quarta-feira, 28 de maio de 2008

Decência

por Peter Wilm Rosenfeld
O título acima talvez devesse ser “Decência – ou falta de”.
Penso que nem seja necessário especificar a que, ou a quem, me refiro.
De qualquer forma, fá-lo-ei. Refiro-me em primeiro lugar, e de forma muito especial, aos políticos brasileiros; subsidiariamente, mas ainda sem sequer chegar perto do nível dos políticos, a uma parte do povo brasileiro.
Talvez deva começar com a antiqüíssima estória da criação do universo. Deus estava criando os países e, em cada um deles, colocava uma coisa boa e uma ruim. Ao chegar a vez do Brasil, colocou só coisas boas. Incontinenti, o anjo que o assessorava perguntou: Senhor, porque colocaste no Brasil só coisas boas, contrariamente ao que vinhas fazendo em todos os outros países, tendo Deus respondido “espera só para ver o povinho que lá colocarei” .
É claro que não concordo com a generalização. Penso que a enorme maioria das pessoas, ao nascerem, não nascem com genes do mal. São boas, inocentes e decentes.
O meio-ambiente em que crescem, o que inclui a família, os colegas de estudo, as amizades, será o elemento modelador do comportamento futuro da pessoa. O ser humano, entre tantas outras coisas, busca seus exemplos naquilo que o cerca e no que lhe for dado ler e observar. E, evidentemente, nos exemplos que vem de sua família.
O que mais me preocupa nesse particular são os políticos, apesar de numericamente em relação ao todo do povo brasileiro serem u’a minoria significativa. Mas é deles que a imprensa e os meios de comunicação em geral se ocupam maiormente. É através deles que ficamos sabendo o que está acontecendo e quem são os atores principais.
Adicionalmente me preocupa observar que o nível de decência vem caindo a cada ano que passa, cada vez com maior velocidade.
Apenas para rememorar, lembro-me que jovem ainda, cursando o ginásio na segunda metade dos anos 40 do século passado, gostava de freqüentar a recém instalada Assembléia Legislativa do RGS para ouvir os debates. Os deputados estaduais eleitos com a redemocratização do País após a queda da ditadura Vargas, em sua grande maioria e dos vários partidos, eram personalidades marcantes, todos de reputação acima de qualquer suspeita, ilibada, educados e com exemplar domínio da língua portuguesa. Ouvir seus discursos e os inevitáveis debates eram música para meus ouvidos. Não havia qualquer baixaria. Jamais se ouviria a famosa expressão “Vossa Excelência, com todo o respeito, é um f.d.p”, já ouvida em plenários pelo Brasil afora.
No que respeita a essa qualificação negativa a mesma se encontra no Poder Executivo, que parece estar fazendo um concurso com o Poder Legislativo para ver qual dos dois tem o maior número de integrantes com esse nível negativo.
Podemos constatar isso assistindo aos depoimentos e debates no Congresso (em ambas as casas legislativas) e nas famosas CPIs e CMPIs. Se não se assistisse ao vivo as sessões, não se acreditaria que tal pudesse acontecer por parte das “excelências”.
Além de exemplos mais gritantes de má educação, descortesia e o que mais for possível, ainda ouvimos mentiras as mais deslavadas, com os mentirosos não mudando suas expressões (ah, se existisse um Gepetto e ele estivesse presente, quantos Pinóquios criaria !...).
Pergunto-me: será que isso acontece em todos os países? Esclareço que me refiro ao comportamento e à decência indispensáveis para que os atores possam servir de exemplo ao restante dos cidadãos do respectivo país, principalmente aos jovens.
O que deveríamos e/ou poderíamos fazer no Brasil para ter gente séria, decente (com o corolário da honestidade !) ?
A pergunta procede, pois sabemos que uma única maçã podre em um cesto, se não retirada imediatamente, faz com que apodreçam todas as demais em curto período de tempo.
E acredito que a maioria dos brasileiros não esteja contaminada ainda, mas se não fizermos uma depuração em prazo relativamente curto, essa maioria passará a ser minoria e essa será dizimada com o tempo.
Para terminar, lembro que tudo o que disse acima, onde aplicável, é válido também para a corrupção, que atingiu níveis intoleráveis.
A impressão que se tem, que já é quase certeza, é a de que no governo, incluindo as empresas estatais, não se faz qualquer negócio sem que haja superfaturamento com a parte “super” indo para o bolso de um político ou burocrata qualquer.
Se essa desonestidade não existisse, teríamos um sistema de saúde muito bom, estradas de primeira categoria e tudo o mais pagando bem menos impostos do que pagamos hoje.
Extremamente triste é que os corruptos agem com a maior desfaçatez, pois sabem que nada lhes acontecerá. Sequer procuram disfarçar, como se fossem os arautos e paradigmas da honestidade.
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