sábado, 18 de fevereiro de 2012

Greve de Polícia — do Pleito ao Motim

por José Pastore
No Brasil, a economia vai bem, mas as instituições vão mal. Basta observar a crise da Justiça, a indisciplina nas escolas e, agora, a rebelião dos policiais. 
Os profissionais da segurança querem a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 300 que garante um piso de R$ 4.500,00. Por mais justo que seja o pleito, eles não têm autorização para desrespeitar as leis. Nada justifica a indisciplina ocorrida na Bahia, no Rio de Janeiro e em outros Estados.
Alguns analistas atribuem a desordem à falta de regulamentação do direito de greve do setor público. Há, aqui, uma verdade e um equívoco. De fato, o governo federal tem se omitido na ação no Congresso Nacional para aprovar aquele disciplinamento. Para preencher o vácuo legal, o Supremo Tribunal Federal (STF) regulou a greve dos servidores públicos pelas regras da Lei nº 7.783 de 1989, que se refere ao setor privado.
O equívoco decorre dos seguintes fatos: a Constituição federal inclui na categoria de militares os oficiais das Forças Armadas, os policiais e os bombeiros. A eles compete preservar a ordem e garantir a segurança das pessoas e das propriedades. Em 1988, o constituinte brasileiro optou sensatamente por proibir a sindicalização e a greve para os profissionais que portam armas  os militares em geral. Por isso, para essa categoria, não há nenhuma necessidade de regulamentar a matéria.
Os policiais podem defender seus pleitos por meio de ações disciplinadas de associações, manifestos e redes sociais, hoje tão na moda. Há uma peculiaridade. Neste caso, o embate se trava entre as mesmas entidades legais, pois policiais e governantes são partes do governo. As disputas que ocorrem entre empregados e empregadores do setor privado são diferentes e, havendo infrações, os policiais têm o dever de intervir para proteger os cidadãos e o patrimônio. Mas, quando eles mesmos se rebelam, quem intervém?
A conduta dos rebeldes nos episódios recentes é extremamente grave. Os policiais têm o monopólio de usar a força para prevenir a violência e jamais para provocá-la. Por isso, a disparada de homicídios, saques e assaltos dos últimos dias tem de entrar na conta de quem deixou de cumprir o seu dever. 
Mas o Brasil é o país do perdão gratuito, concedido sem penitência. Os precedentes são péssimos. Por força de leis anteriores foram anistiados policiais e bombeiros de inúmeros Estados brasileiros que praticaram delitos semelhantes, infringindo frontalmente as regras de sua corporação, das leis ordinárias e da própria Carta Magna. 
Além das irreparáveis perdas das vidas humanas, a rebelião vem afetando a imagem do Brasil. O mesmo pode ser dito em relação à greve de juízes ocorrida no final de 2011. A insegurança é muito grande: quando os juízes fazem greve, quem a julga?
Com tamanho desrespeito, o País vira terra de ninguém. É isto mesmo: quando não se conta com policiais e juízes para manter a ordem, as pessoas se desorientam e os investidores desanimam. Os motins em tela ganharam letras garrafais na imprensa mundial. Eu estive na Coreia do Sul na semana passada, onde a televisão e os jornais deram um triste destaque às mortes dos inocentes e à depredação do patrimônio, o que chocou a opinião pública e intranquilizou os investidores que pensam em vir para o Brasil. 
A propósito, fui informado de que naquele país grupos de jovens que fazem o serviço militar são treinados para agirem como bombeiros, policiais, condutores de ônibus, trens e metrôs e operadores de usinas elétricas, abastecimento de água, petróleo e outras atividades essenciais.
Por isso, além da cabida apuração e punição dos policiais indisciplinados, que tal pensarmos nesse tipo de treinamento? Afinal, o Brasil não corre o risco de ser invadido por nenhum de seus vizinhos, o que dá aos jovens conscritos muito tempo para se prepararem para as emergências do cotidiano. 
É Professor de Relações do Trabalho
da FEA-USP.

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