. Vocês que não viveram essa época acreditam piamente no que eles dizem e se revoltam contra os militares. 
Vamos aos fatos, pois eu vivi e participei dessa época.
Em março de 1964 eu era Capitão e comandava uma bateria de canhões anti-aéreos do 1º Grupo de Artilharia Anti-Aérea, em Deodoro, no Rio de Janeiro.
A maioria dos oficiais que servia no 1º Grupo de Artilharia AAe, entre eles eu, teve uma atitude firme para que o Grupo aderisse à Contra-Revolução.
Eu era um jovem com 31 anos. O país vivia no caos. Greves políticas paralisavam tudo: transportes, escolas, bancos, colégios. Filas eram feitas para as compras de alimentos. A indisciplina nas Forças Armadas era incentivada pelo governo. Revolta dos marinheiros no Rio; revolta dos sargentos em Brasília. Na minha bateria de artilharia havia um sargento que se ausentava do quartel para fazer propaganda do Partido Comunista, numa kombi, na Central do Brasil.
Isto tudo ocorria porque o governo João Goulart queria implantar as suas reformas de base à revelia do Congresso Nacional. Pensava, por meio de um ato de força, em fechar o Congresso Nacional com o apoio dos militares "legalistas".
Vocês devem estar imaginando que estou exagerando para lhes mostrar que a Contra-Revolução era imperativa naqueles dias. Para não me alongar, vou citar o que dizem dois conhecidos comunistas:
- depoimento de Pedro Lobo de Oliveira no livro "A esquerda Armada no Brasil" - "muito antes de 1964 já participava na luta revolucionária no Brasil na medida de minhas forças. Creio que desde 1957. Ou melhor, desde 1955". "Naquela altura o povo começava a contar com a orientação do Partido Comunista".
- Jacob Gorender - do PCBR, escreveu no seu livro "Combate nas Trevas": "Nos primeiros meses de 1964, esboçou-se uma situação pré-revolucionária e o golpe direitista se definiu, por isso mesmo, pelo caráter contra-revolucionário preventivo. A classe dominante e o imperialismo tinham sobradas razões para agir antes que o caldo entornasse".
Diariamente eu lia os jornais da época: O Dia, O Globo, Jornal do Brasil, Tribuna da Imprensa, Diário de Notícias, etc... Todos eram unânimes em condenar o governo João Goulart e pediam a sua saída, em nome da manutenção da democracia. Apelavam para o bom senso dos militares e até imploravam a sua intervenção, para que o Brasil não se tornasse mais uma nação comunista.
Eu assistia a tudo aquilo com apreensão. Seria correto agirmos para a queda do governo? Comprei uma Constituição do Brasil e a lia seguidamente. A minha conclusão foi de que os militares estavam certos ao se antecipar ao golpe de Jango. 
Às Forças Armadas cabe zelar para a manutenção da lei, da ordem e evitar o caos. Nós não tínhamos que defender o governo; tínhamos que defender a nação.
O povo foi às ruas com as Marchas da Família com Deus pela Liberdade, no Rio, São Paulo e outras cidades do país. Todos pedindo o fim do governo João Goulart, antes que fosse tarde demais.
E, assim, aconteceu em 31/03/1964 a nossa Contra-Revolução. 
Os jornais da época (Estado de São Paulo, O Globo, Jornal do Brasil; Tribuna da Imprensa e outros) publicaram, nos dias 31/03/64 e nos dias seguintes, editoriais e mais editoriais exaltando a atitude dos militares. Os mesmos jornais que hoje combatem a nossa Contra- Revolução.
Os comunistas que pleiteavam a tomada do poder não desanimaram e passaram a insuflar os jovens, para que entrassem numa luta fratricida, pensando que lutavam contra a ditadura. E mentiram tão bem que muitos acreditam nisso até hoje. Na verdade, tudo já estava se organizando. Em 1961, em pleno governo Jânio Quadros, Jover Telles, Francisco Julião e Clodomir dos Santos Morais estavam em Cuba acertando cursos de guerrilha e o envio de armas para o Brasil. Logo depois, alguns jovens eram indicados para cursos na China e em Cuba. Bem antes de 1964 a área do Araguaia já estava escolhida pelo PCdoB para implantar a guerrilha rural.
Em 1961 estávamos em plena democracia. Então para que eles estavam se organizando? Julião já treinava as suas Ligas Camponesas nessa época, que eram muito semelhantes ao MST de hoje. Só que sem a organização, o preparo, os recursos, a formação de quadros e a violenta doutrinação marxista dos atuais integrantes do MST.
E foi com essa propaganda mentirosa que eles iludiram muitos jovens e os cooptaram para as suas organizações terroristas.
Então, começou a luta armada.
Foram vários atos terroristas: o atentado ao aeroporto de Guararapes, em Recife, em 1966; a bomba no Quartel General do Exército em São Paulo, em 1968; o atentado contra o consulado americano; o assassinato do industrial Albert Boilesen e do capitão do Exército dos Estados Unidos Charles Rodney Chandler; sequestros de embaixadores estrangeiros no Brasil .
A violência revolucionária se instalou. Assassinatos, ataques a quartéis e a policiais aconteciam com freqüência. 
Nessa época, eles introduziram no Brasil a maneira de roubar dinheiro com assaltos a bancos, a carros fortes e a estabelecimentos comerciais. Foram eles os mestres que ensinaram tais táticas aos bandidos de hoje. Tudo treinado nos cursos de guerrilha em Cuba e na China.
As polícias civil e militar sofriam pesadas baixas e não conseguiam, sozinhas, impor a lei e a ordem.
Acuado, perdendo o controle da situação, o governo decretou o AI-5, pelo qual várias liberdades individuais foram suspensas. Foi um ato arbitrário mas necessário. A tênue democracia que vivíamos não se podia deixar destruir.
Para combater o terrorismo, o governo criou uma estrutura com a participação dos Centros de Informações da Marinha (CENIMAR), do Exército (CIE) e da Aeronáutica (CISA). Todos atuavam em conjunto, tanto na guerrilha rural quanto na urbana. O Exército, em algumas capitais, criou o seu braço operacional, os Destacamentos de Operações de Informações (DOI). Para trabalharem nos diversos DOI do Brasil, o Exército selecionou do seu efetivo alguns majores, capitães e sargentos. Eram, no máximo, 350 militares, entre os 150 mil homens da Exército.
Eu era major, estagiário da Escola de Estado Maior. Tinha na época 37 anos e servia no II Exército, em São Paulo. Num determinado dia do ano de 1970, fui chamado ao gabinete do Comandante do II Exército, General José Canavarro Pereira, que me deu a seguinte ordem: "Major, o senhor foi designado para comandar o DOI/CODI/II Ex. Vá, assuma e comande com dignidade".
A partir desse dia minha vida mudou. O DOI de São Paulo era o maior do país e era nesse Estado que as organizações terroristas estavam mais atuantes. O seu efetivo em pessoal era de 400 homens. Destes, 40 eram do Exército, sendo 10 oficiais, 25 sargentos e 5 cabos. No restante, eram excelentes policiais civis e militares do Estado de São Paulo. Esses foram dias terríveis! Nós recebíamos ameaças freqüentemente.
Minha mulher foi de uma coragem e de uma abnegação total. Quando minha filha mais velha completou 3 anos de idade, ela foi para o jardim da infância, sempre acompanhada de seguranças. Minha mulher não tinha coragem de permanecer em casa, enquanto nossa filha estudava. Ela ficava dentro de um carro, na porta da escola, com um revólver na bolsa.
Não somente nós passamos por isso! Essa foi a vida dos militares que foram designados para combater o terrorismo e para que o restante do nosso Exército trabalhasse tranqüilo e em paz. 
Apreendemos em "aparelhos" os estatutos de praticamente todas as organizações terroristas e em todos eles estava escrito, de maneira bem clara, que o objetivo da luta armada urbana e rural era a implantação de um regime comunista em nosso país.
Aos poucos o nosso trabalho foi se tornando eficaz e as organizações terroristas foram praticamente extintas, por volta de 1975.
Todos os terroristas quando eram interrogados na Justiça alegavam que nada tinham feito e só haviam confessado os seus crimes por terem sido torturados. Tal alegação lhes valia a absolvição no Superior Tribunal Militar. Então, nós passamos a ser os "torturadores". 
Hoje, como participar de sequestros, de assaltos e de atos de terrorismo passou a contar pontos positivos para os seus currículos eles, posando de heróis, defensores da democracia, admitem ter participado das ações. Quase todos continuam dizendo que foram torturados e perseguidos politicamente. Com isso recebem indenizações milionárias e ocupam elevados cargos públicos. Nós continuamos a ser seus "torturadores" e somos os verdadeiros perseguidos políticos. As vítimas do terrorismo até hoje não foram indenizadas. 
O Brasil com toda a sua população e com todo seu tamanho teve, até agora, 120 mortos identificados, que foram assassinados por terroristas, 43 eram civis que estavam em seus locais de trabalho (estima-se que existam mais cerca de 80 que não foram identificados); 34 policiais militares; 12 guardas de segurança; 8 militares do Exército; 3 agentes da Polícia Federal; 3 mateiros do Araguaia; 2 militares da Marinha; 2 militares da Aeronáutica; 1 major do Exército da Alemanha; 1 capitão do Exército dos Estados Unidos; 1 marinheiro da Marinha Real da Inglaterra.
A mídia fala sempre em "anos de chumbo", luta sangrenta, noticiando inclusive que, só no cemitério de Perus, em São Paulo, existiriam milhares de ossadas de desaparecidos políticos. No entanto o Grupo Tortura Nunca Mais reclama um total de 284 mortos e desaparecidos que integravam as organizações terroristas. Portanto, o Brasil, com sua população e com todo o seu tamanho, teve na luta armada, que durou aproximadamente 10 anos, ao todo 404 mortos.
Na Argentina as mortes ultrapassaram 30.000 pessoas; no Chile foram mais de 4.000 e no Uruguai outras 3.000. A Colômbia, que resolveu não endurecer o seu regime democrático, luta até hoje contra o terrorismo. Ela já perdeu mais de 45.000 pessoas e tem 1/3 do seu território dominado pelas FARC.
Os comunistas brasileiros são tão capazes quanto os seus irmãos latinos. Por que essa disparidade?
Porque no Brasil dotamos o país de leis que permitiram atuar contra o terrorismo e também porque centralizamos nas Forças Armadas o combate à luta armada. Fomos eficientes e isso tem que ser reconhecido. Com a nossa ação impedimos que milhares de pessoas morressem e que esta luta se prorrogasse como no Peru e na Colômbia.
No entanto, algumas pessoas que jamais viram um terrorista, mesmo de longe, ou preso, que jamais arriscaram as suas vidas, nem as de suas famílias, criticam nosso trabalho. O mesmo grupo que só conheceu a luta armada por documentos lidos em salas atapetadas e climatizadas afirma que a maneira como trabalhamos foi um erro, pois a vitória poderia ser alcançada de outras formas. 
Já se declarou, inclusive, que: "a ação militar naquele período não foi institucional. Alguns militares participaram, não as Forças Armadas. Foi uma ação paralela".
Alguns também nos condenam afirmando que, como os chefes daquela época não estavam acostumados com esse tipo de guerra irregular, não possuíam nenhuma experiência. Assim, nossos chefes, no lugar de nos darem ordens, estavam aprendendo conosco, que estávamos envolvidos no combate. Segundo eles, nós nos aproveitávamos dessa situação para conduzir as ações do nosso modo e que, no afã da vitória, exorbitávamos .
Mas as coisas não se passavam assim. Nós que fomos mandados para a frente de combate nos DOI, assim como os generais que nos chefiavam, também não tínhamos experiência nenhuma. Tudo o que os DOI faziam ou deixavam de fazer era do conhecimento dos seus chefes. Os erros existiram, devido à nossa inexperiência, mas os nossos chefes eram tão responsáveis como nós.
Acontece que o nosso Exército há muito tempo não era empregado em ação. Estava desacostumado com a conduta do combate, onde as pessoas em operações têm que tomar decisões, e decisões rápidas, porque a vida de seus subordinados ou a vida de algum cidadão pode estar em perigo.
Sempre procurei comandar liderando os meus subordinados. Comandei com firmeza e com humanidade, não deixando que excessos fossem cometidos. Procurei respeitar os direitos humanos, mas sempre respeitando, em primeiro lugar, os direitos humanos das vítimas e, depois, os dos bandidos. Como escrevi em meu livro "Rompendo o Silêncio", terrorismo não se combate com flores. A nossa maneira de agir mostrou que estávamos certos, porque evitou o sacrifício de milhares de vítimas, como aconteceu com os nossos vizinhos. Só quem estava lá, frente a frente com o terroristas, dia e noite, de arma na mão, pode nos julgar.
Finalmente, quero lhes afirmar que a nossa luta foi para preservar a democracia. Se o regime implantado pela Contra -Revolução durou mais tempo do que se esperava, deve-se, principalmente, aos atos insanos dos terroristas. Creio que, em parte, esse longo período de exceção deveu-se ao fato de que era preciso manter a ordem no país.
Se não tivéssemos vencido a luta armada, hoje estaríamos vivendo sob o tacão de um ditador vitalício como Fidel Castro e milhares de brasileiros teriam sido fuzilados no "paredón" (em Miami em fevereiro, foi inaugurado por exilados cubanos, um Memorial para 30.000 vítimas da ditadura de Fidel Castro).
Hoje temos no poder muitas pessoas que combatemos e que lá chegaram pelo voto popular e esperamos que eles esqueçam os seus propósitos de 40 anos passados e preservem a democracia pela qual tanto lutamos.
O autor (1932-2015), Coronel do Exército, foi
 Comandante do DOI/CODI/ II Ex;
 Instrutor Chefe do Curso de Operações da Escola Nacional de Informações
 e Chefe da Seção de Operações do CIE

domingo, 26 de março de 2017

Exibicionismo Em Um País Falido Também Moralmente

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Passado o impacto da surpresa e com maiores detalhes divulgados, podemos iniciar um olhar mais crítico sobre a Operação Carne Fraca.
Até agora sabemos que as investigações já vinham ocorrendo há mais de dois anos. E depois desses dois anos de buscas e análises de dados, chegaram a 21 empresas suspeitas de cometerem algum tipo de irregularidade e destas, três estão sendo acusadas de adulteração em produtos alimentícios.
Em outras palavras, uma Operação que basicamente investigava crimes de corrupção encontra, também, fortes indícios de crimes contra a saúde pública praticados por três das empresas investigadas.
Seria um enorme exercício de imaginação inferir que a divulgação de forma generalizada da má qualidade da carne brasileira se deveu a algum tipo de má intenção contra uma das atividades industriais que vem mantendo a economia do Brasil ainda em pé. Mas o estrago foi feito. E é grande.
Um enorme exagero manchar a reputação dos produtos de quase 5.000 empresas em função de irregularidades contábeis e administrativas ocorridas em 22 delas (menos de 0,5% do total), sendo que somente três destas foram interditadas por práticas nocivas à saúde da população. Quanto à corrupção, jogaram lama sobre uma categoria de 11.000 servidores (2.300 da área de fiscalizações) por terem identificado 33 supostamente desonestos (para quem gosta de estatísticas, + 0,3% do total e pouco mais de 1% dos fiscalizadores).
Segundo noticiado, as empresas e seus delitos são os seguintes:
- Peccin Agro Industrial Ltda, de Jaraguá do Sul, Santa Catarina.
Conduta investigada: Utilização de carne estragada em salsicha e linguiça; utilização de carne mecanicamente separada acima do permitido; uso de aditivos acima do limite ou de aditivos proibidos.
- Peccin Agro Industrial Ltda, de Curitiba.
Conduta investigada: Utilização de carne estragada em salsicha e linguiça; utilização de carne mecanicamente separada acima do permitido; uso de aditivos acima do limite ou de aditivos proibidos.
- Frigorífico Larissa Ltda, de Iporã, Paraná.
Conduta investigada: Comércio de produtos vencidos; troca de etiquetas; transporte de produtos sem a temperatura adequada.
Frigorífico Souza Ramos, de Colombo, Paraná,
Conduta investigada: Substituição de matéria-prima de peru por carne de aves, troca de favores por procedimentos fiscalizatórios
- Central de Carnes Paranaense Ltda, de Colombo, Paraná.
Conduta investigada: Corrupção e injeção de produtos cárneos.
- Transmeat Logística, Transportes e Serviços Ltda, de Balsa Nova, Paraná.
Conduta investigada: Corrupção e injeção de produtos cárneos.
- Fábrica de Farinha de Carnes Castro Ltda, de Castro, Paraná.
Conduta investigada: Não controle de recebimento de matéria-prima.
- Seara Alimentos Ltda, de Lapa, Paraná.
Conduta investigada: Irregularidades no procedimento de certificação sanitária.
- Frigomax Frigorífico e Comércio de Carnes Ltda, de Arapongas, Paraná.
Conduta investigada: Poluição ambiental e corrupção.
- BRF S.A., de Mineiros, Goiás.
Conduta investigada: Corrupção; embaraço da fiscalização internacional e nacional; tentativa de evitar suspensão de exportação.
- Frigorífico Oregon S.A., de Apucarana, Paraná.
Conduta investigada: Corrupção; dificultar ações de fiscalização.
- Breyer e Companhia Ltda, de União da Vitória, Paraná. (Mel e produtos apícolas)
Conduta investigada: Corrupção.
- E H Constantino e Constantino Ltda, de Londrina, Paraná.
Conduta investigada: Corrupção.
- Frango DM Indústria e Comércio de Alimentos Ltda, de Arapongas, Paraná.
Conduta investigada: Corrupção.
- Frigorífico Rainha da Paz Ltda, de Ibiporã, Paraná.
Conduta investigada: Corrupção.
- Frigorífico Argus Ltda, de São José dos Pinhais, Paraná.
Conduta investigada: Uso de senha de servidor do Ministério da Agricultura por funcionário da empresa.
- JJZ Alimentos S.A., de Goianira, Goiás.
Conduta investigada: Embaraço da atividade de fiscalização e corrupção.
- Indústria de Laticínios SSPMA Ltda, de Sapopemba, Paraná.
Conduta investigada: Dificultar as ações de fiscalização.
Indústria e Comércio de Carnes Frigosantos Ltda, de Campo Magro, Paraná.
Conduta investigada: Irregularidades em apuração.
- Balsa Comércio de Alimentos, de Balsa Nova, Paraná.
Conduta investigada: Irregularidades em apuração.
- Madero Indústria e Comércio S.A., de Ponta Grossa, Paraná.
Conduta investigada: Irregularidades em apuração.
Pelo que se vê, na lista podem ser apontados três casos graves de prejuízos à saúde pública; um trambique digno de vigarista "chinelão" (venda de um produto e entrega de outro); dois casos que podem ou não ser graves, de "injeção de produtos cárneos" (alguém sabe o que isso significa??), que imagino seja o acréscimo forçado de água nos produtos a serem congelados para aumentar seu peso (pode até não ser nada disso!!). 
O resto é corrupção, uma das grandes pragas que atingem o Brasil, mas que não justifica a enorme pantomima tecida sobre o fato, além de três empresas citadas com a observação "Irregularidades em apuração", ou seja, sequer há algum motivo para serem citadas. Cabe uma boa ação de danos morais!
Quanto a corruptos e corruptores, consta que trinta e seis pessoas foram presas na sexta-feira (17) e outras duas estariam foragidas: o empresário do frigorífico Frigobeto, Nilson Alves Ribeiro - que estaria na Itália - e o filho dele, Nilson Umberto Sacchelli Ribeiro, diretor da empresa.
Os envolvidos que tiveram prisão preventiva decretada, em ordem alfabética, são:
- André Luis Baldissera, Diretor da BRF. Teria atuado junto a Dinis Lourenço da Silva, Chefe da fiscalização do Ministério da Agricultura para que a fábrica de Mineiros (GO) não fosse interditada, depois de terem sido encontrados traços de salmonela em produtos. 
- Carlos Cesar, Agente de inspeção federal do Ministério da Agricultura no Paraná. Segundo a investigação, recolhia "doações" de empresários do setor de carne
- Daniel Gonçalves Filho, ex-superintendente regional do Ministério da Agricultura no Paraná e apontado como chefe e "articulador" do esquema criminoso. É suspeito de ocultar imóveis em nome de terceiros. 
- Dinis Lourenço da Silva, Chefe da Fiscalização do Ministério da Agricultura em Goiás. Suspeito de ter revertido, após pedido de gerente da BRF, a interdição de uma unidade do grupo em Mineiros. Foi flagrado em conversa telefônica pedindo R$ 300 mil a um gerente da BRF, e outra conversa, revela que ele recebeu R$ 50 mil de um dono de curtume.
- Eraldo Cavalcanti Sobrinho, Fiscal agropecuário no Paraná e responsável por fiscalizar a Peccin. Teria assinado certificados de liberação de cargas para exportação sem executar fiscalização, em troca de dinheiro. Também atuou na fiscalização da Seara, por indicação de um funcionário da empresa, diz a PF. 
- Fabio Zanon Simão, Chefe da assessoria parlamentar do Ministério da Agricultura no Paraná. É suspeito de ter acertado com um frigorífico o pagamento de propina para liberação de abate de equinos
- Flavio Evers Cassou, funcionário da Seara e ex-fiscal do Ministério da Agricultura no Paraná, responsável, então, por fiscalizar a empresa. Acusado de ter acesso aos sistemas internos do ministério na condição de funcionário da Seara. Entregou aos cuidados da chefe da fiscalização no Paraná uma caixa com carnes e outros produtos. Pediu, segundo a investigação, para que fiscais assinassem certificados que permitiam a exportação de produtos, sem que houvesse fiscalização prévia.
- Gercio Luiz Bonesi, Fiscal do Ministério da Agricultura em Londrina. Acusado de intermediar exportação de miúdos de frango para a China pela empresa Jaguafrangos. Atuou, ainda segundo a PF, para favorecer o frigorífico Oregon em uma liberação de abate de cavalos
- Gil Bueno de Magalhães, Superintendente Regional do Ministério da Agricultura no Paraná. Usou o cargo para beneficiar empresas em troca de favores pessoais, segundo a PF. "Coordenador do esquema repulsivo de cobrança de propinas", diz trecho da investigação.
Idair Antonio Piccin, dono do frigorífico Peccin, do Paraná. Acusado de usar aditivos não previstos ou não declarados na produção de linguiças e salsichas, além de fraudar análises laboratoriais dos produtos. Flagrado em conversa discutindo o uso de presunto vencido e estragado na linha de produção. Acusado ainda de pagar propina para fiscais ignorarem irregularidades
- José Eduardo Nogalli Giannetti, representante do grupo Peccin. Tinha conhecimento de irregularidades na fabricação de produtos da empresa e no pagamento de propina aos fiscais, segundo a PF (????). 
- Josenei Manoel Pinto, Agente de inspeção sanitária do Ministério da Agricultura no Paraná. Acusado de integrar "cadeia criminosa" instalada no ministério. Gravação de câmeras de segurança, o mostra levando produtos da empresa Madero, que ele devia fiscalizar. 
- Juarez José de Santana, Chefe da Unidade Técnica Regional (UTR) da Agricultura de Londrina. Acusado de liderar a "célula autônoma criminosamente organizada" a mando dos responsáveis pela fiscalização do Ministério da Agricultura no Paraná, e de atuar em favor de empresas que deveria fiscalizar.
- Luiz Carlos Zanon Junior, Fiscal Federal Agropecuário da UTR de Agricultura de Londrina (PR). Cobrava das empresas MC Artacho, Wegmed Caminhos Medicinais e Unifrango Agroindustrial pagamento em troca da liberação de certificados de conformidade.
- Maria do Rocio Nascimento, médica veterinária e Chefe do Serviço de Inspeção de Produtos de Origem Animal do Ministério da Agricultura, na Superintendência Regional do Paraná. É suspeita de usar o cargo para beneficiar a BRF e a Seara, em troca de vantagens pessoais. Chegou a viajar para vários países da Europa com todas as despesas pagas pela BRF, diz a polícia.
- Nair Klein Piccin, esposa de Idair Piccin e sócia na empresa Peccin. A polícia flagrou uma conversa do casal mostrando que eles usavam cabeça de porco no preparo de linguiça, o que é proibido pela legislação brasileira. Investigadores dizem que Nair pagou propina para fiscais agropecuários ignorarem as práticas sanitárias irregulares.
- Nilson Alves Ribeiro, sócio do frigorífico Frigobeto, ao lado de seu filho, Nilson Umberto Saccheli. Ele é acusado de pagar R$ 350 mil em propina para fiscais do Ministério da Agricultura do Paraná, em troca de uma licença para abate de carne de cavalo no frigorífico Oregon, seu parceiro.
- Nilson Umberto Saccheli, sócio do frigorífico Frigobeto, ao lado de seu pai, Nilson Alves Ribeiro. Ele é acusado de pagar R$ 350 mil em propina para fiscais do Ministério da Agricultura do Paraná, em troca de uma licença para abate de carne de cavalo no frigorífico Oregon, seu parceiro. 
- Normélio Peccin Filho, irmão de Idair Antonio Piccin e sócio da empresa Peccin. A PF flagrou uma conversa entre Idair e Normélio que mostra que a empresa produzia linguiças e salsichas em desacordo com a legislação, usando mais analito amido, nitrito/nitrato e aditivos que o permitido. A empresa também mascarava presuntos podres, segundo investigadores. Diálogos comprovaram ainda a manipulação de amostras de carnes para fraudar exames laboratoriais de fiscalização.
- Paulo Rogério Sposito, dono do frigorífico Larissa, em Mauá (SP), e candidato a deputado federal por São Paulo em 2010. Foi flagrado orientando funcionários a trocar as etiquetas das datas de validade dos produtos e dizendo não se preocupa com uso de carne vencida há três meses para preparo de alimentos. É acusado de pagar propina a fiscais do Ministério da Agricultura para ignorarem as irregularidades.
- Renato Menon, Fiscal agropecuário no Paraná. Acusado de integrar a rede criminosa no Ministério da Agricultura coordenada por Daniel Gonçalves Filho e Maria do Rocio Nascimento. Recebia dinheiro ou produtos para liberar cargas sem fiscalizá-las, diz a PF. Também atuava na fiscalização da empresa Madero, que não cometia irregularidades, e mesmo assim a pressionava para pagar propina.
- Roberto Brasiliano Da Silva, conhecido como Braz, é ex-assessor parlamentar do ex-deputado pecuarista José Janene e foi candidato a vereador em Londrina (PR) pelo PEN em 2016. Não tem cargo no Ministério da Agricultura, mas era colaborador de Juarez José de Santana, chefe UTR da Agricultura de Londrina. Recolhia propinas para Juarez e ajudava a camuflar os produtos dos crimes, segundo a investigação. 
- Roney Nogueira dos Santos, Gerente de Relações Institucionais e Governamentais da BRF e apontado como articulador do grupo junto a órgãos públicos. Segundo as investigações, praticou crimes contra a administração e saúde pública, em coautoria com servidores da Superintendência Regional do Paraná. É acusado de atuar para influenciar nas decisões dos fiscais do Ministério da Agricultura
- Sebastião Machado Ferreira, Agente de Inspeção Sanitária e Industrial, subordinado a Juarez José de Santana. Recolhia produtos oriundos de extorsão junto a frigoríficos e armazenava as carnes em sua casa
- Sergio Antonio de Bassi Pianaro, Agente de inspeção sanitária do Paraná. Integrava a rede coordenada por Daniel Gonçalves Filho e por Maria do Rocio Nascimento. Segundo as investigações, trabalhava em conjunto com Tarcísio Almeida de Freitas, fiscalizando a empresa Peccin. Diálogos interceptados mostram que eles sabiam das irregularidades sanitárias na Peccin, mas faziam vista grossa, em troca de dinheiro e alimentos.
- Tarcísio Almeida de Freitas, Agente de inspeção sanitária do Paraná. Integrava a rede coordenada por Daniel Gonçalves Filho e por Maria do Rocio Nascimento. Uma testemunha declarou que Tarcísio recebia dinheiro e benefícios para mentir em relatórios de fiscalização da Peccin. Diálogo interceptado pela polícia mostra Tarcísio reclamando para Sergio Pianaro sobre a qualidade dos produtos da Peccin
Já as seguintes pessoas tiveram a prisão temporária decretada:
- Alice Mitico Nojiri Gonçalves, esposa de Daniel Gonçalves Filho, por ser conivente com a atividade criminosa dele. Diálogos interceptados pela polícia indicam que ela recebia em casa dinheiro de propina e "encomendas" fruto de extorsão a empresários. Tinha ainda empresas de fachada em sociedade com o marido
- Antonio Garcez da Luz, Fiscal Federal Agropecuário, Chefe do escritório do Ministério da Agricultura em Foz do Iguaçu (PR). Era próximo de Daniel Gonçalves Filho e de Gil Bueno de Magalhães, mas não integrava essa organização criminosa. Agia paralelamente, mantendo seu grupo criminoso na cidade fronteiriça
- Brandízio Dario Junior, Fiscal federal agropecuário, responsável pela agência do Ministério da Agricultura em Maringá (PR). Participou de uma reunião com empresários locais em um shopping, ao lado de Juarez José de Santana (???)
- Celso Dittert de Camargo, Agente de inspeção do Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem Animal (SIPOA) no Paraná. Atuava na empresa Madero ao lado do fiscal Renato Menon e a pressionavam, criando empecilhos para forçar o recebimento de propinas. Celso mandou paralisar atividades da Madero alegando falta de higienização e disse que a situação se repetiria caso não houvesse “ajuda”. Os dois levavam carnes da empresa, como hambúrgueres, picanhas e filés mignon. Depois, começaram a receber dinheiro. A empresa chegou a mudar a sede para fugir dos fiscais. 
- Leomar José Sarti, classificador de produtos da Companhia de Desenvolvimento Agropecuário do Paraná (CODAPAR), lotado em Foz do Iguaçu (PR), também atuava em conjunto com o fiscal Antonio Garcez da Luz. A investigação diz que Leomar orientou fiscal a liberar carga de ervilha podre e mal cheirosa, apagando parte do laudo de vistoria que observava irregularidades
- Luiz Alberto Patzer, Agente de inspeção do Ministério da Agricultura e também auxiliar de Juarez José de Santana. Fez oito operações de crédito em uma conta de Juarez, num valor total de R$ 10 mil. Segundo a polícia, isso indica que Patzer recolhia propina de empresas e a repassava para Santana.
- Marcelo Tursi Toledo, Auditor fiscal federal agropecuário. Foi flagrado conversando com Osvaldo José Antoniassi sobre recebimento de propina, segundo a polícia.
- Mariana Bertipaglia de Santana, filha de Juarez José de Santana. Teria atuado como "laranja" do pai e chegou a ser sócia em empresas agora investigadas pela polícia. 
- Osvaldo José Antoniassi, Fiscal federal agropecuário atuante em Foz do Iguaçu (PR). Foi flagrado conversando com Marcelo Tursi Toledo sobre recebimento de propina, segundo a polícia. 
Rafael Nojiri Gonçalves, advogado e filho de Daniel Gonçalves Filho. Rafael recebia dinheiro de propina em sua conta bancária e atuava como parceiro nos negócios paralelos do pai. Segundo a polícia, ele tem empresas de fachada em sociedade com Daniel.
- Sidiomar de Campos, Agente administrativo na UTR de Agricultura em Londrina. Era executor de ordens de Juarez José de Santana (???). Recolhia e entregava encomendas suspeitas
Disso tudo, restam alguns detalhes que salientam aspectos interessantes. Um deles é sobre a peste da corrupção. 
Pelo que se vê nas acusações aos presos, alguns teriam usufruído de valores significativos, como o Chefe da Fiscalização do Ministério da Agricultura em Goiás, que teria recebido irregularmente valores de 300 mil e 50 mil reais, ou a veterinária que teria recebido viagens à Europa de presente. Quanto aos demais, fala-se em dinheiro, mas não são quantificadas as tais propinas, com exceção do Agente de Inspeção que repassou R$ 10 mil ao chefe. Daí infere-se o nível do que no RS definem como "chinelagem"!! Funcionários destruírem suas vidas profissionais em troca de merreca ou de alguns quilos de carne, só pode ser entendido como reflexo da "certeza da impunidade" derivada do fato de seus chefes também cometerem patifarias em maior ou menor grau de despudor
Este é o terrível legado moral que o Brasil está recebendo de suas autoridades maiores. Furtos e roubos envolvendo bilhões de reais de verbas públicas, com seus autores fazendo acordos de delação e indo cumprir penas em casa, servem como incentivo para que "delinquentes latentes" se deixem levar pelas facilidades oferecidas pelo exercício de cargos com algum tipo de autoridade para liberarem seus instintos desonestos
Me chamou a atenção o terrível destino da Madero Indústria e Comércio S.A., de Ponta Grossa, Paraná. Mesmo agindo corretamente, foi pressionada pelos bandidos investidos em cargos públicos para pagar-lhes propina. Queixar-se a quem, se o Superintendente Regional do Ministério da Agricultura chefiava os delinquentes?  Sem saída, os administradores da empresa renderam-se às pressões e passaram a "agradar" os meliantes, resultando, agora, em sua investigação como possíveis "corruptores". 
Outro aspecto a ser considerado foi a onda de repulsa e brincadeiras desencadeada contra pessoas famosas que fazem propaganda de algumas das empresas apontadas como fraudadoras dos produtos que eles anunciaram. Para quem consegue fazer seus dois neurônios funcionarem coordenadamente, é uma coisa risível. Mas ante um povinho como o nosso, que tem a televisão como fonte prioritária de informação, quando alguém famoso faz propaganda de alguma coisa, mesmo que não a use, liga sua imagem ao que ele diz ser bom. Que este episódio sirva de lição para os demais "famosos": ter certeza sobre o que estão dizendo ser bom.
Por fim, já foi aceito por todos que a maneira como foi feita a divulgação da Operação Carne Fraca foi um espetáculo exagerado. Me pareceu que a tentação midiática atingiu os responsáveis por esta investigação, levando-os a buscar seus "quinze minutos de fama" prometidos por Andy Warhol.
Faz tempo que critico a excessiva exposição de policiais, em diversos âmbitos, dando explicações de como se processam investigações criminais. Entendo que detalhes de investigações devem constar nos processos enviados à Justiça, se imprescindíveis à formação de provas. À imprensa e à sociedade devem ser fornecidos dados sobre quais crimes foram cometidos e quem os cometeu. O resto é sede de holofotes, que podem causar mais males que benefícios.
Concluindo, nos resta esperar que os 0,5% dos frigoríficos e os 0,3% de funcionários públicos envolvidos como criminosos nessa patifaria sejam punidos exemplarmente, sem nenhum tipo de leniência, para que os exemplos da Petrobras -- onde foram punidos menos de meia dúzia de "diretores" e não se fala na apuração de envolvimento de funcionários de 2º e 3º escalões (alguém acredita que um Paulo Roberto Costa, do alto da arrogância que afeta os grandes bandidos, iria para um computador alterar editais, planilhas e outros documentos?) -- não se repitam.

sexta-feira, 17 de março de 2017

A Espiral da Mediocridade

A consequência de décadas desta hegemonia esquerdista é aquilo que chamo de espiral da mediocridade.
por Luis Milman
O ambiente universitário brasileiro, a exemplo do jornalístico, é um terreno no qual sempre proliferou a mentalidade esquerdista. O Partido dos Trabalhadores, desde os anos 80, é o preferido de professores e alunos, que ostentam sua militância abertamente e com orgulho. Na medida em que o PT foi se tornando um partido de governo, partidos de esquerda mais à margem do poder, como o PCdoB, o PSTU e o PSOL, passaram a dividir com os petistas a liderança do movimento estudantil, enquanto os sindicatos docentes, especialmente das universidades públicas, continuaram a ser dominados por petistas. O PT substituiu o antigo PCB, o Partidão – do qual, em muitos aspectos, é um esbirro – na preferência da intelligentsia universitária. Assim, não é novidade que sempre tenha havido, por parte deste setor, uma adesão confessional aos padrões de pensamento e organização marxistas.
Para todos os efeitos, estar vinculado ao PT ou, em segundo plano, aos demais partidos da esquerda, aberta ou informalmente, significa, ainda hoje, possuir uma carta de recomendação ideológica, sem a qual é muito difícil abrir as portas para a participação em grupos que dominam a política e movem a burocracia universitária. A credencial é responsável pela ocupação de cargos diretivos e pela consequente ascensão na carreira docente, sem falar na participação assídua em congressos nacionais e internacionais e, principalmente, nas agências estatais de fomento à pesquisa, que controlam a distribuição de bolsas de estudo para alunos e verbas polpudas para professores. Para aqueles que não se ajustam ao perfil ideológico dominante, que são independentes ou não-alinhados ao ideário hegemônico, resta resignarem-se com um autêntico exercício de sobrevivência profissional, em um contexto que, não raras vezes, torna-se, até mesmo, hostil.
A contra-face deste esquerdismo que sequestrou a Universidade brasileira é a inexistência de setores articulados mais identificados com referências teóricas de direita. Entenda-se por direita, aqui, não o espantalho reacionário que os petistas, ou a esquerda brasileira como um todo, fabricou para justificar sua doutrinação. A direita que importa é aquela dos conservadores e liberais, que defende os valores da democracia republicana, da economia de mercado, da tradição e costumes judaico-cristãos e da liberdade individual. Esta está praticamente extinta na Universidade, muito por culpa de sua própria falta de combatividade e de sua aceitação pacífica do expurgo ideológico a que foi submetida pela esquerda.
Externamente, apenas para fins de propaganda, os esquerdistas que dominam os campi sustentam que são democratas e que há, na universidade, um fluxo de pensamento livre. Não há. Este fluxo é condicionado pela aceitação, por parte da maioria esmagadora de professores e estudantes, de modo tácito ou explícito, da mentalidade revolucionária marxista ou para-marxista e de sua superioridade moral. Um professor, na área de Humanidades, por exemplo, tem muita dificuldade operacional para expor as ideias políticas de Hume, Burk ou Toqueville, ou a crítica ao socialismo de Mises e Hayeck, num ambiente no qual Marx, Gramsci, Adorno e Dvorkin são praticamente vistos como sublimes.
São imperceptíveis, na Universidade brasileira, os registros do debate e da abertura intelectual. Em seu lugar, há um compadrio doutrinário e a consequência de décadas desta hegemonia esquerdista é aquilo que chamo de espiral da mediocridade. Nas salas de aula e nos encontros de pesquisadores repetem-se à exaustão as fórmulas surradas de pensadores marxistas. Há muito espaço, também, para anarco-marxistas, como Foucault, ou para pós-modernistas como Derrida, além de uma penca de autores de expressão menor que seguem estas linhas. Tudo produzido de maneira repetitiva para consumo da clientela acadêmica. Não há diferença entre formação e doutrinação. A reflexão dá lugar ao automatismo e os modos de expressão, na mesma medida em que a capacidade crítica é substituída por uma adesão do sujeito a uma dogmática já existente, limitam-se a propagar e a produzir cópias caricatas dos modelos que habitam o Olimpo das ideias revolucionárias e desconstrutivistas.
É a este quadro, em linhas gerais, que está reduzida a intelectualidade na Universidade brasileira. É de se reconhecer, no entanto, que está surgindo, devido à degradação política do PT, uma demanda por mais inteligência na sociedade. Esta demanda reflete-se no meio acadêmico, onde a situação confortável da esquerda passou a sofrer alguma contestação, mesmo que ainda incipiente. Uma das defesas do esquerdismo, digamos, corporativo da Universidade, é fazer com que suas práticas e hábitos permaneçam opacas para essa mesma sociedade que a sustenta. A vida intelectual e a burocracia universitárias ainda constituem uma caixa-preta para o cidadão comum. É preciso urgentemente devassá-la.
Luis Milman é professor de filosofia e jornalista.

quarta-feira, 8 de março de 2017

Socialite, Espiã e Salvadora


por Hallie Rubenhold
A morte de uma senhora escocesa idosa, em 15 de maio de 1823, na pequena Ville d'Avray, entre Paris e Versalhes, não seria digna de nota a não ser por um detalhe: a vida de Grace Dalrymple Elliot havia sido cheia de intrigas, provações e coragem. Conviveu intimamente com lordes, duques e condes; supostamente, teve um filho do principe de Gales; salvou um marquês durante a Revolução Francesa; e (como ela afirmou) dividiu uma estadia infernal na prisão com uma futura imperatriz.
Wikipedia-Grace_Elliott
Nascida por volta de 1754, Grace foi criada na casa de seus avós maternos em Edimburgo, até a morte de sua mãe em 1765, quando foi mandada para a escola na França. Pouco depois de voltar, em 1771, casou-se com o médico John Eliot, cerca de 20 anos mais velho do que ela. O casamento, porém, não deu certo. Depois de problemas de ambos os lados, acabou quando Eliot, após descobrir as "indiscrições" de Grace com o visconde de Valencia, levou-a à Justiça sob acusação de adultério e, em 1776, obteve o divórcio e uma indenização.
A mais antiga das profissões
Em desgraça e financeiramente arruinada, Grace tornou-se cortesã.
Construiu uma vida luxuosa, apesar da precariedade, através de uma rede de relacionamentos com nobres, notavelmente o Marquês de Cholmondeley e o Principe de Gales - mais tarde, Rei George IV - do qual ela alega ter engravidado de uma menina.
Na primavera de 1779 ela começou a ir a Paris, onde conheceu Luís Felipe II, o Duque de Orleans. Na capital francesa, Grace encontrou não só um ambiente mais tolerante às suas indiscrições, como também muitos nobres ricos que poderiam financiar seu extravagante estilo de vida. Em 1786, mudou-se para Paris visando estreitar suas ligações com Orleans. É claro que ela não conseguiu perceber a iminente derrocada do antigo regime e seus excessos.
Três anos depois, os revolucionários tomaram a Bastilha. Durante o período de tumultos, Grace permaneceu em Paris ao lado de Luís Felipe (agora um jacobino), apesar de sua simpatia pela realeza. E em setembro de 1792 estava totalmente envolvida no conflito. Naquele mês, os jacobinos invadiram as prisões para matar supostos contrarrevolucionários e aristocratas. Grace foi solicitada a ajudar o Marquês de Champcenetz, um ex-camareiro do rei e governador do Palácio das Tulherias, a fugir de Paris. Um mês antes, ele havia sido gravemente ferido durante a invasão do palácio e estava sendo escondido por uma amiga de Grace. Logo que os revolucionários começaram a fazer buscas por nobres nas casas de Paris, a cortesã ofereceu sua casa de campo para esconder Champcenetz.
Depois de acomodá-lo em sua carruagem, ela descobriu que as saídas da cidade estavam fechadas. Então abandonou o veículo e levou o marquês febril para sua casa, carregando-o pelas ruas ocupadas por soldados. Sabendo que seus criados eram partidários da revolução, ela escondeu o fugitivo em seu quarto, dentro do colchão, enquanto os guardas vasculhavam a casa. Dias depois ela conseguiu levá-lo para sua casa de campo e de lá, em janeiro de 1793, para a Inglaterra.
Amazing Women in History.
Este foi um dos muitos incidentes registrados em suas memórias, publicadas postumamente em 1859 com o título Minha Vida Durante a Revolução Francesa. As autoridades francesas suspeitavam de Grace, e por um bom motivo: ela agiu como espiã para os britânicos, passou correspondências entre os émigrés e os contrarrevolucionários, e pode ter ajudado a levar cartas de Maria Antonieta para a Áustria. Mas foram suas relações com o duque que a levaram ao Comitê de Segurança Pública de Robespierre.
Conforme a revolução se radicalizava, até mesmo o jacobino Duque de Orleans e seus seguidores se tornaram suspeitos. Entre a primavera de 1793 e o verão de 1794, Grace afirma que foi interrogada e presa diversas vezes. 
Quando esteve na prisão de Récollets, em Versalhes, no outono de 1793, soube da morte de Maria Antonieta e do Duque de Orleans. Então, em janeiro de 1794, foi levada para a prisão de Carmes onde, segundo conta, dividiu uma cela com Josefina de Beauharnais, mais tarde esposa de Napoleão e imperatriz da França.
Censura
Como Grace conseguiu manter sua cabeça durante o Terror não se sabe: o úItimo capítulo de seu diário foi censurado. Depois de ser libertada, ela dividia seu tempo entre Londres e a França. Morreu em 1823 enquanto visitava a casa o prefeito de Ville d'Avray.
O diário de Grace é um dos melhores relatos de primeira mão sobre a Revoluçao em língua inglesa. Desde sua publicação em 1859, muitos questionam a veracidade do relato, parcialmente devido às suas escandalosas revelações. Mas, apesar de haver imprecisões em suas memórias, não há dúvida de que foi uma mulher notável que teve uma vida turbulenta e fascinante, em uma era turbulenta e fascinante.
Hallie Rubenhold é historiadora e escritora
Fonte:   BBC History Brasil 


domingo, 5 de março de 2017

Na Semana da Mulher, Uma Homenagem a Algumas Que Fizeram Diferença

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Elizabeth Van Lew
Elizabeth Van Lew era filha de um próspero negociante de escravos em Richmond, Virginia.  Quando o pai dela morreu e ela herdou os onze escravos da família, libertou-os e auxiliou na educação deles, inclusive enviando-os à Filadélfia. 
Quando a guerra civil começou, Van Lew era manifestamente leal à União e, ao longo do tempo, operou uma rede de espionagem com doze pessoas, incluindo funcionários dos Departamentos da Guerra e da Marinha e um candidato a prefeito de Richmond. Ela desenvolveu um sistema de criptografia e frequentemente contrabandeava mensagens para fora de Richmond em ovos ocos, usando seus ex-escravos como facilitadores.
Mary Elizabeth Bowser
Um dos seus mais ousados espiões era uma ex-escrava chamada Mary Elizabeth Bowser. Quando a guerra começou, Van Lew enviou a Bowser — então na Filadélfia — um pedido para voltar a Richmond para participar em operações clandestinas. Van Lew, conhecida do Presidente Confederado Jefferson Davis, recomendou Bowser para o cargo de empregada. Uma vez aceita, ela foi infiltrada na casa de Davis e tinha acesso a documentos oficiais e reuniões confidenciais.
George H. Sharpe, o comandante do Escritório de Informações Militares da União, creditou a Van Lew "a maior parte de nossa inteligência em 1864-65." Na primeira visita de Ulysses S. Grant a Richmond depois da guerra, ele tomou chá com Van Lew e declarou "você me enviou as mais valiosas informações recebidas desde Richmond durante a guerra.
Depois da guerra, Van Lew pediu que todos os relatórios da União relacionados com ela e sua rede fossem destruídos, limitando a visibilidade sobre ela e seus espiões. As duas, Van Lew e Bowser foram incluídas no Hall da Fama do Corpo da Inteligência Militar dos Estados Unidos da América.
Fonte:  tradução livre de Defense Intelligence Agency