domingo, 16 de janeiro de 2011

Bento XVI Profere Mais Uma Bobagem

por Janer Cristaldo
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Se a idéia de uma danação ou salvação eterna foi um dos instrumentos de dominação encontrados pelos padres para manter seu poder temporal, bem cedo a Igreja percebeu não ser muito inteligente esta pastoral do medo. Morto o crente, sua alma ia para o céu ou para o inferno, sem apelação. Sendo eterna a pena, de nada adiantava orar por quem estava irremediavelmente condenado. Muito menos por quem já estava salvo. E a basílica de São Pedro, além de custar uma fortuna, estava longe de ser concluída. Urgia encontrar uma nova fonte de arrecadação. Surgiu assim o purgatório, uma espécie de Febem celestial, onde o pecador que não tivesse ido para o inferno purgaria suas penas em fogo lento, até merecer a bem-aventurança divina.
Embora os santos da Igreja divirjam sobre a natureza do instituto, mesmo sua acepção mais branda não é das salubres. Diz Agostinho: "este fogo purgatório é mais duro que todas as penas que se possa ver, sentir e imaginar aqui embaixo". Para Santa Catarina de Gênova, "lá os tormentos são iguais aos do inferno". Mas como esta etapa é uma sala de espera do paraíso, a santa consola: "não acredito que possa existir uma alegria comparável à de uma alma do purgatório, exceção feita da dos santos no paraíso".
Urgia encontrar uma nova fonte de arrecadação, dizia, para concluir e manter a casa de Pedro. Para abreviar os tormentos dos defuntos — ou para prevenir a própria queimação póstuma — o católico poderia amortizar suas dívidas com Jeová, comprando indulgências. Estas constituíam uma remissão, diante de Deus, da pena temporal devida pelos pecados já perdoados quanto à culpa. Eram concedidas aos fiéis dispostos a lucrá-la. Poderiam ser parciais, se libertavam apenas em parte da pena temporal; plenárias, se libertavam de vez o infeliz do purgatório. Só a Igreja, dispensadora da redenção, pode distribuir e aplicar, através do Papa, o tesouro das satisfações de Cristo e dos Santos.
Tudo isto pode nos soar hoje como ridicularias de um passado distante. Mas na época era assunto dos mais graves. Martinho Lutero, indignado com a comercialização do bem-estar dos defuntos pelo Vaticano, pregou na porta da igreja do castelo de Wittenberg, em 31 de outubro de 1517, suas 95 teses, o que gerou um cisma, o luteranismo. Mal procedem os sacerdotes que reservam aos moribundos penas canônicas no purgatório, dizia o teólogo alemão em uma de suas teses. Os moribundos são absolvidos de todas as suas culpas pela morte. Mera doutrina humana predicam aqueles que asseveram que tão pronto tilinte a moeda jogada na caixa, a alma saia voando. Por que o Papa, cuja fortuna é hoje mais abundante que a dos mais opulentos ricos, não constrói sozinho uma basílica de São Pedro com seu próprio dinheiro, em lugar de fazê-lo com o dos pobres crentes?
Como as invectivas de Lutero estavam ameaçando a arrecadação de moeda sonante entre os crentes tementes às chamas, em 1563 o Concílio de Trento apressou-se a ratificar a existência do purgatório. Que até hoje existe, como também as indulgências. As plenárias, aquelas que dispensam o fiel de qualquer chamuscada post-mortem, são concedidas tradicionalmente em apenas quatro catedrais de Roma — São Pedro, Santa Maria Maior, São João de Latrão e São Paulo Extramuros.
Diga-se de passagem que, mostrando seu particular apreço ao Brasil, Sua Santidade João Paulo II autorizou que fossem concedidas indulgências plenárias na missa de Finados de 1999, em Santo Amaro, São Paulo, que contou com o patrocínio da Rede Globo de Televisão e a participação de 600 mil fiéis.
Interessante observar que, nos primórdios da extorsão vaticana, não se falava em purgatório como substantivo. Mas como adjetivo: o fogo purgatório. Com a passagem dos séculos, o purgatório adquiriu foros de cidadania e passou a ocupar um espaço físico. Se a Bíblia não o situa onde fica, indica-nos pelo menos que fica perto do inferno. Comentei, há uns três anos, esta localização geográfica. Sem sabermos onde ficam, sabemos que estão próximos um do outro. Está em Lucas, 16:19:
Ora, havia um homem rico que se vestia de púrpura e de linho finíssimo, e todos os dias se regalava esplendidamente. Ao seu portão fora deitado um mendigo, chamado Lázaro, todo coberto de úlceras; o qual desejava alimentar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico; e os próprios cães vinham lamber-lhe as úlceras. Veio a morrer o mendigo, e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão (que era como os evangelistas chamavam o purgatório); morreu também o rico, e foi sepultado. No Hades, ergueu os olhos, estando em tormentos, e viu ao longe a Abraão, e a Lázaro no seu seio. E, clamando, disse: Pai Abraão, tem misericórdia de mim, e envia-me Lázaro, para que molhe na água a ponta do dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que em tua vida recebeste os teus bens, e Lázaro de igual modo os males; agora, porém, ele aqui é consolado, e tu atormentado. E além disso, entre nós e vós está posto um grande abismo, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem os de lá passar para nós”.
Como então que o purgatório é “um fogo interior que purifica a alma do pecado”? Bento precisa ler mais os textos sagrados.
Last but not least, se não temos uma localização do paraíso, parece que também fica nas cercanias do inferno. São Tomás de Aquino proclamava que, além da visão do Altíssimo, um dos prazeres essenciais dos que sobem aos céus era contemplar o os sofrimentos dos que foram arrojados ao inferno. Os eleitos têm curiosos prazeres.
COMENTO:  o texto também trata sobre os "reis magos", leia-o completo na FONTE.

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