segunda-feira, 31 de maio de 2010

Eleições na Colômbia - Resultado do 1º Turno

por Graça Salgueiro
Com 98,88% das urnas apuradas já se pode dar o resultado como definido, onde Juan Manuel Santos alcançou 46.57%, mais de 50% de seu principal contendor, Antanas Mockus que obteve até o momento 21,47%.
Santos conseguiu obter mais votos neste primeiro turno do que o presidente Uribe em 2002 e parece que isto está incomodando muito aqueles que prediziam um “empate técnico” entre os dois candidatos.
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Muita gente deve estar chorando agora, como Chávez, por exemplo, e de nada adiantou as FARC primeiro emitirem um boletim conclamando a população a boicotar as eleições e depois fazendo descarada campanha para Mockus porque os colombianos não acreditam mais em cantos de sereia e sabem perfeitamente bem que terrorismo não se combate com “girassóis”.
A festa ainda não acabou e o Notalatina seguirá com os boletins informando as últimas notícias deste grande acontecimento. Fiquem com Deus e até já!
Fonte: Notalatina
COMENTO: leia o texto completo na fonte. Segundo o Coturno Noturno, "'O Estadão' está publicando uma mentira na sua cobertura às eleições colombianas. A abstenção de 51% está abaixo da média histórica, pois o voto não é obrigatório no país. Na eleição que reconduziu Uribe, em 2006, 55% dos colombianos se abstiveram. Em 2002, a abstenção foi de 54%. Em 1994, em plena crise com a guerrilha, a abstenção chegou a ser de 66%. A notícia do 'Estadão' é o esforço da mídia esquerdista tentando justificar o fracasso do seu candidato." (Grifo meu)

domingo, 30 de maio de 2010

Crime Organizado na América do Sul - Sendero Luminoso e FARC

por Mariano Bartolomé
Buenos Aires, 26 de maio de 2010
É doloroso dizer mas na América Latina, ao mesmo tempo em que os bicentenários oferecem ocasiões propícias para reafirmar a vontade pacífica de nossos povos, a violência continua presente em toda sua geografia. Muitas das formas adotadas pela violência são novidades, porém outras tantas não são assim. Coexistem o velho e o novo, como se evidencia na Colômbia e no Peru.
Quanto ao caso colombiano, faz poucos dias um cidadão dessa nacionalidade de nome Esney Losada foi detido próximo à capital paraguaia por agentes antiterroristas locais, acusado de integrar a "Frente 15-Antonio Nariño" das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC). Segundo as versões difundidas pela imprensa guarani, é possível que Losada estivesse reunindo informações que permitissem o seqüestro extorsivo de um familiar do presidente da Confederação Sulamericana de Futebol.
Aproximadamente duas semanas antes, nas proximidades da cidade de Manaus, houve um fato similar que careceu de repercussão midiática: outra detenção de um cidadão colombiano, neste caso José Samuel Sánchez (vulgo "Martín Ávila" ou "Tatareto"), junto a sete brasileiros, com os quais integrava um bando criminoso que comercializava drogas com as FARC.
Segundo o jornal O Estado de São Paulo, as investigações desenvolvidas pela Polícia Federal brasileira a partir das mencionadas detenções haviam confirmado a existência de bases permanentes das FARC nas selvas setentrionais do país. O diário paulista assegurou, com base em documentos elaborados pelo serviço de inteligência da PF, que os insurgentes comercializam cocaína na região amazônica; com o dinheiro obtido, enviam à Colômbia armas, combustíveis, precursores químicos e diferentes equipamentos.
Cabe destacar que os rumores sobre a presença dos insurgentes na região amazônica não são absolutamente novos. Entre os que sustentam esta tese se encontra John Marulanda, especialista no conflito colombiano que chegou a sugerir a existência de vínculos entre as FARC e funcionários achegados ao presidente Luiz Inácio "Lula" da Silva, incluindo o próprio chanceler Celso Amorim. A propósito, a vontade do Palácio do Planalto indica vedar o uso do território nacional a qualquer tipo de ator estrangeiro, e nesse esforço se inscreve o incremento da presença militar no Amazonas.
Também com a mesma meta, o Brasil implementou mecanismos que permitem um importante fluxo de informação sensível com a Colômbia e vice-versa, cuja importância foi recentemente destacada pelo comandante das Forças Militares colombianas, general Freddy Padilla. Não obstante a existência desse canal permanente, a publicação da nota d'O Estado de São Paulo levou o governo da Colômbia a solicitar ao do Brasil que não permita que seu território seja uma "guarida" para as FARC. Em resposta a esse pedido Marco Aurélio Garcia, assessor para assuntos internacionais do presidente Lula, ratificou que seu governo deterá e eventualmente expulsará todo insurgente estrangeiro e assegurou que as Forças Armadas locais se encontram bem qualificadas para lidar com esse tipo de ameaças não convencionais.
Mais além de sua repercussão conjuntural, as detenções registradas em Assunção e Manaus voltaram a por sobre o tapete o tema da atual situação das FARC e, em particular, sua dispersão e apoios tanto em solo colombiano como no exterior. Ainda que é certo que a esta altura dos acontecimentos os apoios da insurgência dentro do próprio país são particularmente escassos, como se pode constatar nas pesquisas que iniciaram há dois anos a Fiscalía e a Corte Suprema de Justiça em relação à chamada "Farcpolítica", que afetaram apenas a quatro congressistas. Dentre eles se destaca a senadora oposicionista Piedad Córdoba, contra quem o Ministério Público efetuou acusações com base em sua menção em vários correios eletrônicos arquivados no computador do chefe guerrilheiro Raúl Reyes, abatido na controvertida "Operação Fênix"(1).
As acusações formuladas contra a legisladora pelo procurador geral Alejandro Ordóñez incluem a colaboração com o grupo guerrilheiro e o cometimento de atos tendentes à quebra da unidade nacional (traição à Pátria). A cooperação com as FARC incluiu a busca de fontes de financiamento e a manipulação de provas de vida de reféns da organização para favorecer a seus líderes e a governos de outros países. A referência da Procuradoria à erosão da unidade nacional, é certo, se sustenta em contínuos e reiterados chamamentos aos outros governos latino americanos a deslegitimar às autoridades eleitas colombianas e romper relações com a Casa de Nariño.
Um dado da máxima importância, no que se refere à estrutura de apoio das FARC dentro dos limites da Colômbia, é sua crescente vinculação em questões de narcotráfico com o fenômeno chamado "neoparamilitarismo", ainda que esse nome gere importantes desacordos(2). Em qualquer caso, a referência define os novos grupos criminosos que estão se estruturando em diferentes pontos da geografia nacional, e são integradas por ex-integrantes de nível médio das velhas Autodefesas. Estas alianças são tão preocupantes a ponto de serem explicitamente mencionadas pelo Escritório da Alta Comissão das Nações Unidas na Colômbia, em seu informe anual de 2009.
Nesse dossiê se vincula o reaparecimento de grupos armados ilegais com o parcial fracasso do processo de desmobilização de organizações paramilitares. Suas ações incluem narcotráfico, prostituição e tráfico de pessoas, extorsão, jogo clandestino e tráfico de armas; seus métodos incluem assassinatos, ameaças, deslocamento e violência sexual, e se focam não só em membros de outros grupos ou de organismos estatais, mas também latifundiários ou colaboradores.
A situação é diferente no que se refere ao campo externo, um terreno no qual no qual se verifica múltiplas vinculações dos insurgentes colombianos com diferentes atores estatais e não estatais, ainda que em forma recorrente as acusações apontem a Hugo Chaves. A última ocasião em que se manifestou o vínculo das FARC com o presidente venezuelano teve lugar em meados do passado mês de abril, quando o grupo guerrilheiro criticou o magistrado da Audiência Nacional espanhola Eloy Velasco, que acusou o líder bolivariano de facilitar e apoiar uma aliança entre esse grupo e o grupo terrorista basco ETA.
Afirma a cúpula das FARC em um escrito difundido pela Internet: "O inaudito ataque político e jurídico que o juiz espanhol Velasco lançou contra o governo da Venezuela é a continuação da guerra suja que o governo ultradireitista de Bogotá declarou à Revolução Bolivariana da Venezuela". Nessa mesma mensagem, a guerrilha acusou o governante colombiano Álvaro Uribe de atiçar o caso nos bastidores, movido por seu presumido ódio a Chavez(3).
Antes das acusações do juiz Velasco, o candidato presidencial colombiano pelo partido Cambio Radical, Germán Vargas Lleras, denunciou que muitos líderes das FARC se refugiavam no vizinho país, entre eles Timochenco, Bertulfo Álvarez e Grannobles. Ainda de acordo com Vargas Lleras, o Exército venezuelano guarda as instalações usadas pelas FARC nos estados de Táchira, Apure e Zulia; no caso zuliano, se inclui um acampamento onde os guerrilheiros colombianos treinariam centenas de integrantes das milícias bolivarianas em combate rural.
Os grupos venezuelanos treinados pelas FARC seriam pelo menos quatro, incluindo o autodenominado "Movimento Armado e Revolucionário para a Libertação Carapaica", que obteve notoriedade em janeiro passado quando seu líder, conhecido como "Murachi", concedeu várias entrevistas nas quais apareceu, mascarado e armado, no bairro "23 de Enero" de Caracas, local onde se moveriam com total liberdade centenas de militantes "carapaicas" instruidos em técnicas de combate pelos colombianos.
Além do Movimento Carapaica, dizem que as FARC treinam outros grupos, entre eles o Movimento 28 de Abril, as Forças Bolivarianas de Libertação e a Tropa Revolucionária Cubano-Venezuelana. De acordo com os informes de guerrilheiros desmobilizados e as informações dos computadores de Raúl Reyes, o treinamento proporcionado pelas FARC inclui manejo de explosivos, "operações urbanas" e treinamento com armas longas.
O outro caso que pretendemos analisar aqui é o do Peru. Na nação incaica recentemente se comemorou o trigésimo aniversário do grupo maoísta Sendero Luminoso (SL), pois em 17 de maio de 1980 se registrou sua primeira ação contra a comunidade campesina de Chuschi, no departamento de Ayacucho, consistindo na queima de atas de votação para as eleições municipais do dia seguinte. Esse ato, vale dizer, passou praticamente despercebido devido à euforia dos peruanos, que com os comícios daquele momento retornavam à democracia após doze anos de governo militar.
Lamentavelmente, os eventos que se seguiram romperam con essa indiferença e envolveram o Peru en uma espiral de violência. O professor de filosofia Abimael Guzmán (vulgo "Presidente Gonzalo"), fundador do SL, havia traçado como objetivo estratégico da organização construir a sangue e fogo uma "república popular de nova democracia" desde os escombros do "Estado burguês". O resultado foi um conflito armado sem precedentes que em duas décadas custou a vida a quase 70 mil pessoas, em sua maioria gente pobre que habitava em zonas remotas andinas, e causou perdas materiais superiores aos U$S 25 bilhões. Nessa época, os efetivos insurgentes chegaram a somar mais de 5 mil.
A captura de Guzmán em 1992 e sua posterior condenação à cadeia perpétua constituíram severas derrotas políticas que debilitaram gradualmente o SL, já que com ele foi caindo todo seu estado maior. Um ano depois, desde a prisão, o líder terrorista propôs um acordo de paz ao governo de Alberto Fujimori e finalmente depôs as armas.
Hoje, o SL se mantém oficialmente vigente, ainda que como guerrilha esteja reduzido a ações esporádicas em zonas isoladas, muito longe de seu antigo poder de intimidação. Ao mesmo tempo, no campesinato provoca uma indiferença quase total. Qual é, então, a lógica de sua atuação? A resposta é simples: o tráfico de drogas. Há aproximadamente uma década, remanescentes senderistas na zona do Vale dos Rios Apurimac e Ene (VRAE) começaram a vincular-se com o narcotráfico proporcionando segurança ao tráfico de drogas; hoje participam em todo o ciclo desta atividade: o cultivo, seu processamento e transporte fora da zona através dos chamados "mochileiros".
De acordo com especialistas oficiais, os guerrilheiros nessa região selvática não superam os 150 efetivos e carecem de capacidade ofensiva de significação. Sem dúvida, a designação de importantes recursos humanos e materiais para o controle dessa ameaça, por parte do governo, contradiz essa versão. De fato, a visita oficial que Lula realizou ao Peru em dezembro foi propícia para que o anfitrião expressasse seu interesse em adquirir uma dúzia de aviões brasileiros de combate Super Tucano A-29 (três ou quatro deles com urgência), para empregar contra o SL no VRAE.
Esta vertente senderista contaminada pela criminalidade está sob o comando de um guerrilheiro conhecido como "José", sucessor do mítico líder insurgente "Feliciano". Este se chamava na realidade Alberto Rodriguez Durand e era o máximo chefe da organização no VRAE nos anos 90. Em outubro de 1993 se opôs ao cessar fogo oferecido por Guzmán e constituiu a corrente "Prosseguir" que tentou seguir a luta armada até sua detenção em 1998. Seus sucessores começaram os contatos com os cartéis do narcotráfico.
Atualmente, na linha oposta a "José" encontramos uma ala política do senderismo liderada por "Artêmio", seguidor do fundador do grupo e propenso a infiltrar-se em organizações sociais, como sindicatos, e participar nas próximas eleições nacionais de 2011. De acordo com o ministro do Interior, Octavio Salazar, "Artêmio manifesta a vontade de penetrar nas organizações do Estado através das eleições em municípios e governos regionais. Essa é sua estratégia e não podemos perdê-lo de vista".
A ideia do grupo é lançar-se com uma estratégia que privilegie a ação política sobre a violência armada, tratando de apagar a imagem de terror que semeou no passado, e nesse sentido contaria com o aval de seu fundador: no ano passado seus advogados disseram que ele havia dado luz verde desde a prisão para que seus simpatizantes participem de processos eleitorais. Mais ainda, o advogado Alfredo Crespo disse em uma conferência de imprensa que o partido político poderia chamar-se Movimento por Anistia e Direitos Fundamentais e que buscaria a anistia de todos os presos políticos no país. Crespo acrescentou que outras metas dessa força seriam a implantação de uma nova constituição política e a luta contra a política neoliberal.
Sem dúvida, o governo do presidente Alan García poderia bloquear essa ação dos senderistas, enfatizando dois elementos: por um lado, a inexistência em um regime democrático de presos políticos; por outro lado, a não autorização da figura de anistia, à luz do dano gerado pelo SL em toda sua sangrenta trajetória.
Faz poucos dias, o enfrentamento entre Artemio e José foi exposto à cidadania peruana em toda sua dimensão. Na cidade ayacuchana de Huamanga os seguidores do primeiro desses líderes distribuíram panfletos fabricados de forma artesanal, nos quais se reivindicam como seguidores do marxismo-leninismo e acusam de narcotraficante ao outro chefe, chamando-lhe "vendepátria".
Ainda que nesses panfletos não constassem chamados explícitos ao emprego da violência nem à realização de ações terroristas, o Poder Executivo peruano se mantém cauteloso e em expectativa sobre esse ponto. De fato, Rafael Rey, ministro da Defesa, revelou recentemente que recebeu ameaças de morte da organização. Além disso, devido à existência de rumores de atentados no momento de cumprir-se o aniversário do SL, foi decretado o Estado de Emergência por 60 dias nos departamentos de Huánuco, Ucayali e San Martín (zonas de importante atividade narcoterrorista). Nessa situação se suspendem os direitos constitucionais, a liberdade e segurança pessoais, a inviolabilidade de domicílio e a liberdade de reunião. De acordo com o texto publicado no boletim oficial El Peruano, a medida é uma resposta ao fato de que havia "ocorrido atos contrários à ordem interna que afetam o normal desenvolvimento das atividades da população" nos últimos dias, ainda que tais atos não foram especificados.
Em definitivo, este resumo da situação que atravessam nesta época os grupos FARC e SL proporciona duas conclusões significativas. A primeira delas se refere à organização colombiana: tanto seu desdobramento como os apoios que registra nos âmbitos interno e externo mostram que, contrariamente ao que alardeava o Poder Executivo em meados do ano 2008 (após a morte de Tirofijo, o abatimento de Raúl Reyes e Iván Márquez, a deserção da chefe feminina "Karina" e a libertação de In grid Betancourt e outros sequestrados), ainda é prematuro falar de sua derrota definitiva.
A segunda conclusão se vincula com a fisionomia que adotará o Sendero daqui em diante. Na evolução das agrupações insurgentes nos países democráticos existe um momento crucial no qual sua evolução se apresenta nos termos dicotômicos que encarnam Artemio e José: por um lado, uma atuação dentro do sistema legal, baseado em uma plataforma política suscetível de captar uma massa de votos; por outro, uma opção pelos dinheiros sujos da criminalidade. O tempo nos dirá qual é o desenlace dessa pugna de transcendência histórica, pois ele também pode influir no desenlace do conflito colombiano.
Mariano Bartolomé é Graduado e Doutor em Relações Internacionais, especializado em Segurança Internacional.
E-mail: marianobartolome@yahoo.com.ar
(1) Os outros três congressistas são Jorge Robledo, Gloria Inés Ramírez e Wilson Borja.
(2) A ONU considera inadequado que toda nova criminalidade colombiana seja catalogada como neoparamilitarismo, a reedição dos paramilitares ou a continuidade disto. O argumento que dá é que "não há homogeneidade na conformação, propósitos, métodos e atividades destes grupos; é possível encontrar estruturas militares ou quase militares, mafiosas, sicariais e diversidade de propósitos: extorsão, território, comercio minorista de drogas ilícitas, narcotráfico, redes de prostituição, entre outros. Se trata de não qualificar de paramilitares a toda banda delinqüencial organizada na Colombia; isto não nega as exigencias para castigar a quem descumprem os compromisos do processo de desmobilização, nem a intensidade com que ha que combater a delinquencia".

(3) No começo do mês de março, Eloy Velasco solicitou la detenção de uma dúzia de presumíveis membros das FARC e do ETA por sua suposta colaboração e a intenção de assassinato, na Espanha, de personalidades colombianas, incluindo o próprio Uribe. No auto de detenção, se consigna que ambas organizações havíam contado com cooperacção governamental venezuelana. O governo venezuelano rechaçou a acusação e assegurou através do chanceler Nicolás Maduro que Velasco está associado ao ex presidente espanhol José María Aznar, a quem Chávez acusa de haver apoiado o golpe de Estado do ano 2002.
Fonte: tradução livre de texto
de Mundo RI


sábado, 29 de maio de 2010

Jorge Amado — A Grande Prostituta

Leitura para curtir aos poucos durante o fim de semana.
Desvendando mais um "mito cultural" brasileiro.
por Janer Cristaldo
(Idealizado pela editora Cia. das Letras o seminário Acadêmico Internacional sobre Jorge Amado promove hoje (24/5) e amanhã (25/5) palestras sobre o universo do escritor baiano e sua criação literária. Coordenado pelo departamento de Antropologia da FFLCH/USP, Prof. Dr. Júlio Assis Simões, Profa. Doutora Heloísa Buarque de Almeida e Profa. Doutora Laura Moutinho. Claro que nenhum dos professores doutores vai abordar o passado nazista e stalinista de Amado.  Para que a memória não se perca, aqui vai minha singela contribuição ao evento. Este artigo foi publicado na revista Brazzil, em Los Angeles, 1998. Jamais seria publicado na imprensa brasileira).
A palavra bordel, para quem não sabe, nasce em Paris. Na época em que as "maisons closes" ficavam às margens do Sena, quando alguém ia em busca de mulheres, dizia eufemisticamente: "j'vais au bord'elle". Sena, em francês, é palavra feminina, la Seine. Portanto, quando alguém dizia "au bord'elle", queria dizer "au bord de la Seine". Daí, bordel. Não é de espantar que a capital que deu ao mundo esta palavra queira homenagear, nos dias 20 e 25 de março próximos, no 18º Salão do Livro de Paris, a prostituta maior das letras contemporâneas.
O Brasil será o país homenageado do Salão e terá como convidado de honra e representante de nossas Letras, Jorge Amado, o mais vendido escritor nacional, que começou sua carreira como estafeta do nazismo, continuou como agente do stalinismo e hoje é roteirista oficioso de Roberto Marinho. Amado ainda receberá, na ocasião, o título de Dr. Honoris Causa por uma universidade parisiense. Nada de espantar: os parisienses, de longa tradição colaboracionista e stalinista, não perderiam esta oportunidade de homenagear, neste século que finda, o colega que desde a juventude militou nas mesmas hostes.

Do nazismo ao stalinismo
Autor brasileiro mais divulgado no exterior, com traduções em mais de 40 idiomas, colaborador de publicações nazistas, ex-militante do Partido Comunista, deputado constituinte em 46, Oba Otum Arolu do candomblé Axé Opô Afonjá na Bahia, membro da Academia Brasileira de Letras, Amado nasceu em uma fazenda de cacau, em 10 de agosto de 1912, no então recém-criado município de Itabuna, na Bahia, filho de pai sergipano e mãe baiana de ascendência indígena.
Em 1936, é preso no Rio, em conseqüência da Intentona de 35, tentativa de tomada do poder ordenada pelo Kremlin e liderada no Brasil por Luís Carlos Prestes. Em 1940, durante a vigência do pacto de não-agressão germano-soviético, assinado por Stalin e Von Ribbentrop, assume a edição da página de cultura do jornal pró-nazista Meio-Dia. Em uma reunião do Partido Comunista, é denunciado por Oswald de Andrade como "espião barato do nazismo" e instado pelo escritor paulista a retirar-se de São Paulo. Quando interrogado sobre o trabalho sujo deste período, Amado diz simploriamente: “Não me lembro”. Mas Oswald de Andrade lembra. Em antiga entrevista, republicada mais recentemente, em Os Dentes do Dragão, dizia Oswald:
"Diante de tantos erros e mistificações, retirei a minha inscrição do partido. Numa reunião da comissão de escritores, diante de quinze pessoas do PC, apelei para que o sr. Jorge Amado se retirasse de São Paulo e denunciei-o como espião barato do nazismo, antigo redator qualificado do Meio-Dia. Contei então, sem que Jorge ousasse defender-se, pois tudo é rigorosamente verdadeiro, que em 1940 Jorge convidou-me no Rio para almoçar na Brahma com um alemão altamente situado na embaixada e na agência Transocean, para que esse alemão me oferecesse escrever um livro em defesa da Alemanha. Jorge, depois me informou que esse livro iria render-me 30 contos. Recusei, e Jorge ficou surpreendido, pois aceitara várias encomendas do mesmo alemão".
Em 45, Amado é eleito deputado federal pelo Partido Comunista e publica Vida de Luís Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperança, uma apologia ao líder comunista gaúcho e membro do Komintern. O panfleto, encomendado pelo Kremlin, foi traduzido e publicado nas democracias ocidentais e nas ditaduras comunistas, como parte de uma campanha para libertar Prestes da prisão, após sua sangrenta tentativa, em 1935, de impor ao Brasil uma tirania no melhor estilo de seu guru, o Joseph Vissarionovitch Djugatchivili, mais conhecido como Stalin. Para Amado, Prestes, é o “Herói, aquele que nunca se vendeu, que nunca se dobrou, sobre quem a lama, a sujeira, a podridão, a baba nojenta da calúnia nunca deixaram rastro".
Prestes preso, segundo o escritor baiano, é o próprio povo brasileiro oprimido: “Como ele o povo está preso e perseguido, ultrajado e ferido. Mas como ele o povo se levantará, uma, duas, mil vezes, e um dia as cadeias serão quebradas, a liberdade sairá mais forte de entre as grades. ‘Todas as noites têm uma aurora’, disse o Poeta do povo, amiga, em todas as noites, por mais sombrias, brilha uma estrela anunciadora da aurora, guiando os homens até o amanhecer. Assim também, negra, essa noite do Brasil tem sua estrela iluminando os homens, Luís Carlos Prestes. Um dia o veremos na manhã de liberdade e quando chegar o momento de construir no dia livre e belo, veremos que ele era a estrela que é o sol: luz na noite, esperança; calor no dia, certeza”.
Em 46, como constituinte, Amado assina a quarta Constituição Brasileira. Dois anos depois, seu mandato é cassado em virtude do cancelamento do registro do PC. Neste mesmo ano, 1948, fixa residência em Paris, onde convive, entre outros, com Sartre, Aragon e Picasso. Em 1950, passa a residir no Castelo da União dos Escritores, em Dobris, na ex-Tchecoslováquia, onde escreve O Mundo da Paz, uma ode a Lenin, Stalin e ao ditador albanês Envers Hodja. No ano seguinte, quando o livro é publicado, recebe em Moscou o Prêmio Stalin Internacional da Paz, atribuído ao conjunto de sua obra, condecoração geralmente omitida em suas biografias.
Esta década é marcada por longas viagens, entre outras, à China continental, Mongólia, Europa ocidental e central, à ex-União Soviética e ao Extremo Oriente.
Vós sabeis, amigos, o ódio que eles têm  os homens de dinheiro, os donos da vida, os opressores dos povos, os exploradores do trabalho humano  a Stalin. Esse nome os faz tremer, esse nome os inquieta, enche de fantasmas suas noites, impede-lhes o sono e transforma seus sonhos em pesadelos. Sobre esse nome as mais vis calúnias, as infâmias maiores, as mais sórdidas mentiras. ‘O Tzar Vermelho’, leio na manchete de um jornal. E sorrio porque penso que, no Kremlin, ele trabalha incansavelmente para seu povo soviético e para todos nós, para toda a humanidade, pela felicidade de todos os povos. Mestre, guia e pai, o maior cientista do mundo de hoje, o maior estadista, o maior general, aquilo que de melhor a humanidade produziu. Sim, eles caluniam, insultam e rangem os dentes. Mas até Stalin se eleva o amor de milhões, de dezenas e centenas de milhões de seres humanos. Não há muito ele completou 70 anos. Foi uma festa mundial, seu nome foi saudado na China e no Líbano, na Romênia e no Equador, em Nicarágua e na África do Sul. Para o rumo do leste se voltaram nesse dia de dezembro os olhos e as esperanças de centenas de milhões de homens. E os operários brasileiros escreveram sobre a montanha o seu nome luminoso”.
Em função de sua militância no PC, no início de sua trajetória foi traduzido na China, Coréia, Vietnã e ex-União Soviética. Só depois então é puxado para os países ocidentais, pelas mãos de seu tradutor para o alemão. Em Munique, em 1978, entrevistei Curt Meyer-Clason, o responsável pela introdução de Amado na Europa ocidental. O baiano invade com sua literatura o mundo livre, que tanto caluniou, através da finada República Democrática Alemã. “Devido à proteção do PC, a RDA incumbiu-se da publicação de todos os seus livros, já nos anos 50” - disse-me Meyer-Clason. “Depois, por meu intermédio, passou diretamente à República Federal da Alemanha”. Não por acaso, Meyer-Clason acaba de ser denunciado, pela revista alemã Der Spiegel, como espião do Terceiro Reich no Brasil.
Da mesma forma que nega seu passado nazista, Amado não comenta seu passado stalinista. Em seu último livro, Navegação de Cabotagem, declara:
"Durante minha trajetória de escritor e cidadão tive conhecimento de fatos, causas e conseqüências, sobre os quais prometi guardar segredo, manter reserva. Deles soube devido à circunstância de militar em partido político que se propunha mudar a face da sociedade, agia na clandestinidade, desenvolvendo inclusive ações subversivas. Tantos anos depois de ter deixado de ser militante do Partido Comunista, ainda hoje quando a ideologia marxista-leninista que determinava a atividade do Partido se esvazia e fenece, quando o universo do socialismo real chega a seu triste fim, ainda hoje não me sinto desligado do compromisso assumido de não revelar informações a que tive acesso por ser militante comunista. Mesmo que a inconfidência não mais possua qualquer importância e não traga conseqüência alguma, mesmo assim não me sinto no direito de alardear o que me foi revelado em confiança. Se por vezes as recordo, sobre tais lembranças não fiz anotações, morrem comigo".

Realismo Socialista
Em 1954, julgando talvez insuficiente a defesa do stalinismo feita em O Cavaleiro da Esperança e O Mundo da Paz, Amado publica os três tomos de Subterrâneos da Liberdade, onde pretende narrar a saga do Partido Comunista no Brasil. Só em 58, com Gabriela, Cravo e Canela, deixará de lado sua militância comunista e passará a fazer uma literatura eivada de tipos folclóricos baianos, que mais tarde será transposta em filmes nacionais e novelas da Rede Globo.
O romancista baiano foi o introdutor nas letras brasileiras do realismo socialista, também conhecido como zdanovismo, fórmula de confecção literária para a pregação do ideário comunista, concebida pelos escritores russos Maxim Gorki, Anatoli Lunacharski, Alexander Fadéev, e sistematizada pelo coronel-general Andrei Zdanov.
Nos países em que foi traduzido, Amado é visto como um escritor que faz literatura brasileira. Em verdade, obedecia a uma fórmula tosca, mais panfletária que estética, produzida por teóricos em Moscou. Wilson Martins, em A História da Inteligência Brasileira, traduz em bom português as características do novo gênero:
De um lado, os bons, ou seja, os que se incluem na “chave” mística do “trabalhador”, do “operário”; de outro lado, os maus, isto é, todos os outros mas, em particular, o “proprietário” e a “polícia”, as duas entidades arimânicas deste singular universo. Os primeiros são honestos, generosos, desinteressados, amigos da instrução e do progresso, patriotas, bons pais de família, sóbrios, artesãos delicados, técnicos conscienciosos, empregados eficientes (embora revoltados), imaginativos e incansáveis, focos de poderoso magnetismo pessoal, cheios de inata vocação de comando e, ao mesmo tempo, do espírito de disciplina mais irrepreensível, corajosos, sentimentais, poetas instintivos, sede de paixões e violências (oh! no bom sentido!), modelos de solidariedade grupal, argumentadores invencíveis, repletos, em suma, de uma nobreza que em torno deles resplandece como um halo. O “trabalhador” é o herói característico desses romances de cavalaria: sem medo e sem mácula, ele tem tantas relações com a realidade quanto o próprio Amadis de Gaula.
Já o “proprietário” é um ser asqueroso e nojento, chafurdando em todos os vícios, grosseiro, bárbaro, corrupto, implacável na cobrança dos seus juros, lascivo na presença das viúvas jovens e perseguidor feroz das idosas, barrigudo, fumando enormes charutos, arrotando sem pudor, repleto de amantes e provavelmente de doenças inconfessáveis, membro da sociedade secreta chamada “capitalismo”, onde, como todos sabem, é invulnerável a solidariedade existente entre seus membros; indivíduo que favorece todos os deboches, inclusive dos seus próprios filhos; covarde, desonesto, egoísta, ignorante, vendido ao dólar americano, lúbrico, marido brutal e pai perverso, irritante e antipático, rotineiro, frio como uma enguia, incapaz de sinceridade, sem melhores argumentos que a força bruta, verdadeira encarnação contemporânea dos demônios chifrudos com que a Idade Média se assustava a si mesma.
Wilson Martins continua enumerando detalhadamente os demais estereótipos utilizados neste tipo de romance, entre eles a polícia, o tabelião, o posseiro, o governador, o latifundiário, o camponês. Seria por demais monótono continuar a descrição deste universo maniqueísta, como tampouco teria sentido acompanhar a repetição — ad nauseam — de uma fórmula primária de fabricar livros.
Vamos então enfiar logo as mãos no lixo. Os Subterrâneos também foi escrito em Dobris, no mesmo castelo da União de Escritores Tchecoeslovacos onde Amado produzira O Mundo da Paz, de março de 1952 a novembro de 1953, ou seja, no período imediatamente posterior à obtenção do Prêmio Stalin. Como pano de fundo histórico temos, como não poderia deixar de ser, a Revolução de 1917.
Outras datas e fatos posteriores determinarão poderosamente a construção dos personagens. Em 1935, ocorre no Brasil a Intentona Comunista. Em 36, Prestes é preso, e sua mulher Olga Benário, judia alemã que é oficial do Exército Vermelho, é deportada para a Alemanha de Hitler. Getúlio Vargas consegue persuadir o Congresso e criar um Tribunal de Segurança Nacional para punir os insurgentes.
Ainda neste ano de 36, eclode na Espanha a Guerra Civil, confronto que envolveu todas as nações europeias e constituiu uma espécie de ensaio geral para a Segunda Guerra, detonada em 1939, circunstância amplamente explorada por Amado. Em 1937, os integralistas lançam Plínio Salgado como candidato às eleições presidenciais de janeiro do ano seguinte, abortadas a 10 de novembro pelo golpe com que Getúlio consolida o Estado Novo. Para desenvolver sua história, Amado fixará um dos mais turbulentos períodos deste século, que até hoje continua gerando rios de bibliografia. A ação de Os Subterrâneos situa-se precisamente entre outubro de 37 (às vésperas do Estado Novo e em meio à Guerra Civil Espanhola) e finda aos 7 de novembro de 39, 23º aniversário da proclamação do regime soviético na Rússia.
Amado, escritor e militante, tem por incumbência várias missões. A primeira consiste na defesa dos ideais de 17, encarnado em Lenin e Stalin, potestades várias vezes invocadas ao longo dos três volumes. Segunda, fazer a defesa do Messias que salvará o Brasil, Luís Carlos Prestes, e não por acaso a trilogia encerra-se com seu julgamento. Missões secundárias, mas não menos vitais: denunciar o imperialismo ianque, condenar a dissidência trotskista, pintar Franco com as cores do demônio e fustigar Getúlio por ter esmagado a atividade comunista a partir de 35.
Seus personagens são títeres inverossímeis e sem vontade própria, embebidos em álcool se são burgueses, ou imbuídos de certezas absolutas, mais água mineral, se são operários ou militantes, estes sempre obedientes aos ucasses emitidos às margens do Volga. A obra, composta por três volumes — Os Ásperos Tempos, Agonia da Noite e A Luz no Túnel — constituiria apenas a primeira parte de uma trilogia mais vasta, com pretensões a ser o Guerra e Paz brasileiro. Os três tomos são publicados em maio de 1954, um ano após a morte de Stalin e dois antes do XX Congresso dos PCURSS, o que obriga o autor a interromper seu projeto. Pela segunda vez, na trajetória literária de Amado, sua ficção será determinada não por uma análise da realidade brasileira, mas por decisões tomadas em Moscou.

A onipresença do novo Deus
O personagem por excelência do romance é o Partido Comunista, onipresente como o antigo deus cristão e feito carne na figura de Stalin. A luta do PC é a luta  na ótica do autor  do povo brasileiro contra a tirania, no caso, Getúlio Vargas. Externamente, os inimigos são os Estados Unidos da América, a Alemanha, Franco e Salazar. Sem falar, é claro, na IV Internacional e nos trotskistas. O PC está infiltrado na classe dominante, disperso na classe média e fervilha nos meios operários. Invade as cidades e o campo, a pampa e a floresta, os salões burgueses, as fábricas e os portos, corações e mentes.
Quantos outros, do Amazonas ao Rio Grande do Sul”, — reflete o militante Gonçalo — “não se encontravam nesse momento na mesma situação que ele, ante problemas complicados e difíceis, devendo resolvê-los, sem poder discutir com as direções, sem poder consultar os camaradas? Gonçalo sabe que os quadros do Partido não são muitos, alguns mil homens apenas na extensão imensa do país, alguns poucos milhares de militantes para atender à multidão incomensurável de problemas, para manter acesa a luta nos quatro cantos da pátria, separados por distâncias colossais, vencendo obstáculos infinitos, perseguidos e caçados como feras pelas polícias especializadas, torturados, presos, assassinados. Um punhado de homens, o seu Partido Comunista, mas este punhado de homens era o próprio coração da pátria, sua fonte de força vital, seu cérebro poderoso, seu potente braço. Esta onipresença extrapola o país, manifesta-se onde quer que andem os personagens, no Uruguai, França, Espanha, no planeta todo. Inevitáveis as referências à foice e ao martelo. E a Stalin, naturalmente, guia, mestre e pai.
A litania dirigida ao grande assassino tem por vezes características de humor negro: “— Quantos mais formos — diz a militante Mariana — mais trabalho terão os dirigentes. Pense em Stalin. Quem trabalha no mundo mais que ele? Ele é responsável pela vida de dezenas de milhões de homens. Outro dia li um poema sobre ele: o poeta dizia que quando todos já dormem, tarde da noite, uma janela continua iluminada no Kremlin, é a de Stalin. Os destinos de sua pátria e de seu povo não lhe dão repouso. Era mais ou menos isto que dizia o poeta, em palavras mais bonitas, é claro...” O poeta em questão é Pablo Neruda, já citado em O Mundo da Paz: “Tarde se apaga a luz de seu gabinete. O mundo e sua pátria não lhe dão repouso.
Consta de uma ode a Stalin, subtraída às Obras Completas do poeta chileno, onde, por enquanto, ainda se pode encontrar uma “Oda a Lenin”. Hoje, temos uma ideia precisa do que planejava Stalin nas madrugadas tardias de seu gabinete.
Quando Apolinário Rodrigues, por exemplo, (personagem calcado em Apolônio de Carvalho, oficial brasileiro exilado que participara da Intentona de 35) chega a Madri, sente-se em casa pois, para onde quer que se vire, lá está o Partido. A única cor local da capital espanhola parece ser a luta pela libertação de Prestes:
Quando chegara à Espanha, vindo de Montevidéu, vivera dias de intensa emoção, ao encontrar por toda a parte, no país em guerra, nas ruas bombardeadas das cidades e aldeias, nos muros da irredutível Madri, as inscrições pedindo a liberdade de Prestes. Cercava-o o calor da intensa solidariedade desenvolvida pelos trabalhadores e combatentes espanhóis para com os antifascistas brasileiros presos e, em particular, para com Prestes. (...) Era uma única luta em todo o mundo, pensava Apolinário, ante essas inscrições, o povo espanhol o sabia, e em meio às suas pesadas tarefas e múltiplos sofrimentos, estendia a mão solidária ao povo brasileiro.
A coincidência da instituição do Estado Novo com a explosão da Guerra Civil Espanhola é uma oportunidade única para Amado de inserir seus personagens no conflito internacional que redundaria na II Guerra, expondo ao mesmo tempo a linha do Partido. Tão única é esta oportunidade e tanto o autor quer aproveitá-la, que chega a deslocar para 1938 uma greve dos portuários de Santos, efetivamente ocorrida em 1946, o que aliás provocou um certo debate. Estaria Amado realmente sendo fiel ao método que “exige do artista uma representação veridicamente concreta da realidade no seu desenvolvimento revolucionário”, conforme proclamavam os estatutos da União de Escritores Soviéticos? Ao autor isto pouco importa.
Deslocando a greve para 38, pode criar um navio alemão que vem buscar, no Brasil, café para a Espanha. De uma só tacada, Amado fustiga Hitler, Getúlio e Franco: Em algumas palavras (o velho Gregório) historiou o motivo por que a direção do sindicato havia convocado essa sessão: o governo oferecera ao general Franco, comandante dos rebeldes espanhóis (“um traidor”, gritou uma voz na sala), uma grande partida de café. Agora se encontrava no porto um navio alemão (“nazista”, gritou uma voz na sala) para levar o café.” Na Guerra Civil Espanhola, segundo Amado, há apenas “nazistas alemães e fascistas italianos”.
Tão pródigo em elogios à Stalin e à União Soviética, em sua trilogia o autor silencia sobre a presença russa na Espanha, constituída por pilotos de guerra, técnicos militares, marinheiros, intérpretes e policiais. A primeira presença estrangeira em terras de Espanha foi a soviética, com o envio de material bélico e pessoal militar altamente qualificado, em troca das três quartas partes (7.800 caixas, de 65 quilos cada uma) das reservas de ouro disponíveis pelo Banco de España. Pagos adiantadamente. Silêncio de Amado: a representação veridicamente concreta da realidade no seu desenvolvimento revolucionário pode esperar mais um pouco.
A presença do Partido permeará a trilogia das primeiras páginas de Os Ásperos Tempos às últimas de A Luz no Túnel. Nestas, a militante Mariana, antes de presa, assiste ao julgamento de Prestes. A voz do líder comunista é “a voz vitoriosa do Partido sobre a reação e o terror”:
Eu quero aproveitar a ocasião que me oferecem de falar ao povo brasileiro para render homenagem hoje a uma das maiores datas de toda a história, ao vigésimo terceiro aniversário da grande Revolução Russa que libertou um povo da tirania...
Seria monótono e redundante perseguir esta onipresença do Partido na trilogia de Amado. Neste universo imperam o bem e o mal absolutos. O bem, evidentemente, é representado pelo novo Deus, o proletariado. O mal, pela burguesia detentora do capital. Entre um universo e outro transitam eventualmente seres camaleônicos, “traidores de classe” ou traidores do Partido. Dividir o universo em duas metades, uma boa e outra má, nada tem de novo e original.
Tal princípio vem do século III, através da doutrina do persa Mani. O espantoso é que continue a viger em pleno século XX, e mais: impondo gostos, comportamentos e até mesmo filiação partidária aos personagens de um romance. Os representantes do Bem amam. Os representantes do Mal têm amantes. Os bons bebem café ou água mineral. Os maus bebem cachaça ou uísque. Os bons são magros e idealistas. Os maus são gordos e mesquinhos. Os bons têm gargalhar sadio, os maus têm dentes podres. Os bons não têm posses. Os maus são proprietários. Os bons são pobres, os maus ricos. Os bons pertencem ao Partido ou com ele colaboram. Os demais são maus. Os bons, diga-se de passagem, estão aprisionados em tal camisa-de-força ideológica que sequer podem se dar ao luxo de gostar de pintura surrealista ou naïve.
Até 1954, Amado traduzirá em sua literatura as determinações do Partido Comunista russo. Em entrevista para Isto é (18/11/81), Amado reconhece seu stalinismo:
Não sei se o termo “realismo socialista” se aplica a todos os meus livros daquela época. Estariam em face do realismo socialista, mas o fato é que Jubiabá (1935), Mar Morto (1936) e Capitães de Areia (1937), do período ao qual você se refere, só puderam ser publicados em russo depois da morte de Stalin. Acredito que a classificação seja justa para Terras do Sem Fim (1943), Seara Vermelha (1946) e Subterrâneos da Liberdade (1954). Se existe um livro meu totalmente influenciado pelo stalinismo, é Subterrâneos da Liberdade, que reflete uma posição totalmente maniqueísta.
Denunciados os crimes do stalinismo por Kruschov, em 1954, dois anos depois Amado molha o dedinho na língua e o ergue ao ar, para sentir de onde sopram os ventos: o sentido da História é agora uma literatura popularesca, ao estilo da rede Globo. Passa então a produzir uma literatura de evasão em torno a motivos baianos. Não sem antes fazer um tímido e discreto mea culpa, publicado em 10 de outubro de 1956 pela Imprensa Popular:
Aproximamo-nos, meu caro, dos nove meses de distância do XX Congresso do PCUS, o tempo de uma gestação. Demasiado larga essa gravidez de silêncio e todos perguntam o que ela pode encobrir, se por acaso a montanha não vai parir um rato. Creio que devemos discutir, profunda e livremente, tudo o que comove e agita o movimento democrático e comunista internacional, mas que devemos, sobretudo, discutir os tremendos reflexos do culto à personalidade entre nós, nossos erros enormes, os absurdos de todos os tamanhos, a desumanização que, como a mais daninha e venenosa das árvores, floresceu no estrume do culto aqui levado às formas mais baixas e grosseiras, e está asfixiando nosso pensamento e ação. (...) Sinto a lama e o sangue em torno de mim, mas por cima deles enxergo a luz do novo humanismo que desejamos acesa e quase foi submergida pela onda dos crimes e dos erros.
Como se o simples fato de sentir “a lama e o sangue” em torno a si o redimisse das cumplicidades passadas. Mas as denúncias dos crimes do stalinismo não geraram nenhum tribunal de Nuremberg e Jorge Amado sente-se como um ingênuo, enganado pelos ventos do século. No entanto, não mais permite a reedição de O Mundo da Paz. Quanto à sua obra ficcional, embasada no realismo socialista, esta continua sendo reeditada e traduzida. Mas o agitprop baiano se vê obrigado a mudar de rumos e publica, em 1958, Gabriela, Cravo e Canela.
Em 61, lança Os Velhos Marinheiros, considerado um dos melhores momentos de sua literatura. Neste mesmo ano, é eleito membro da Academia Brasileira de Letras, instituição que havia apedrejado e insultado em sua juventude. No discurso de posse, com a inocência de um moleque que relembra travessuras passadas, reitera sua oposição à Casa que o recebe:
"Chego à vossa ilustre companhia com a tranqüila satisfação de ter sido intransigente adversário desta instituição naquela fase da vida em que devemos ser necessária e obrigatoriamente contra o assentado e o definitivo. Ai daquele jovem, ai daquele moço aprendiz de escritor que no início de seu caminho, não venha, quixotesco e sincero, arremeter contra as paredes e a glória desta Casa. Quanto a mim, felizmente, muita pedra atirei contra vossas vidraças, muito adjetivo grosso gastei contra vossa indiferença, muitas vaias gritei contra vossa compostura, muito combate travei contra vossa força".
Em resposta aos que o condenam, diz o escritor: "Mas tudo na vida obedece a formalidades e se eu sou socialista não quer dizer que ignoro o mundo formal que me rodeia". De Moscou, recebe o apoio de Ilya Ehremburg: "Amamos Jorge Amado e temos confiança nele. Eu só o vi numa fotografia levemente mais gordo, em fardão de acadêmico. Olhei e sorri. Aos acadêmicos brasileiros dão um luxuoso fardão. Além disso usam espadas como seus colegas franceses. Não há nada de mal em que o homem simples de ontem apareça uma vez por ano na roupagem de imortal".

De amores com o imperialismo ianque
Com a transposição de seus romances para as novelas televisivas, o revolucionário aposentado torna-se uma espécie de roteirista da Rede Globo. Gaba-se até hoje de seu passado esquerdista. Mas foi o primeiro escritor brasileiro a felicitar pessoalmente Fernando Collor de Mello por sua vitória. Claro que não foi apoiá-lo durante o impeachment. Com a nova guinada, seus livros começam a ser publicados nos Estados Unidos.
Em depoimento autobiográfico, concedido em 1985 à tradutora francesa Alice Raillard, em sua mansão na Bahia, de inimigo incondicional do capitalismo, Amado vira sócio:
"Sim, esta casa... Esta casa, eu digo sempre que foi o imperialismo americano que me permitiu construí-la! Era um velho sonho meu ter uma casa na Bahia. (...) Construir uma casa na Bahia? Eu tinha vontade, mas não o dinheiro. Foi então que vendi os direitos para o cinema de Gabriela à Metro Goldwin Mayer".
Em uma entrevista concedida à Folha de São Paulo, em dezembro de 94, expõe ao repórter a mansão comprada graças aos dólares da Metro Goldwin Mayer:
"Esse é o quarto do casal. Passei a vida a xingar os americanos, mas tudo o que temos é graças ao dinheiro dos imperialistas ianques. Compramos essa casa em 63 com a venda dos direitos de Gabriela para a MGM, rodado 21 anos depois. Cobrei barato, só US$ 100 mil”.
A parceria com o inimigo capitalista se revela lucrativa e permite a Amado a realização de outro sonho, morar na Paris que tanto insultou quando marxista:
Em 86, os americanos me pagaram um adiantamento alto pelos direitos de tradução de Tocaia Grande: US$ 250 mil. Juntamos com os guardados de Zélia e compramos nossa mansarda no Marais, em Paris”.
Este senhor, que empunhou com entusiasmo as piores e mais assassinas bandeiras do século, que no final da vida confessa sem nenhum pudor seu venalismo, é quem hoje representa o Brasil no Salão do Livro em Paris. Em verdade, tal fato não é espantar: Amado vende à Europa uma imagem que a Europa aceita como sendo a do Brasil.

Ainda segundo Wilson Martins:
A verdade é que a nossa literatura é sempre encarada como algo de exótico, de tropical. É por isso que Jorge Amado é extremamente popular nos outros países, ele oferece esse estereótipo da violência, da conquista da terra, da luta de classes e da opressão racial. Essa ideia exótica, uma espécie de ilha dos mares do sul, todos de tanga pelas ruas, armados de arco e flecha, e caçando onças na Avenida Rio Branco. Quando aparece um brasileiro branco e com grande cultura internacional, ele causa um espanto extraordinário. Nós alimentamos esse preconceito com todas as forças. Fazemos questão de mostrar que somos tropicalistas, que isto aqui é um país tropical, que somos mestiços, que branco aqui não tem vez. Quem defende tudo isso são esses grupos dos baianos e dos novos baianos, dos trios elétricos. É até um preconceito contra a cultura, no sentido ecumênico da palavra”.
Interrogado recentemente sobre como gostaria de ser lembrado em uma enciclopédia daqui a 50 anos, a grande cortesã responde com a candura dos inocentes: "Um baiano romântico e sensual. Eu me pareço com meus personagens  às vezes também com as mulheres".
Talvez seja um de seus personagens femininos o que melhor representa a ambivalência do “baiano romântico e sensual”: Dona Flor, a que administrava tranqüilamente dois maridos. Ao homenagear Amado, em verdade Paris está condecorando um escritor venal, que prestou os piores desserviços ao Brasil ao lutar para transformá-lo em mais uma republiqueta soviética, em nome de uma rápida ascensão literária e fortuna pessoal.
Fonte: Janer Cristaldo
COMENTO: é outro exemplar de "comunista loco por grana" como os citados em outro texto de dias atrás. "Comunista brasileiro? Pfuuu!"
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quinta-feira, 27 de maio de 2010

Senado Quer Enfiar Goela Abaixo o Medíocre Cinema Nacional

por Janer Cristaldo
Quando não mais indignar-me, é porque estou envelhecendo, dizia André Gide. Se assim for, o Brasil me promete eterna juventude. Nos estertores do século passado, Cristovam Buarque, ex-governador do Distrito Federal, afirmava em seu cartão de fim de ano: O século XX criou o computador e o flanelinha, a nave espacial e o trombadinha, o robô e o pivete, o internauta e o cheira-cola”. O sofisma não só passou impune, como foi citado como um momento de brilho do governador.
Fosse eu o século XX, processava por calúnia este senhor e ainda exigiria indenização por danos morais. Pois quem criou o computador e a nave espacial não foi o século, mas os Estados Unidos. Quanto aos flanelinhas, trombadinhas e cheira-colas, estas originais instituições são coisas nossas, made in Brazil. Sofismador de mão cheia, o governador junta avanço tecnológico e miséria no mesmo saco e os atribui ao tempo.
Que me conste, a Europa vive em nosso mesmo século e lá não encontramos os flanelinhas, trombadinhas e cheira-colas, instituições que, à semelhança dos juízes classistas, reitores eleitos por bedéis e cheques pré-datados, são tupiniquins. A frase do governador é típica de patrioteiros: o Brasil é lindo e suas mazelas são decorrências do tempo que passa.
No início deste ano, comentei brilhante projeto do analfabeto agora senador, que estava prestes a ser examinado na Comissão de Educação do Senado, propondo que os estudantes brasileiros das escolas públicas e privadas assistissem no período de um mês a pelo menos duas horas de filmes nacionais.
Ora, em dezembro passado, o sedizente filho do Brasil assinou decreto fixando a cota mínima de exibição de filmes brasileiros nas salas de cinema de todo o país. Cada sala deverá exibir 28 dias de 2010 de filmes nacionais. Parece que não foi suficiente. Sua biografia, apesar dos bilhetes distribuídos com desconto para sindicatos, encalhou. Até um outro vigarista, o Chico Xavier, atraiu mais público.
Rola na rede uma tese interessante, a de que Fábio Barreto cometeu um equívoco ao pintar seu personagem como um herói impoluto. Que brasileiro não gosta de heróis impolutos. Que se Lula fosse pintado como é, malandro adepto da lei de Gérson, o filme seria mais verossímil. Existe uma massa de jovens indefesos na rede escolar? Jogue-se então Lula, o filho do Brasil, goela abaixo dessas gerações.
A medida é de caráter obrigatório. Rosalba Ciarlini, senadora do DEM, partido tão venal como o PT, deu então dois pareceres totalmente diferentes sobre o projeto. Em maio passado, defendeu sua rejeição. Esse tipo de norma, por sua rigidez, conquanto possa servir a interesses diversos e estranhos à escola, pouco ou nada contribui para a melhoria do ensino. Ao contrário, pode diminuir a margem de autonomia e de flexibilidade dos estabelecimentos de ensino".
Em novembro, por ocasião do lançamento do hagiológio ao analfabeto-mor, a senadora só teve elogios para a proposta, sob a alegação de que a obrigatoriedade das escolas exibirem filmes nacionais "será benéfica para ambos, estudantes e indústria cinematográfica. A produção nacional, com raras exceções, tem qualidade plástica e conteudista irretorquível, diversidade temática e de público-alvo". O que a senadora propõe, no fundo, é a exibição obrigatória de uma ficção sobre o presidente mais analfabeto, mais incoerente, mais mentiroso, mais corrupto e o maior acobertador da corrupção que o Brasil jamais teve em seus dias de república.
Leio hoje na Veja on line que o Senado aprovou o projeto de lei do estúpido senador. A proposta foi apreciada em caráter terminativo na Comissão de Educação, Cultura e Esporte e agora segue para a Câmara dos Deputados, antes de ser sancionada pelo presidente. Se a lei for colocada em prática, as unidades de ensino básico do país terão que separar pelo menos duas horas por mês da grade extracurricular para exibições do cinema nacional.
As artes nacionais, de tão excelentes, vivem hoje de esmolas do poder. Tanto escritores como cineastas, artistas plásticos, atores de teatros, são humildes pedintes de verbas governamentais, que estendem o chapéu ao Planalto e vivem de caridade pública.
Segundo Buarque, o projeto estimulará a formação de público para o cinema brasileiro. Ele acredita que as crianças e os adolescentes que tiverem acesso aos filmes agora vão desenvolver o senso estético e passar a apreciar a produção cinematográfica do país, hoje feita basicamente por meio de incentivos fiscais e verba pública. "A médio e longo prazo, o público poderá de fato financiar o cinema, como acontece em outros países", afirma o desinformado senador.
Que outros países, senador? Estará Vossa Excelência se referindo aos extintos países socialistas, onde toda arte dependia da complacência do poder? Ou aos Estados Unidos, onde um Kubrick quase foi à falência para rodar Apocalipse Now, mas não recebeu um vintém do Estado? Ou à Itália, que produziu um Fellini — e tantos outros cineastas de gênio — sem jamais meter a mão no bolso do contribuinte? Ou a outros países do Ocidente, onde cinema é uma questão de indústria e não de esmola estatal?
Para a cineasta e professora do curso de Audiovisual da Universidade de Brasília, Dácia Ibiapina, a proposta será muito bem recebida entre os produtores e diretores de cinema, que convivem com um mercado exibidor restrito. "O ideal era que naturalmente os brasileiros demandassem seu cinema, mas, como a gente vive num país em que a indústria cinematográfica tem muita dificuldade de se afirmar e muitos filmes nem chegam a ser lançados, mecanismos como essa lei podem ajudar a reverter essa situação".
Claro que será muito bem recebido por produtores e diretores de cinema, estes corruptos que não conseguem fazer arte decente e dependem do Estado para vender seus peixes podres. Porque cargas d’água eu, brasileiro, tenho de ver cinema brasileiro? Vejo o cinema que me agrada, ora bolas! Os distribuidores já nos impõem o cinema ianque, os Titanics, Arcas Perdidas e Avatares da vida. Agora o Estado brasileiro passa a impor os abacaxis nacionais. Os abacaxis do Norte pelo menos têm melhor gramática.
Não bastasse o contribuinte financiar esta mediocrada que faz cinema, teatro e literatura no Brasil, agora os filhos dos contribuintes terão de engolir goela abaixo as “obras” — no sentido pejorativo do termo — dos medíocres amigos do poder. A medida é de um viés totalitário que sequer foi sonhado pelos países comunistas. Aliás, nem precisava ser imposto, já que todo cinema era estatal. Mas pelo menos não era obrigatório nas escolas.
Nestes dias em que se luta contra o ensino de religião nas escolas, urge agora lutar contra medida mais grave, o projeto do senador. O Senado já o engoliu. A Câmara certamente o aprovará. E é óbvio que o filho do Brasil o sancionará.
Você imaginou seu filho sendo obrigado a assistir odes a Lula e Chico Xavier? Mais apologias a terroristas e traficantes de drogas? Esta corrupção, com patrocínio do Legislativo, jornal algum denuncia. Os jornais são cúmplices. Suas páginas abrigam e louvam escritores, atores e artistas que são gigolôs do poder. Que nada valem por suas obras e que só são conhecidos porque impostos a um público indefeso. A União Soviética morreu há duas décadas. E o Brasil continua financiando escritores e artistas venais, como faziam os comunistas no século passado.
A meu ver, o projeto do senador Cristovam Buarque é tímido. Bem que podia ir mais longe. Mais duas horas obrigatórias de teatro nacional. Mais outras duas de Rede Globo. Mais outras tantas de Caetano Veloso, Chico Buarque e Gilberto Gil. Mais duas de Xuxa e Sílvio Santos. E mais duas — por que não? — de Edir Macedo e R. R. Soares.
Tudo pela cultura nacional.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Nossos Heróis Que o Atual Governo Faz Questão de Esquecer

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Em 8 de maio próximo passado, o Mundo comemorou o 64º aniversário do Dia da Vitória na Segunda Guerra Mundial. Cerimônias aconteceram em Moscou, Paris, Londres e Washington. Na França, foi Feriado Nacional.
No Brasil, a data passou "em branco" e os Governos Federal, Estaduais e Municipais, não deram "um pio" sobre a data. Nosso Presidente, que por força da Constituição Federal deveria ser o Comandante Supremo das Forças Armadas, ignorou a data. Nem muito menos em nosso "Congresso", que tem como hábito homenagear os fatos mais insólitos e até mesmo estapafúrdios em suas chamadas "sessões solenes", houve qualquer pronunciamento.
Ficou perdida senão deliberadamente afastada mais uma oportunidade de valorizar atos de honra e patriotismo de alguns dos verdadeiros heróis deste País, e de reabrir para os mais jovens algumas das mais importantes páginas da real História do Brasil.
Esqueceram que o Nordeste foi considerado Zona de Guerra. No Recife chegou-se a exercitar o "blackout" como forma de defesa antiaérea, além de preparativos para atender a eventuais necessidades de emprego de artilharia contra aviões do III Reich.
Esqueceram de que naquela área marítima ocorreu o maior número de ataques da Força Submarina Alemã, na América Latina.
Esqueceram dos mortos dos navios Baependy, Araraquara, Aníbal Benévolo, Itagiba e Arará, afundados logo ao início da guerra pelo U-507, um dos submarinos da Marinha Alemã.
Esqueceram dos bravos marinheiros brasileiros que, durante praticamente todo o período da guerra, navegando dia e noite nos navios denominados caça-submarinos, fizeram a escolta de centenas de comboios, protegendo milhares de navios mercantes aliados através do Atlântico. A ação desses bravos foi decisiva, frustrando os ataques de submarinos alemães. Sem a participação da Marinha, por meio da Força Naval do Nordeste, seria impossível manter o tráfego marítimo e, consequentemente, o transporte de cargas logísticas durante a guerra, diante da enorme ameaça submarina alemã.
O Brasil se esqueceu dos mais de mil marinheiros que tiveram o fundo do mar como última e eterna morada, vítimas que foram dos ataques por torpedos dos "lobos cinzentos", como eram chamados os Submarinos do III Reich.
Esqueceram da Força Expedicionária Brasileira, que esteve na Itália com mais de 25 mil homens, dos quais 443 mortos e mais de 2 mil feridos. 
Esqueceram que a FEB lutou contra onze Divisões alemãs e duas italianas.
Esqueceram de que a FEB aprisionou os restos das 148ª Divisão de Infantaria Alemã, da Divisão Bersaglieri italiana, e de um Batalhão de Panzer Granadier com mais de 20 mil prisioneiros, em Fornovo de Taro, norte da Itália.
Esqueceram dos nossos pracinhas mortos nos campos e colinas italianas.
Esqueceram de que o Primeiro Grupo de Caça da FAB foi uma das duas únicas unidades de combate estrangeiras que receberam a Presidential Unit Citation, do Presidente Roosevelt, por bravura em combate.
Esqueceram de que Natal foi considerada o "Trampolim da Vitória" e teve a maior Base Aérea dos EUA fora do território americano e a segunda maior Base Aérea do mundo na Segunda Guerra Mundial, rivalizando com o campo Henderson na ilha de Guadalcanal, no Pacífico, conquistada pelos Fuzileiros Navais americanos no final de 1942.
Esqueceram dos "Senta a Pua", os aviadores brasileiros protagonizantes dos mais arrojados e heróicos feitos na aviação de combate, à época.
Mas o Brasil jamais esquece de homenagear os invasores do MST, nem de reeleger os ladrões do mensalão e nem carregadores de dólares em cuecas e ladrões dos cartões corporativos. É o Brasil cujo Presidente declara que é coisa sem importância o uso do dinheiro público para financiar passagens aéreas de famílias de deputados a passeio até pelo exterior. E que considera também sem importância a pouca vergonha, a roubalheira e a indecência que reina em nosso Congresso.
Jamais esquece de homenagear e tratar como "heróis" os traidores como Lamarca, João Amazonas, Arraes e tantos outros que tentaram transformar este País em uma Albânia por meio de atos de terror, covardes assassinatos, roubos e sequestros de gente inocente. Nem de incensar outros terroristas e filhotes de terroristas dos anos 60 que hoje tomaram o poder — inclusive a Casa Civil — ou fazem parte do indecente Congresso que nos representa.
Brasil cujo governo não se esquece de ser generoso ao defender e pagar absurdas indenizações a criminosos. Sim, aos criminosos que tiveram frustrados os seus intentos de transformar o País em satélite dos bárbaros regimes de escravidão chinês e russo daquela época, e aqui instituírem práticas tais como "tribunais do povo" e suas penas de fuzilamento, enforcamento e outros tipos de "eliminação" por motivos políticos. Práticas que, como todos sabemos, caracterizaram todas as ditaduras apelidadas de "populares" que se instalaram nos países rendidos às "teorias" de Stálin, de Mao Tse Tung e de Fidel Castro.
Enfim, o Brasil se esqueceu dos seus Marinheiros, dos seus Soldados e dos seus Aviadores!
Esqueceu-se de seus bravos que lutaram pela Democracia no mar, em terra e no ar.
É o Brasil da era Lula, essa triste figura que, à luz da Constituição Federal, deveria ao menos dignificar o exercício do Comando Supremo das Forças Armadas do Brasil.
Recebido por correio eletrônico

Use Corretamente o Papel Higiênico

por João Ubaldo Ribeiro
Creio que sempre tivemos a mania de regular a conduta alheia e estabelecer normas para atos que não deviam ser da conta de ninguém, exceto os envolvidos. Mas, ultimamente, parece que isso está deixando de ser um vício burocrático, para virar moda.
Todo dia algum brioso engenheiro social inventa regras para a nossa conduta, muitas delas com a finalidade de nos proteger de coisas contra as quais não queremos ser protegidos, como acontece com as novas disposições relativas a balcões e prateleiras de farmácias.
E, povo acostumado a comportar-se como se direitos básicos, a exemplo da liberdade de ir e vir ou de pensar e expressar-se livremente, constituíssem outorgas do Estado, somos cada vez mais tiranizados por esses abusos e, daqui a pouco, se não prestarmos atenção, teremos de preencher um formulário do Ministério da Saúde, justificando nosso pedido de carne vermelha num restaurante.
Lembro a tentativa de regular nossa linguagem, através da adoção de termos e expressões politicamente corretos. Seus proponentes afirmavam que se tratava apenas de sugestão, mas, por obra de nossa índole ovina, é claro que, dali a poucas semanas, estaria o Brasil inteiro usando a língua pasteurizada que imaginavam ser a adequada ao bom convívio social.
Não duvido nada — e, sinceramente, não acho que estou exagerando muito — que baixem normas para a utilização do papel higiênico. Apareceriam especialistas e se produziria uma exposição de motivos em que se aludiria às várias posturas adotadas em relação ao delicado problema, provavelmente a escola centrífuga, a centrípeta e a eclética.
Em mais uma demonstração do engenho nacional, todas as três seriam rejeitadas, em favor do padrão brasileiro, único no mundo e o mais avançado entre todos. A desobediência às normas implicaria sanções, mas ninguém precisaria ficar preocupado com a invasão de sua privacidade, pois o monitoramento do uso de papel higiênico só seria realizado depois de autorização judicial. Quem quiser que pense que isto é delírio.
Agora está em curso no Congresso Nacional a chamada lei da palmada, projeto que pretende tornar ilegal qualquer castigo físico de crianças, inclusive eventuais palmadas dadas pelos pais. Certamente estão incluídos aí puxões de orelha, beliscões, cascudos, petelecos e até mesmo empurrões, se bem que a epistemologia do empurrão deva dar algum trabalho, na hora de distinguir o empurrãozinho do maltrato.
Isso, contudo, perde em complexidade para o banho. Como não ignoram muitos pais e a figura ilustre do Cascão não me deixa mentir, há crianças que, levadas ao banho, agem como se estivessem sendo esfoladas vivas. Para quem o abomina, banho não será violência? De que jeito a mãe agirá, até para não ser denunciada às autoridades pelo filho? Suponho que, no espírito da lei, contratará um psicólogo para, com alguns meses de trabalho, induzir o imundinho a se lavar, tudo muito prático, racional e moderno.
Leio também que o projeto prevê que os pais pilhados dando palmadas nos filhos terão de submeter-se a consultas com psicólogos ou psiquiatras. Quer dizer que, se o sujeito der uma palmada no filho, vai ser considerado de alguma forma anormal, doente mental ou desajustado e se verá obrigado a ser normal, sob as penas da lei.
Que diabo é ser normal? É o que o psiquiatra me diz? Ele sabe o que é normal? Que é um indivíduo bem ajustado? Isso não é uma questão científica, é uma questão de valores, não é um problema para o método científico, é um problema filosófico. Não pode haver definição científica da conduta "certa". Todos sabem que quem é doido num contexto pode não sê-lo em outro e o bom ajustamento social às vezes não passa de conformismo, pobreza de horizontes, mesmice e ausência dos questionamentos que movem pessoas e coletividades.
Agora o que se pretende é que muitos de nós nos vejamos ameaçados pela perspectiva de que nos impinjam como compulsória a visão de normalidade de um psiquiatra ou psicólogo. E, se os pais se recusarem a essa consulta ou tratamento, estarão sujeitos a alguma pena adicional, perderão o pátrio poder, serão internados numa clínica especializada?
E, se o consultado disser que o psiquiatra é um cretino e se recusar a seguir suas prescrições, sofrerá as mesmas punições? Será encaminhado a uma junta onisciente de psicodoutores, cujo laudo irrecorrível poderá render-lhe interdição ou prisão? Quiçá lobotomia, para os casos renitentes? Duvido muito que os psiquiatras concordem com isso, a não ser os que alimentem fantasias de transformar o mundo num grande manicômio, entre neurolépticos, ansiolíticos, antidepressivos e sossega-leões.
Apresentam-se os argumentos habituais de que a Suécia, o Zuribequistão Exterior e a Baixa Eslobóvia adotaram legislação semelhante. Os suecos vão à praia nus, na companhia de vizinhos, família e amigos. Aqui, devido a nosso vergonhoso atraso, isso é suruba. Ou seja, o que é bom para sueco é bom para sueco e não há razão para crer que o que funciona lá seja verdade universal. Se o sueco queima a rosca, queimá-la-emos nós também?
O Estado não consegue, em lugar nenhum do Brasil, tirar as crianças abandonadas da rua, prevenir as sevícias medonhas sofridas por elas e denunciadas todo dia, dar horizontes a milhões de meninos e meninas. Mas agora, na esteira de seus inúmeros êxitos nessa área, acha de criar novas leis, como se as existentes, cumpridas fossem, não bastassem folgadamente.
Vão se catar, vão procurar o que fazer, chega de besteirol, chega de nos empurrar burrice inconsequente goela abaixo. Bem melhor fariam, se cuidassem das reformas que realmente importam, as esquecidas que nunca foram feitas, a tributária, a administrativa, a política, a ... Sim, e vejam se consertam a safadagem sem lei e sem ordem em que, para a maioria dos brasileiros, o Congresso e a política se transformaram.
João Ubaldo Ribeiro é Escritor.
Artigo publicado nos jornais O Estado de S.Paulo e O Globo
23 de maio de 2010
Fonte: Alerta Total
COMENTO: um bom exemplo de "regulamentação" imbecil, para não dizer canalha por atender a interesses mais do que escusos de alguns segmentos industriais — exemplo da exigência do "kit de primeiros socorros" e da troca do modelo de extintor de incêndios em todos os automóveis, seguidos mais recentemente pela "cadeirinha com especificações de idade" —, temos a recente mudança no modelo de tomada elétrica, diferente de tudo que se usa no mundo, obrigando à compra de adaptadores para todo e qualquer aparelho eletrodoméstico que se possua e que necessite ser usado fora de casa. Talvez você nem tenha se dado conta, mas ao viajar, necessita "adaptadores" para utilizar seu aparelho de barbear ou seu microcomputador portátil nos hotéis por onde passa. E aceitamos naturalmente essas "melhorias" que nos são impostas goela abaixo. Povinho de merda!!!!