segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Sobre a Cunha Cravada

Mesmo na Reserva Remunerada não consigo livrar-me das amarras da educação militar e continuo tratando a todos com muito respeito. Alguns superiores dispensam-me das formalidades, mas não quero, prefiro assim. Acho que é por isso que, quando algum assunto polêmico atinge as Forças Armadas, particularmente o Exército, aguardo sempre que um militar de patente superior à minha manifeste-se sobre o assunto. Só depois, exerço a minha prerrogativa de escrever sobre aquilo, tentando levar a minha participação aos debates. Minha lista é pequena, porém, algumas pessoas dela têm raio de ação muito maior. Assim, sei que o que eu escrever poderá ter boa difusão. 
Muito usada desde a antiguidade, creio ser a “cunha” uma das primeiras ferramentas empregadas pelo homem. A imagem que me vem à mente sobre uma cunha é a de uma peça de metal resistente usada pelos madeireiros quando querem derrubar árvores frondosas cujo diâmetro desafie a operacionalidade do machado. 
Grosso modo, a cunha tem um perfil triangular e, a partir de seu lado mais delgado, vai-se a empurrando, à força e pacientemente, em direção ao cerne da árvore que se quer derrubar, de modo que esta se vai inclinando, até atingir um ponto de ruptura que leva o tronco ao solo. Conforme a natureza da madeira de que seja constituído o tronco esse se quebra rápido ou vai-se lascando longitudinalmente. Nesse caso, de uma forma tal que inviabiliza seu melhor aproveitamento futuro. Mas o tronco cai. É com essa imagem da cunha que vejo as seguidas investidas contra a coesão da Instituição Exército feitas por alguns vetores de comunicação social, pessoas com acesso a espaços na Imprensa e, até mesmo, por alguns militares, que, involuntariamente, colaboram com aqueles, na tarefa de dissociar o Exército que consideram “de ontem” do Exército que dizem ser o “de hoje”. Esse tipo de manifestação não é novo e, as mais recentes, eu as li associadas às questões sobre a busca de ossadas de guerrilheiros na região do Araguaia e, agora, com as discussões sobre a “revisão” unilateral da Lei de Anistia
A Internet, que já foi comparada a uma praça pública para efeito de divulgação de opiniões, permitiu-me o acesso a coisas como as que transcrevo: 
— de um suposto oficial do Exército da ativa, portanto, cometendo transgressão disciplinar, externando sua indignação por algumas pessoas terem-se manifestado contrárias ao emprego do Exército na mais recente operação de buscas no Araguaia, da qual ele participava. "Concordo que este ponto da história deva ser sepultado, ... Ninguém está querendo endeusar ninguém, e todos sabem dos erros que foram cometidos no passado. Mas não julguem o presente Exército pelo passado Exército, pelos passados líderes, comandantes, chefes...” 
— De um oficial da ativa, do posto de Tenente, ótimo profissional e prestes a fazer um curso de aperfeiçoamento.
"já passei em dois concursos públicos, mas não fui chamado. Vou continuar fazendo, pois, numa dessas eu dou sorte e alguém me chama." Assim, o jovem oficial deixa clara a sua mínima vocação e uma preocupação em ser chamado para um emprego que lhe permita obter melhores vencimentos. É a cunha, agindo sobre o que o Exército tem de mais valioso: os seus recursos humanos, expelindo da Força grandes talentos, e tornando “barnabés” os que ficam, proletarizando-os. Assim, surge o militar-massa (de manobra, é claro). Sobre os casos veiculados pela Imprensa, deixo de citar outros por que sei que os senhores são muito bem informados. Destaco tão somente um, mais recente, em que uma jornalista, defendendo o ponto de vista a favor da revisão da Lei de Anistia, de modo a levar a julgamento algumas pessoas, não todas, entre elas só os militares, assim se referiu ao Exército: “... o Exército de hoje não está disposto a contrariar a sociedade, deixando de permitir o julgamento de senhores septuagenários que cometeram aqueles atos quando os atuais militares não eram nem nascidos ...”. 
Viu só? Isso é a cunha a que me referi. Dentre as formas escolhidas para enfraquecer a nossa Instituição foi cravar nela uma cunha (será que posso escrever “nossa”? Ou a ferramenta já me atingiu?) e, como se diz militarmente, com paciência, ir “alargando a brecha”, até dissociar o Exército “de ontem” do Exército “de hoje”. Na hipótese, somente na hipótese, de se tomar como realizável tal intento, a Instituição deixaria de ser permanente e poderíamos esperar para o futuro a substituição de nossos patronos, glórias e tradições. Porém, como se diz popularmente: “me poupem”. Eu, se ainda estivesse em escola de formação, certamente preferiria estudar tiro das armas portáteis e progressão no terreno do que “ter noções de direitos humanos”, como se, só por ser militar, eu tivesse a mente de alguma forma pervertida, desmerecendo a educação familiar cristã que recebi na infância e adolescência. 
Porém, quando dava por finalizado este exercício de verborragia, leio nas páginas de um jornal de circulação nacional, um senhor advogado opinando sobre como devem ser formados os militares brasileiros. Ora! Meu senhor! As Forças Armadas no mais das vezes sempre estiveram com seu sistema de ensino léguas à frente do sistema de ensino nacional. Não me julgo nas melhores condições para lhe “jogar na cara” o quanto é avançado o ensino militar brasileiro, pois tenho companheiros especialistas no assunto. Mas adianto-lhe, senhor advogado, que quando estive numa das escolas do Exército havia mais civis realizando cursos ao longo de um ano do que militares propriamente. O que eles buscavam lá? A excelência no ensino, senhor advogado. 
Por isso, por preguiça, patriotismo ou formação (na ordem que se queira) prefiro Caxias, Sampaio e Osório a Prestes, Lamarca e Osvaldão. 
Prefiro relembrar as batalhas dos campos de Tuiuti, na Guerra da Tríplice Aliança, a pensar no episódio em que nos pusemos de joelhos aos pés do prolífico “obispo”, presidente do Paraguai. Prefiro ainda ouvir e cantar o Hino Nacional, corretamente tocado e dentro da lei, mesmo que pela mais “fulêra” das fanfarras, do que ouvir e não poder cantar aquele hino descaracterizado, na voz de belas cantoras “pop”, que, por comodidade, ou “em benefício do evento”, o cantam apenas em sua 1ª parte (quando o conseguem...). Estava quase pronto o meu texto quando estourou a polêmica sobre os homossexuais nas Forças Armadas. Um oficial-general, do mais alto posto da carreira, sendo sabatinado no Congresso Nacional para poder ser Ministro do Superior Tribunal Militar respondeu, de forma precisa, o que se pensa nas Forças. Tenho para mim que mais do que uma sabatina, aquilo era um teste. Um teste para saber se “esse general” era do Exército “de ontem” ou do Exército “de hoje”. Esse é o motivo da grita nacional. Novamente, os advogados insurgiram-se contra uma instituição que tem princípios sólidos, pois sabe-se que há homossexuais e homossexuais. Alguém imagina a falecida Vera Verão (com todo o respeito que ela merecia pelo seu talento e por sua pessoa) ministrando uma sessão de ordem unida para soldados? Sobre os dois sargentos que viviam uma união homossexual em Brasília/DF pouco se ouviu a respeito, mas ambos tinham até apartamento funcional a si regularmente distribuído. Viviam de bem com a Força. Aí então ... resolveram “dar na pinta”, julgando-se acima dos regulamentos militares. Deu no que deu. 
Insisto que tudo isso é como a cunha a que me referi. A desafiá-la, está o material de que é feito o tronco a ser derrubado. Mas estão batendo nela. E forte. E repetidamente. E com oportunidade. Certos setores da sociedade parecem não se lembrar de que a guerra não é democrática e — quando necessário — não se conseguirá transformar cordeiros em leões da noite para o dia. E alguns dos cordeiros desejarão ser leões? Por isso, em meio a tão aparente confusão, minhas palavras de ordem no momento são: “o povo — esclarecido — e os militares unidos Jamais serão vencidos!”. 
Jorge Alberto Forrer Garcia 
Cel R1 (Turma Tiradentes – AMAN 1977) 
COMENTO: mais uma vez aproxima-se a data de 31 de março, ocasião em que, no passado, comemorava-se o aniversário da Contra-Revolução ocorrida em 1964. Como em ocasiões passadas, os "anti-militares" — particularmente os simpatizantes dos maus brasileiros que tentaram fazer do Brasil um satélite da extinta URSS ou da República Democrática Popular da China, lançando mão até mesmo da violência, por eles denominada "luta armada" —, procuram atingir o estamento militar com notícias ou factoides que possam sufocar qualquer referência positiva à data. Como bem escreveu o Cel Forrer a respeito da Instituição Exército, "estão batendo nela. E forte... E repetidamente... E com oportunidade...". Mas não terão êxito. A Instituição, como seus pilares básicos, a disciplina e a hierarquia, "verga mas não quebra"!!!

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